Por que a polícia canadense matou um hacker aparentemente inofensivo?
Sam Maloney e seu software revelam uma história de uma mente inteligente e, ao mesmo tempo, bastante perturbada. Crédito: Dan Woodruff / Getty Images

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Tecnologia

Por que a polícia canadense matou um hacker aparentemente inofensivo?

Sam Maloney e seu software revelam uma história de uma mente inteligente e, ao mesmo tempo, bastante perturbada.

Sam Maloney aparenta ter 21 anos. Nas fotos do Facebook, aparece sorrindo, bem como os calouros universitários a seu redor. Seu rostinho de menino se encaixa muito bem nas comemorações da semana dos bixos de 2015; ele parece contente, empolgado. Todo mundo parece.

Mas Maloney não tinha 21 anos, apesar do que aparentemente costumava dizer a seus colegas de curso quando se matriculou em ciência da computação e foi morar no conjunto residencial da Universidade do Oeste de Ontário, na cidade de London, a duas horas de Toronto, no Canadá.

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Na verdade, Sam Maloney era um desenvolvedor freelancer de 35 anos de idade, programador autodidadata, adepto a sistemas computacionais distribuídos e criptografados. E embora tivesse um quarto no dormitório da universidade, Maloney tinha uma união estável com Melissa Facciolo e dois filhos. Sua família tinha uma casa a 15 minutos de carro do campus.

Em 23 de dezembro de 2016, Maloney, já não mais matriculado na universidade, foi morto a tiros pela polícia canadense depois de supostamente enfrentar as autoridades com uma balestra durante uma batida em sua casa, de manhã cedo.

Segundo o advogado do hacker, Phil Millar, a polícia tinha um mandato para apreender o computador de Maloney. Suspeitavam que ele havia hackeado o site de um cinema local. O culpado postara um manifesto chamado "Declaração de Independência de Atlantis", que maldizia miscigenação. Poucos dias antes do ataque à página do cinema, Maloney havia postado textão com título similar no Facebook. Segundo Millar, o cinema era cliente de Maloney na época.

A esposa e os dois filhos de Maloney, de dois anos e seis meses de idade, estavam presentes quando ele foi morto, de acordo com Millar. Quando foi alvejado, ele estava ao telefone com seu advogado, Nick Cake. A cidade não vivenciava uma morte a tiros com policiais envolvidos há 17 anos.

A morte de Maloney está sendo investigada pela Unidade de Investigações Especiais (SIU) da província, que trata de casos envolvendo autoridades, e a polícia de London está repassando as informações acerca do caso à unidade. Tanto a polícia de London quanto a SIU se recusaram a dar detalhes sobre o incidente relatado neste artigo por conta da investigação em curso.

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Mais informações sobre o caso ainda serão divulgadas. O governo canadense está indiciando a esposa de Maloney por desrespeitar uma proibição de armas imposta há 10 anos, em 2007, dado que ela se declarou culpada por armazenar indevidamente milhares de munições em domílicilio. Isso significa que o governo precisará disponibilizar informações sobre a morte de Maloney para o julgamento.

A pergunta que não quer calar é: quem era Sam Maloney?

Tribunal de London, Ontário, onde conheci Phillip Millar, advogado da companheira de Maloney, Melissa Facciolo. Créditos: Autor

O melhor porta de entrada para compreender Maloney é a causa para a qual ele dedicou a vida: seu software. Ela oferece um vislumbre de seus talentos inatos e aponta também para uma mente perturbada.

MORPHiS, um sistema P2P para compartilhar e criptografar arquivos, era o principal projeto de Maloney. Era um software de código aberto, o que significa que qualquer pessoa poderia contribuir com o código, mas o repositório online mostra que Maloney era o principal colaborador. O MORPHiS contava com uma pequena, porém devota comunidade de usuários, dos quais 135 compunham um subfórum no Reddit voltado para o assunto.

Uma comunidade de criptografia comentou sua morte repentina em um fórum do Reddit sobre bitcoin; também teceram um breve obituário de Maloney em um blog sobre o mercado de bitcoin.

