FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

Nasceram os Primeiros Doguinhos de Laboratório!

Depois de décadas de pesquisa e tentativas frustradas, enfim rolou a primeira fertilização in vitro em cachorros. E isso é ótimo pra eles e pra nós.
À esquerda Jennifer Nagashima, doutoranda da SCBI, e à direita, Nucharin Songsasen, cientista da SCBI, com dois dos filhotinhos que nasceram por meio de fertilização in vitro. Crédito: Jeffery MacMillan/Smithsonian's National Zoo

Há alguns meses, uma beagle grávida deu a luz a sete filhotinhos adoráveis – três fêmeas e quatro machos. Cinco foram gerados por outro beagle, mas os dois restantes por um cocker spaniel. A mãe? Outro cão completamente diferente.

Após décadas de pesquisa e experimentos, foi a primeira vez que uma fertilização in vitro foi feita com sucesso em um cão.

"Gosto de dizer que cachorros são esquisitos", declarou Jennifer Nagashima, doutoranda do Instituto de Biologia de Conservação do Smithsonian (SCBI), nos Estados Unidos. "Eles têm algumas características únicas em termos de reprodução."

Publicidade

Nagashima é a principal autora de um estudo publicado ontem no periódico PLOS ONE que documenta os primeiros filhotes gerados a partir de embriões fertilizados in vitro por meio de óvulos e espermatozoides preservados em criogenia. Pesquisadores do Smithsonian e da Universidade Cornell implantaram 19 embriões que foram fertilizados com suas técnicas. O resultado, de acordo com o estudo, foram "sete filhotinhos saudáveis".

Sua pesquisa pode nos ajudar não só a entender melhor as centenas de características e desordens genéticas que os humanos compartilham com os cães, mas também remover características danosas que foram passadas após gerações de cruzamento.

"Muito do que foi feito nos últimos 30 anos tentou se basear em pesquisas em vez de observar o passado e reavaliar nossas suposições básicas", explicou Nagashima em entrevista. "Então, quando abordamos a questão da fertilização in vitro e tentamos solucionar problemas relacionados a isso no cão doméstico, queríamos ter espermatozoides excelentes, óvulos excelentes e as condições certas para a fertilização ou embrião."

Estudos anteriores usaram óvulos ainda não maduros – muitas vezes coletados de folículos ovarianos, "por causa da dificuldade em obter ovócitos após a ovulação", de acordo com o texto – e, depois, os amadureceram em uma placa de petri. Tais óvulos se provaram ineficazes na geração de embriões bem-sucedidos, porém. Sua equipe suspeitou que o problema poderia ser a qualidade dos óvulos. Mais tarde, veio a confirmação: o grupo descobriu que óvulos coletados seis dias após a ovulação são "passíveis de serem fecundados consistentemente".

Publicidade

Três dos sete filhos fertilizados in vitro. Image: Jeffery MacMillan/Smithsonian's National Zoo

Por mais que seja mais difícil obter óvulos de tal forma – há uma camada de gordura que dificulta o acesso – a equipe de Nagashima descobriu que, ao deixar os óvulos lá mais um dia antes de sua remoção, a taxa de sucesso da fertilização dos mesmos era bem maior do que a de estudos anteriores.

"Nas outras pesquisas a taxa de sucesso de produção de embriões era de 30 a 35%. Nosso estudo chegava regularmente entre 70 e 75%", afirmou.

O maior índice de sucesso também se deu em partes por que a equipe de Nagashima preparava seus espermatozoides. Em pesquisas anteriores, o magnésio havia sido omitido na no processo porque pesquisadores haviam descoberto que a substância atrasaria um processo chamado "exocitose acrossômica", que ajuda o espermatozoide a penetrar no óvulo. O novo estudo revelou, no entanto, que o atraso "não necessariamente é ruim". Segundo Nagashima, a adição de magnésio aumenta o movimento do espermatozoide pouco antes da fertilização e, também, aumenta sua probabilidade de sucesso.

Por fim, a equipe foi incumbida de voltar com o óvulo fecundado para a mãe de aluguel. Em quatro dos cinco cães estudados, Nagashima e sua equipe depositaram os embriões no corno uterino – parte do sistema reprodutor canino em que o embrião chega mais adiante em seu desenvolvimento. Tais óvulos não levaram a nenhum animal. Porém, no quinto e último cão, 19 embriões foram colocados no oviduto, que, de acordo com Nagashima, "era o local mais apropriado fisiologicamente" para um embrião jovem.

Publicidade

Aí deu tudo certo.

Segundo Nucharin Songsasen, uma dos co-autoras do estudo, os resultados têm implicações não apenas para cães, mas em humanos também.

Songsasen mencionou que o procedimento de fertilização in vitro desenvolvido por elas poderia ajudar a manter a diversidade genética em zoológicos, onde animais em cativeiro podem não ter interesse ou ser incapazes de copular.

Significa também que cães de trabalho poderiam ter seu material genético preservado antes da castração. Assim, eles poderiam ser reproduzidos posteriormente, de forma a preservar cães com características desejáveis. Junto da técnica de edição genética CRISPR/Cas9, a fertilização in vitro poderia possibilitar a erradicação de males específicos de determinadas raças como displasia de quadril ou cálculos renais.

"Cães têm muitas doenças genéticas e cânceres muitos semelhantes aos que ocorrem em humanos", explicou Nagashima. "Se pudermos compreender como essas doenças funcionam em cães, seria o primeiro passo para erradicá-las."

Tradução: Thiago "Índio" Silva