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Encontrar uma Nova Espécie de Sapo em Nova York é Difícil Pra Cacete

No fim da semana passada, foi anunciado que uma nova espécie de sapo havia sido descoberta: não em algum canto remoto da selva, mas sim no meio de Nova York.
A nova espécie de sapo. Crédito: Brian Curry/Rutgers University

No fim da semana passada, foi anunciado que uma nova espécie de sapo havia sido descoberta: não em algum canto remoto da selva, mas sim no meio de Nova York.

Jeremy Feinberg, um doutorando em ecologia da Universidade de Rutgers, é o principal autor de um artigo científico publicado na PLOS One que descreve a nova espécie de sapo-leopardo, que havia sido previamente confundida com outros sapos similares. Os pesquisadores o nomearam como Rana kauffeldi, em homenagem ao ecologista Carl Kauffeld, que descreveu o sapo em 1937, mas não conseguiu provar que o sapinho analisado fazia parte de outra espécie.

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Não é todo dia que se descobre um nova espécie no meio de uma das áreas mais exploradas do mundo. Como parte de uma nova série que explora o verdadeiro trabalho por trás das descobertas científicas, Feinberg nos contou como ele achou um novo tipo de sapo por sorte e o seu esforço para comprovar sua teoria.

Jeremy Feinberg, criando girinos em um cercadinho para estudar a extinção naquela área. Crédito: Chris Donnell

MOTHERBOARD: Você encontrou uma nova espécie de sapo. Como esse tipo de descoberta acontece?

Jeremy Feinberg: As pessoas que trabalham com isso costumam se focar em áreas sem muita incidência de pesquisa, ou com muita biodiversidade. Normalmente uma floresta tropical ou uma região remota que nunca foi muito estudada. No caso dessa descoberta, não havia intenção, nem plano; foi um completo acidente.

A minha formação não está ligada à genética ou taxonomia, então a última coisa que eu esperava era encontrar uma nova espécie. Eu sou um ecologista, e estava fazendo um trabalho de campo sobre o sapo que eu normalmente estudo quando tive a sorte de ouvir um som que o sapo macho faz, um tipo de chamado que não era o som que essa suposta espécie deveria fazer. Esse foi o início de uma aventura que durou praticamente seis anos.

Da hora, então você praticamente deu de cara com o sapo.

Pode-se dizer que sim! Foi o que aconteceu. Eu acho que o fato de a) eu não estar preparado ou treinado para isso e b) isso ter acontecido na cidade de Nova York e não em uma dessas áreas remotas — criou um pouco de desconfiança e ceticismo entre pesquisadores que poderiam ter me ajudado com a parte da genética. Eu tive que ralar um pouco, e resolvi ir atrás de qualquer um que mexesse com genética.

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Recebi muitas risadinhas encorajadoras e tapinhas nas costas, mas acho que a maioria das pessoas não estava muito afim de se envolver. Foram quase dois anos até eu ter a sorte de cair nas graças de três geneticistas: Catherine Newman, Brad Schaffer, e Leslie Rissler. Eles estavam fazendo pesquisas sobre os sapos-leopardos, e estavam dispostos a me dar atenção e dar uma olhada na parte genética da coisa.

AS PESSOAS VÃO RIR E DIZER COISAS TIPO 'AH, ELE NÃO É FOFO? UM ECOLOGISTA ACHA QUE ENCONTROU UMA NOVA ESPÉCIE EM NOVA YORK…'

Qual é a parte mais difícil do trabalho?

Bem, nesse caso a parte mais difícil era saber que a minha experiência e treinamento estavam dentro do campo da ecologia tradicional, que atualmente saiu de moda e foi substituído pela tecnologia molecular e afins. Foi muito difícil entender que eu estava perto de uma descoberta importante e pensar, puxa, eu sinto que estou no caminho certo— mas o que eu faço com essa informação? As pessoas vão rir e dizer coisas tipo 'Ah, ele não é fofo? Um ecologista acha que encontrou uma nova espécie em Nova York…'

A segunda resposta para essa pergunta é que eu não sabia escrever a descrição de uma nova espécie ou fazer uma análise bioacústica, e essas foram as partes em que eu mais me esforcei. Eu fui o autor principal do artigo, e também fiz a análise bioacústica. Foi muito incrível ter que aprender sozinho a navegar em duas áreas científicas diferentes no sexto e sétimo anos do meu PhD, que abordava tópicos completamente diferentes.