"O MORPHiS funcionava perfeitamente como um sistema de arquivos distribuídos (em outras palavras, era possível armazenar arquivos no banco de dados do MORPHiS, para que outros usuários os acessassem de seus respectivos computadores, caso soubessem o 'endereço' dos arquivos), e dava para enviar mensagens criptografadas para os demais usuários do serviço", Klaus Seistrup, enfermeiro dinarmaquês de 56 anos de idade que colaborava com o código, explicou em um e-mail.

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Maloney também criou um serviço de e-mails critpografados chamado Dmail, e um protocolo de troca de mensagens criptografado, "à prova de spam", chamado Dpush. Tudo isso antes dele se matricular na universidade, sem treinamento acadêmico algum.

"Estou fazendo isto de graça, para a humanidade, porque odeio o mal"

"Ele compreendia a tecnologia de programas à prova de censura, entendia as fraquezas de cada tipo, e dava duro para criar uma nova solução", Emin Gün Sirer, professor de ciência da computação da Universidade Cornell que leu o informe oficial sobre o Dpush, escreveu para mim em um e-mail.

De acordo com o pai — técnico qualificado em satélites, ex-funcionário do Ministério do Meio Ambiente do Canadá —, Maloney demonstrava um talento nato para a programação desde tenra idade.

"Percebi o quão talentoso ele era quando ele tinha nove ou 10 anos de idade", disse o pai de Maloney ao telefone, de sua casa em St. Thomas, Ontário. "Voltei do trabalho um dia, e ele estava com um Commodore 64, tentando movimentar sprites pela tela. Eu disse que ele precisava aprender numeração hexadecimal e binária, e ele disse, OK, me mostra. Ele sequer tinha noção de numeração decimal."

Não demorou muito para o jovem Maloney superar as habilidades do pai.

"Outro dia, cheguei em casa, e ele estava movendo tudo quanto é sprite pra lá e pra cá", disse o pai de Maloney. "Ele aprendeu tão rápido, que era capaz de converter números binários em hexadecimais praticamente de cabeça, e tinha apenas 10 ou 11 anos na época."

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O MORPHiS e os demais projetos de Maloney sugerem uma mente paranóica e um posicionamento avesso a autoridades. Ao que parece, o projeto e sua persona online eram formas de exorcizar demônios e ideias obscuras.

"Estou fazendo isto de graça, para a humanidade, porque odeio o mal", Maloney escreveu na homepage do MORPHiS. Segundo as anotações de Maloney, o MORPHiS seria um alicerce para o tal "cérebro do mundo" — ideia concebida pelo autor de ficção científica H.G. Wells nos anos 30 —, que por sua vez estabeleceria uma "consciência humana unificada". Para ele, era uma missão, um "chamado".

Sob a alcunha online "MorphisCreator" [Criador do Morphis], Maloney deixava seus seguidores a par do progresso do software. Também abriu um fórum no Reddit chamado "A Nação de Atlantis", cujas postagens praguejam contra "globalistas" — termo popular entre teóricos da conspiração — e "integração forçada", e clamam pela criação de uma democracia digital voltada para a preservação de linhagens raciais. A tecnologia fundamental dessa sociedade baseada em raças, escreveu ele, seria o MORPHiS.

"Os textos técnicos redigidos por Maloney revelam uma visão de mundo marcada por uma profunda desconfiança diante de qualquer pessoa ou qualquer coisa relacionadas a posições de poder", Sirer me escreveu. "O sistema que ele criou estava todo estruturado a fim de decentralizar o acesso a dados, para garantir que não houvesse guardiões ou censores."

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Embora a vontade de conceber uma tecnologia em prol da privacidade seja louvável — e nesse sentido, "precisamos mesmo de pessoas como ele" —, Sirer prosseguiu, "uma mentalidade antagônica pode se transformar em beligerância, e uma postura cética saudável pode se perder em paranoias, especialmente em conjunto com outras narrativas facciosas, como racismo ou vitimismo."

Essa mentalidade transbordou para a vida offline de Maloney.

Rehan Basson é um designer gráfico de 29 anos, residente de Moncton, cidade situada na província canadense de New Brunswick. Em 2015, ano da passagem de Maloney pela universidade, Basson era presidente do Partido Libertário do Canadá. (A extrema direita o criticava por focar em questões LGBTQ.) Os dois eram amigos e se falavam com frequência.

