O Partido Republicano autorizou vender os dados digitais dos cidadãos americanos sem consentimento deles
Crédito: Gage Skidmore/Flickr

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O Partido Republicano autorizou vender os dados digitais dos cidadãos americanos sem consentimento deles

Ativistas pró-privacidade digital definiram a lei como um presente para a indústria de provedores de internet.

Dados médicos e financeiros. CPFs. Histórico da internet. Uso de aplicativos móveis. O conteúdo de seus emails e conversas online.

Essas são algumas das informações privadas que deputados republicanos decidiram disponibilizar, numa votação na última terça-feira, a provedores de internet para fins comerciais, despertando a indignação de ativistas da privacidade digital.

A decisão da câmara, indeferida após uma votação com 215 votos a favor e 205 contra, é o ataque final à política de privacidade do consumidor aprovada em 2016 pela Comissão de Comunicação Federal (FCC, na sigla original). Essa política, que deveria entrar em vigor no final desse ano, exigiria que os provedores de internet obtivessem o consentimento de seus clientes antes de usar, compartilhar ou vender seus dados pessoais.

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"Ignorando ligações de milhares de constitituintes, os deputados republicanos acabaram de se unir ao seus colegas do Senado na violação do direito à privacidade dos usuários da internet", disse Craig Aaron, diretor-executivo da organização Free Press Action Fund, em comunicado. "Eles votaram contra o direito à privacidade de milhões de americanos só para que alguns gigantes do setor de telecomunicação pudessem aumentar seu já exorbitante lucro."

No ano passado, o Senado americano aprovou sua versão desse mesmo projeto de lei. O Presidente Trump, que apoia "veementemente" o fim da política de privacidade do FCC, irá assinar a medida em breve, como parte de uma crescente campanha republicana a favor da reversão de garantias de privacidade federais em vários setores da economia, incluindo medidas de proteção ao meio-ambiente, à saúde pública e ao interesse dos consumidores.

Ativistas pró-privacidade digital afirmam que a política da FCC é necessária, já que os provedores de internet têm acesso a tudo que seus clientes fazem online. A menos que você use uma Rede Virtual privada (ou VPN, na sigla original), cada site que você acessa, cada app que você usa e cada busca que você faz podem ser acessados pelos provedores. Esses dados são extremamente valiosos, visto que podem ser utilizados na criação de perfis empregados na venda de produtos e no rastreamento de indivíduos ou grupos.

Empresas como a Comcast, a AT&T e a Verizon já ganham bilhões de dólares anualmente com assinaturas de internet, TV à cabo e telefonia móvel. Agora, essas empresas terão a oportunidade de lucrar ainda mais com a venda de dados privados para empresas de marketing.

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"O que vocês estão pensando? Que ideia é essa?

No ano passado, a FCC disponibilizou uma lista detalhada dos dados protegidos por sua política de privacidade. Mas graças ao partido republicano, essas empresas não são mais obrigadas a obter a permissão de seus clientes antes de usar, compartilhar ou vender seus dados.

"O que vocês estão pensando?", questionou o Dep. Michael Capuano, um democrata do estado de Massachusetts, aos seus colegas republicanos durante a votação, na última terça-feira. "Que ideia é essa? Por que vocês dariam suas informações pessoais a uma empresa sem escrúpulos que só quer ganhar dinheiro?".

Defensores do direito à privacidade estão  indignados, visto que os legisladores republicanos estão destruindo a política de privacidade da FCC com ajuda da Lei de Revisão Parlamentar (CRA, na sigla original), uma ferramenta legislativa polêmica que permite que o Congresso anule decretos recentemente aprovados. Resoluções de desaprovação aprovadas sob a CRA não podem ser obstruídas, e, além disso, a agência em questão, no caso a FCC, está proibida de adotar uma política de privacidade similar no futuro.

"Uma vez que o Presidente Trump assine a resolução, não haverá nenhuma forma legal de proteger e os dados pessoais coletados pelos provedores de internet", disse Dallas Harris, especialista em políticas públicas da Public Knowledge, um grupo pró-direitos digitais, em um comunicado. "Sem a política de privacidade digital da FCC, os americanos deixarão de ser usuários da internet e passarão a ser ferramenta de marketing — antes indivíduos, hoje produtos".

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Não é de se surpreender que muitos dos deputados republicanos que estão lutando contra a política de privacidade da FCC, incluindo a Dep. Marsha Blackburn, do estado de Tennessee, receberam grandes quantias em financiamento de campanha da indústria de provedores de internet.

Ao longo de seus 14 anos de carreira na Câmara, a deputada Blackburn recebeu US$75.750 da AT&T e US$$72.650 da Verizon, seus segundo e terceiro maiores financiadores empresariais, respectivamente, de acordo com a organização Center for Responsive Politics. Além disso, Blackburn também recebeu US$66.000 da NCTA, um grupo comercial de empresas do ramo da internet, e US$49.500 da Comcast.

No último ano, a indústria de provedores de internet vêm alegando que a política de privacidade da FCC é injusta, visto que ela não se aplica a "provedores de ponta", como o Google e o Facebook, que respondem à Comissão de Comércio Federal (FTC, na sigla original). Mas em vez de tentar melhorar a política de privacidade da FTC, criando assim uma condição de igualdade dentro da indústria, os legisladores republicanos decidiram simplesmente acabar com a política da FCC. Agora, a próxima parada da nova proposta de lei de privacidade é a mesa de Trump.

"Se o Presidente Trump estivesse levando sua promessa de defender os indivíduos dos interesses dos políticos, ele vetaria essa proposta de lei", disse Nathan White, Gerente Legislativo Sênior da Access Now, em um comunicado.

Tradução: Ananda Pieratti