FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

Cientificamente, é possível acabar com a corrupção?

Será que existe algum ato, medida, lei ou punição capaz de exterminar esse mal de uma vez por todas?

A Lava Jato revelou um dos maiores esquemas de corrupção já vistos no Brasil. Mas não foi o primeiro caso do gênero e não será o último. Há pelo menos dois mil anos já se sabe que os "favores" são práticas humanas comuns. Tanto que mereceram destaque no Inferno, de Dante Alighieri, e em Arthashastra, tratado de ciência política escrito pelo primeiro-ministro indiano Cautília (371 - 283 a.c). Apenas nos anos é que a transparência se tornou uma qualidade desejada nos negócios públicos e o assunto veio à tona com força. Parece que todo dia são descobertas novas falcatruas, em todos os níveis e esferas de governo e da política. Aqui no Brasil, como sabemos, o combate à corrupção virou mote de protesto de rua e movimentos políticos. Bom, pelo menos até o impeachment de Dilma Rousseff. Tentando surfar essa onda, o Ministério Público Federal propôs "10 medidas contra a corrupção", dentre as quais estavam até "pegadinhas" para testar a idoneidade de servidores públicos. O projeto causou polêmica: houve quem dissesse que estar contra ele seria um ato antipatriótico, e outros consideram as tais medidas insuficientes e populistas. Agora, cá entre nós: será que existe algum ato, medida, lei, punição, capaz de exterminar esse mal de uma vez por todas? É possível acabar com a corrupção?

Publicidade

Dando nomes aos bois

Fala-se muito sobre a tal da corrupção, mas o que ela é? Como se define um ato de corrupção. O Banco Mundial usa a seguinte definição: o abuso do poder público para o benefício privado. Repare que não necessariamente estamos falando de maços de dólares em cuecas. Aqui cabem casos diversos, como, por exemplo, fazer vista grossa para irregularidades cometidas por aliados políticos. Ou um funcionário público que tira licença médica e, na verdade, viaja para passear. Mas a noção de corrupção também pode ser aplicada ao setor privado. Quando, por exemplo, uma pessoa quer uma vaga cobiçada numa multinacional e paga "por fora" para ser contratado.

Não cabe na régua

Um dos primeiros problemas que essa questão traz é que simplesmente não é possível medir o tamanho do prejuízo que a desonestidade pública causa. Quem diz isso não sou, mas o famigerado Fundo Monetário Internacional, o FMI. Em um estudo publicado em 1998, o órgão afirma que esse cálculo é impossível de se fazer em qualquer escala. O que fazer, então? Deixar rolar? Uma alternativa possível é medir a percepção de corrupção. Embora ele não reflita o problema em valores absolutos, esse dado ajuda a entender o quanto a corrupção está espalhada na sociedade. E pode orientar leis e medidas para combatê-la.

Leia também: Os robôs podem ser o futuro do combate à corrupção no Brasil?

Endurecer as leis

É clichê, mas os desvios ocorrem porque as leis são permissivas. As penas são leves e a possibilidade de entrar com recursos faz com que processos se arrastem por anos até que algo aconteça. A solução seria, claro, punir com severidade quem frauda licitações, devia ou participa do desvio de dinheiro público.

Cargos de confiança

A cada novo governo, troca-se uma grande quantidade de funcionários que são indicados pela gestão que toma o poder. São os chamados cargos comissionados. Para conseguir o emprego, a pessoa é indicada. Só no governo federal, são mais de 20 mil. Geralmente, estão na fila pessoas do partido vencedor ou aliados políticos. Isso facilita a corrupção, já que coloca dentro das estruturas públicas pessoas que podem não ter compromisso com a "coisa pública" a longo prazo. Diminuir o número desses cargos trocando-os por concursados pode ajudar a diminuir os desvios nas repartições e governos.

Teto de vidro

ONGs como a Transparência Internacional defendem a abertura de dados dos governos para aumentar o controle sobre o que eles fazem. Dessa maneira, os gastos, orçamentos e qualquer fluxo de dinheiro feito pelos órgãos públicos devem estar ao alcance dos cidadãos. O governo federal tem o Portal da Transparência, que divulga esses dados e foi implementado durante a gestão Lula. A Lei de Acesso à Informação, criada em 2012, obriga a todos os entes públicos a tornar os dados públicos. A Controladoria-Geral da União (CGU) é quem fiscaliza o cumprimento da lei e emite um ranking anual dando notas a estados e cidades que se conformam à legislação.

Diploma

Transparência, leis e outras medidas podem ser eficientes, mas não têm o poder de diminuir a corrupção se não forem combinadas com a educação da população. Segundo especialistas, este é um dos únicos fatores que foi capaz de diminuir os níveis de corrupção. Ela funciona porque cria valores comuns à toda sociedade, que superam a identificação com grupos menores e facções. Com um povo mais educado, o país passa a ter também uma população com níveis de renda e igualdade maiores.

Acaba ou não acaba?

Chega de blá-blá-blá: existe alguma coisa que vai acabar de vez com isso? A resposta é dura: não. Por mais criativos que sejam nossos legisladores, por mais potente que a tecnologia se torne, os seres humanos sempre vão encontrar uma maneira de pular as barreiras. Sabemos que as pessoas são imprevisíveis, por isso é impossível garantir que as leis não serão burladas nunca. Quando discutimos essa questão, parece haver um consenso universal de que é necessário extirpar tal "câncer" da sociedade. Mas cada pessoa pode ter uma visão específica do que é certo ou errado. E não é possível prever como iremos nos comportar com tanto poder (e dinheiro) nas mãos. O único jeito de minimizar a corrupção é mantendo a transparência a vigilância.

Diogo Antonio Rodriguez é jornalista e editor do meexplica.com. Na coluna Motherboard Destrincha, ele resume os assuntos mais intrincados da ciência e da tecnologia. Siga-o no Twitter.