Basson conheceu Maloney em 2014, em um protesto na cidade de London, Ontário, contra a lei C-51, um projeto extremamente controverso de vigilância. Basson era estudante da Universidade do Oeste de Ontário na época, mas Maloney ainda não havia se matriculado.

Conversei com Basson por telefone, e segundo ele, os dois se uniram pela convicção mútua de que o governo não serve para nada. A regulamentação da privacidade era de interesse de ambos. Basson disse que a dupla tinha desentendimentos significativos, especialmente no que dizia respeito às crenças racistas e posicionamento anti-imigração de Maloney. Inclusive, essas convicções "parecem ter motivado bastante [Maloney]", disse Basson.

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"Dava para ver que era uma questão e tanto para ele, mas ele tinha uma maneira funcional de lidar com isso, que era dedicar seu tempo ao software de código aberto", disse Basson.

Basson e Maloney elaboraram um plano para aplicar a tecnologia do MORPHiS — tabelas hash distribuídas — a um programa para intensificar a transparência do governo, não muito diferente das diversas propostas de block chains de bitcoin para o governo. Eles queriam uma revolução. Nada mais, nada menos. Não é de admirar que a ideia tenha mexido com Maloney, que estava focado numa missão própria, de combater o mal por ele percebido.

"Ele era um hacker, e tentava viver seus ideais desafiando o sistema"

A dupla se falava com frequência para discutir o projeto, até dois meses antes da morte de Maloney. "Ele se preocupava tanto com questões de privacidade, que volta e meia tomava precauções incomuns, como manter distância de celulares próximos por receio de espiões em potencial", disse Basson.

"Sempre que MORPHiS entrava em pauta, acabávamos debatendo essas ideais mais grandiosas", disse Basson. "Sempre havia algum tópico mais importante associado, nos deixando com uma perspectiva mais ampla em mente".

Phil Millar, advogado de Melissa Facciolo, companheira de Maloney, acredita que ele buscava levar seus ideais a cabo conforme lhe cabia, isto é, no papel de um programador autodidata, residente de uma pequena cidade canadense. "Ele era um hacker, e tentava viver seus ideais desafiando o sistema", disse ele.

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Embora a ficha de Maloney estivesse limpa desde 2005, segundo Millar, uma série de incidentes no passado recente apontam para uma postura antiautoritária meio boba.

No verão passado, Maloney deixou crescer a grama do jardim até "meio metro de altura", conforme descreveu o vizinho Mike Irling. A vizinhança reclamou, segundo reportagens, então a prefeitura apareceu e aparou o jardim. "Chegaram com um cortador de grama, e pronto", disse Irling.

O blog MORPHiS pintou um relato mais sombrio do caso. Os funcionários da prefeitura foram descritos como "vândalos", o corte da grama, um "crime", e a atitude do governo, em geral, ameaçadora e hostil. O blog também relatou por alto que Maloney "deu as caras, acusou a prefeitura de invadir sua propriedade, e pediu para deixarem o local".

O vizinho Elias Balch, que não estava presente no incidente, mas escutou a história de seus pais, conta uma versão diferente.

"Os funcionários da prefeitura vieram aqui cortar a grama, e Sam saiu de casa com um cano em mãos e ameaçou bater neles, então foram embora", Balch contou em uma entrevista.

Além disso, no verão de 2016, Maloney foi preso ao visitar um templo (relatos da mídia contam que era budista, ao passo que o blog MORPHiS diz hinduísta) e se recusar a sair. O blog MORPHiS defende que ele estava no local apenas para aprender sobre a religão. Maloney chegou a enfrentar acusaões por desacatar autoridades, mas as queixas foram retiradas. Segundo o blog MORPHiS, Maloney sofreu diversas lesões durante a detenção, que ele fotografou e documentou no site.

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Parecia que seu comportamento estava se agravando.

Em dezembro de 2016, o site de um cinema independente local foi hackeado com uma mensagem aparentemente racista, radical e incoerente. Embora a polícia não tenha provado que foi Maloney de fato quem hackeou o site, um manifesto de título e mensagem semelhantes despontou na página pessoal de Maloney no Facebook poucos dias antes do ocorrido.

Quanto a seu comportamento, Millar descreve Maloney como alguém de "sonhos gloriosos", mas que não passava de "peixe pequeno", dada suas condições de vida.