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De forma bem resumida, como foi esse processo?

Num primeiro momento, eu li muitas descrições de espécies. Eu me limitei aos vertebrados, daí répteis e anfíbios, passando para as salamandras e sapos e então apenas em sapos. Observei um estilo ou padrão que estava sendo utilizado na descrição de novas espécies de sapos. Aí eu pensei, ok, é assim que se faz. É claro que eu podia ter perguntado para especialistas, mas eu não tinha muito acesso à pessoas que já tivessem feito muitas descrições. No meu grupo de pesquisas, ninguém é taxonomista.

Com a bioacústica aconteceu a mesma coisa. Eu comecei e baixar softwares e aprendi a mexer eles — fui autodidata. Li vários artigos com análises bioacústicas. A última peça do quebra-cabeça, uma das partes mais difíceis da pesquisa, foi sair por aí e gravar não só os sons da nossa espécie, mas de todas as cinco espécies que analisamos, porque queríamos ser muito minuciosos.

Como você explica o que você faz para aqueles que não são cientistas?

É difícil. A maioria das pessoas, especialmente na minha época de faculdade e no começo da minha carreira, falavam "Esse é o meu amigo Jeremy, ele é um guarda florestal", ou "Esse é o meu amigo Jeremy, ele é um biólogo marinho". Isso é bem interessante; quando as pessoas pensam em alguém trabalhando no campo da ecologia elas automaticamente pensam em guardas florestais ou biólogos marinhos. Aí eu chegava e dizia "Bem, eu definitivamente não uso um chapéu e não sou nada intimidador, então não sou um guarda florestal; e eu definitivamente não pesquiso sistemas de água salgada, só ambientes de água doce."

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Eu basicamente explico para as pessoas que eu estudo a vida selvagem, sua ecologia e sua conservação. Depois que eu explico isso e acrescento que eu tenho um foco em répteis e anfíbios, elas entendem rapidinho.

Feinberg, trabalhando em água doce. Crédito: Chris Donnelly

No que você está trabalhando atualmente?

Na verdade, eu tinha meu PhD todo planejado antes desse acidente acontecer. Eu estava no quinto ou sexto ano da minha formação quando essa descoberta colossal caiu no meu colo, virou minha maior prioridade e praticamente acabou com o meu foco no PhD. Então eu estou muito empolgado: estou finalmente voltando a trabalhar na minha dissertação.

Essa nova espécie será um dos três capítulos da dissertação, mas os outros dois são voltados para a minha verdadeira paixão, o que eu sempre quis estudar: por que os sapos-leopardos sumiram de Long Island e Nova York? Long Island é a maior ilha continental do país; a área é enorme, e entre 1980 e 2000 a população do sapo leopardo sofreu um declínio vertiginoso e desapareceu sem chamar a atenção de ninguém.

Eu comecei a perguntar há 10 ou 15 anos atrás — Alguém notou que esses sapos sumiram?— inclusive para os biólogos da região, que deveriam estar atentos a isso. As pessoas diziam "Não, tem umas populações em tal e tal lugar", e eu ficava tipo, "Não, não tem nada lá; eles sumiram."

Eu estou muito empolgado para terminar o trabalho que explica o motivo desse desaparecimento; foi esse trabalho que me levou à descoberta acidental da nova espécie, mas ele também inclui uma vertente de pesquisa que estuda como os girinos sobrevivem quando inseridos em um local no qual eles foram extintos. Nós os criamos em cercados de arame para descobrir o que acontece quando eles são devolvidos à essas áreas de extinção, então tem muita coisa interessante sendo feita nessa pesquisa.

​Ciência É Foda é uma nova série na qual o Motherboard conversa com cientistas sobre o trabalho laborioso por trás das descobertas científicas e sobre o que eles realmente fazem da vida.

Tradução: Ananda Pieratti