O Protesto que Robôs Governistas do México Não Conseguiram Silenciar
Protesto em Ayotzinapa. Créditos: Rebecca Blackwell/AP

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O Protesto que Robôs Governistas do México Não Conseguiram Silenciar

As tentativas do governo mexicano de silenciar manifestações no Twitter não funcionaram tão bem quanto no passado.

O dia 26 de setembro marcou o aniversário de um ano dos sequestros na aldeia de Ayotzinapa, no estado de Guerrero, no México, quando 43 estudantes foram capturados pela polícia municipal de Iguala e desapareceram.

E, claro, a data foi motivo de ataques ao governo mexicano, que adotou postura bastante controversa no caso. Um dos meios de protesto da população foi agir contra propagandas governistas no Twitter.

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Sob a liderança do presidente Enrique Peña-Nieto, a administração atual do México supostamente usa mais de 75 mil contas de Twitter automatizadas – os "Peñabots" – para silenciar e deter críticas ao governo. As arrobas diluem Trending Topics (TTs), conduzem campanhas de difamação e, por vezes, até mandam ameaças de mortes a indivíduos.

Um ataque de Peñabot é muito simples: de acordo com pesquisadores, as contas automatizadas, que chegam a postar 20 ou mais tuítes por segundo, "evenenam" as hashtags dos TTs, isto é, postam spam sem sentido e mensagens vazias com os tópicos.

Os tuiteiros de verdade foram bem menos sabotados do que nos meses anteriores

O truque engana o algoritmo do Twitter e faz com que a rede retire a hastag dos TTs, dificultando, assim, a comunicação entre manifestantes e diminui a probabilidade de tuítes verdadeiros — postados por conexões humanas reais — serem espalhados pelo mundo.

Essa forma de ataque corta com sucesso a comunicação entre os manifestantes que postam no Twitter, em tempo real, pois o indicador de novidades da rede avalia a taxa de tuítes com determinada hashtag e a considera spam.

A mesma estratégia foi usada contra a hashtag #YaMeCanse ("Já cansei"), em dezembro de 2014. Na época, Jesus Karam, procurador geral do México, acabou com uma coletiva de imprensa antes da hora — mandou um "chega, estou cansado" quando questionaram sua declaração acerca da investigação meia-boca do governo no caso dos estudantes desaparecidos.

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A hashtag #YaMeCanse ajudou a organizar a crítica ao governo mexicano nos meses após a versão oficial da "verdade histórica', divulgada pela Procuradoria Geral do país.

Pouco tempo depois, a apresentadora Carmen Aristegui — cuja equipe de investigações encontrou evidências de que Peña-Nieto recebera propina do Grupo Higa, que fechou um contrato lucrativo com o governo mexicano — foi demitida, sem explicações, da emissora MVS, onde ela comandava um programa de entrevistas. Assim que a notícia chegou ao Twitter, #EnDefensaDeAristegui ("Em defesa de Aristegui") começou a bombar.

Ataques de Peñabots contra essas duas hashtags incitaram versões subsequentes dos tópicos, com números no final da hashtag, para vencer os bots. As hashtags originais desapareceram por completo das listas de TTs.

Outras formas de ataque incluem a criação de falsos TTs, que os bots linkam a propagandas governistas.

Os detalhes dos sequestros de Ayotzinapa — descritos em um relatório independente, financiado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos — diferem bastante da versão oficial, divulgada pela Procuradoria Geral do México. As discrepâncias impulsionaram discórdia dia 26 de setembro, e mexicanos protestaram na capital, de Los Pinos — a Casa Branca deles — até Zocolo, em memória e em busca de justiça para os estudantes e suas famílias.

A principal hashtag do dia foi #DiaDeLaIndignacion ("Dia da indignação"). Embora o tópico tenha sofrido com spam de propaganda governista, parece que as conexões entre os tuiteiros de verdade que usaram as hashtags foram bem menos sabotadas do que nos meses anteriores.

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Enquanto #DiaDeLaIndignacion figurava nos TTs do México, sábado, Peñabots apostavam na hashtag prazarosa #HoyPintaPara ("Hoje é um bom dia para", frase para ser concluída pelos usuários). Contudo, angariaram muito menos tuítes do que a hashtag #DiaDeLaIndignacion. O desvio simultâneo dos Peñabots para o tópico mundial #BatmanDay também foi fichinha perto das conexões reais entre manifestantes mexicanos.

Estima-se que 96% dos mexicanos entre 20 e 30 anos de idade usam redes sociais como meio de comunicação, entre os quais 57% possuem smartphones. O Twitter é uma ferramenta utilizada por muitos manifestantes no México para compartilhar fotos em tempo real, bem como informações de segurança, rotas de protesto e violações aos direitos humanos por meio dos TTs, que, por sua vez, disseminam as informações mundo afora. Os Peñabots foram feitos para combater essas redes de pessoas, segundo pesquisadores.

Erin Gallagher, criador do vídeo "Mexican Botnet Dirty Wars", conta que o caráter velado da burocracia mexicana dificulta a manutenção de uma linha direta entre a gestão Peña-Nieto e os bots.

Mas fortes evidências sugerem que os bots automatizados que pulverizaram as críticas a Enrique Peña-Nieto durante a campanha presidencial%20st-elecciones/ectivistas-confirman-acciones-de-los-pena-bots-en-twitter/)) de 2012 são os mesmos bots governistas (ou, pelo menos, os mesmos bots contratados) que reprimem a revolta do público frente à administração, sobretudo no caso dos sequestros de Ayotzinapa.

Tradução: Stephanie Fernandes