Uma interpretação possível das últimas atividades de Maloney é que, enquanto ele construía um novo mundo online, suas visões se traduziam em um comportamento errático no cotidiano, na vida real.

Conjunto residencial da Universidade do Oeste de Ontário onde Maloney morava. Créditos: Autor

O detalhe mais intrigante dessa história toda, que leva à crença de que Maloney levava uma "vida paralela", é seu ano de calouro na universidade, supostamente alegando ter 21 anos.

A família de Sam — incluindo seu pai e sua companheira — sabia que ele estava na universidade, e que morava no campus. Por que Maloney cursou a universidade e morou no dormitório local, apesar de ter casa, companheira e filhos nas redondezas? As explicações variam dependendo do interlocutor. O pai de Maloney acredita que ele tenha cursado a universidade para encontrar um emprego melhor.

"Ele sabia tudo de cor e salteado, mas percebeu que a maioria dos empregos exigia diploma", disse Peter Maloney. "Esse é o principal motivo, creio eu — trabalhar com software e tal. Ele queria aperfeiçoar suas habilidades matemáticas, então fez matemática, mas também estava interessado em filosofia e religião, esse tipo de coisa."

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Quanto ao motivo dele residir na universidade, seu pai disse que era porque precisava de um lugar tranquilo para trabalhar. "Ele levava os estudos muito a sério, e com um bebê recém-nascido em casa, chorando, não conseguia trabalhar", disse.

Contudo, nada disso bate com o retrato de Maloney pintado pela mídia: ele dizia aos colegas de classe que tinha 21 anos e frequentava as festas do dormitório. Uma explicação alternativa, mais simples, é que ele estava profundamente infeliz e buscava algum tipo de escape.

"Ele definitivamente apresentava sinais de depressão, mas eu achava que ele estava tentando sair dessa"

"Ele definitivamente apresentava sinais de depressão", contou Basson, amigo e colaborador de Maloney. "Mas eu achava que ele estava tentando sair dessa".

Os textos de Maloney no site do MORPHiS revelam um homem que se dedicava ao software não apenas para construir seu projeto de mundo melhor, mas para aplacar uma inquietação profunda.

"A certa altura, percebi que estava muito infeliz", Maloney escreveu no site, "tanto por conta do estado do mundo quanto pelo tédio em ser um programador comercial no mundo empresarial, mesmo quando trabalho como arquiteto."

Pouco tempo depois de se conhecerem, em 2014, Maloney procurou Basson, então aluno da universidade, em busca de conselhos. Segundo Basson, Maloney falava do diploma para conseguir um emprego, mas o que almejava de fato era um ideal fantasioso da vida universitária.

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"Ele achava que conseguiria mergulhar em mundo onde as pessoas talvez fosse mais curiosas", disse Basson.

Todas as pessoas com quem conversei sobre a apresentação de Maloney como um cara de 21 anos contaram que só ficaram sabendo disso na mídia, depois de sua morte. Pouco se sabe sobre a vida que Maloney levava na universidade, mas as fotos nas redes sociais sugerem que ele estava se curtindo na época.

Contatei mais de doze estudantes que Maloney — geralmente tão avesso às redes — tinha como amigos no Facebook, e nenhum deles topou ser entrevistado. Em uma mensagem de Facebook, um dos estudantes que morava no mesmo prédio que Maloney, e que negou uma entrevista subsequente, comentou que ele "era um cara muito inteligente", e acrescentou: "Ele me mostrou artigos e livros complicadíssioms sobre redes [tabelas de hash distribuídas], e a equação que comprovava que o modelo seria muito mais eficiente."

Segundo o porta-voz da universidade, Keith Marnoch, ninguém prestou queixas contra Maloney durante sua residência no campus. A universidade estava ciente da idade real de Maloney, mas "não discrimina ofertas de moradia com base em idade", disse Marnoch em um e-mail.

O pai de Maloney me contou que ele andava afastado da própria família, inclusive dos filhos. No entanto, por algum motivo, parece que o período na universidade os uniu.

"Em seus últimos meses [antes de morrer], Samuel se aproximou das crianças", disse Peter Maloney. "Eu conversava com ele e dizia, você mal pega seu bebê no colo. E quando me dei conta, poucos dias depois, lá estava ele com o bebê no colo."

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Casa da família Maloney. Créditos: Autor

O vizinho de Maloney, Elias Balch, disse que acordou com um ruído alto e luzes policiais intermitentes na manhã de 23 de dezembro de 2016, o dia em que Maloney foi morto a tiros.

"Havia muitos policiais [na casa]," disse Balch. "Eu vi a SWAT cercar o local. Não sei muito bem o que me acordou. Podem ter sido os chutes à porta, ou os tiros."

Segundo o advogado da companheira de Maloney, a polícia compareceu à casa para apreender seu computador, dado o incidente do cinema local.

A casa dos Maloney é uma pequena propriedade de tijolinhos, intimidada pelos casarões ao redor. O caminho de entrada até a porta da frente é ladeado por sebes frondosas, e quando visitei o local, uma fina camada de neve cobria a calçada, sem pegadas ou quaisquer sinais de presença humana recente.

A porta da frente, branca, ostentava duas grandes fissuras, provavelmente em decorrência da entrada forçada da polícia, e uma placa meio solta que instruía as visitas a usar a porta dos fundos.

Não está claro o que aconteceu de fato naquela casa quando Sam foi morto a tiros, e a polícia não se pronunciou sobre o caso. Contudo, a linha do tempo costurada com retalhos de reportagens, relatos de familiares e informações fornecidas pelo advogado denuncia uma história grave.

"Poderiam dar um choque nele, ou com aquele bando de policiais, poderiam tentar derrubá-lo"

Segundo Millar, Maloney e Facciolo pesquisavam casas na internet e as crianças dormiam; era pouco antes das seis da manhã. De repente, a polícia arrombou a porta.

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Em determinado momento, Maloney supostamente atirou nos policiais com uma balestra, chegando a ferir um deles. Em seguida, com as autoridades ainda no local, ele telefonou para o advogado. Nick Cave instruiu Maloney a erguer as mãos e coperar, e Maloney assentiu. A cena soava caótica, segundo Cake, mas Maloney parecia calmo. E então, segundo Cake, que permaneceu ao telefone, quatro tiros foram disparados.

Segundo o pai, Facciolo alega que Maloney estava desarmado e sem camisa quando foi alvejado. Primeiro no peito, e então caiu no chão, sentado. Foi quando a polícia supostamente atirou de novo, no rosto. De acordo com o advogado de Facciolo, Maloney foi atingido no peito, e então no rosto, enquanto estava de joelhos.

"Poderiam dar um choque nele, ou com aquele bando de policiais, poderiam tentar derrubá-lo", disse Peter Maloney. "Por que atirar se ele já estava no chão? Não faz sentido."

Phil Millar, advogado de Facciolo, defende que a situação poderia ter sido de todo evitada se a abordagem da polícia para apreender o computador de Maloney não fosse tão agressiva.

"Poderiam simplesmente parar a viatura na calçada, interpelá-lo quando ele saísse de casa e dizer: 'Precisamos das chaves, temos um mandato para apreender seu computador'.", disse Millar.

"Não era novidade que ele peitava as autoridades, e queriam apenas apreender seu computador… Precisavam mesmo cutucar a onça com vara curta? Não que ele fosse uma onça."

London, Ontário. Créditos: Autor

Sam Maloney está morto. Suas motivações sempre serão nebulosas, e o futuro do MORPHiS é um mistério ainda maior, se é que há algum futuro.

As circunstâncias acerca de sua morte a tiros, nas mãos da polícia, ao menos tendem a ser expostas.

Dado o envolvimento da SIU, detalhes da batida e dos disparos não serão divulgados tão cedo. Entretanto, visto que o governo canadense está indiciando Facciolo por posse de armas, com base na balestra usada em casa, será preciso, em algum momento, divulgar documentos sobre os eventos que culminaram na morte de Maloney.

Millar busca entender melhor a decisão de apreender o computador de Maloney com um batida crepuscular. "Independente das ações do Sr. Maloney, a decisão de arrombar uma casa com uma criança de seis meses e uma criança de dois anos dessa forma é por demais militarista", disse ele.

Até lá, as pessoas que faziam parte da vida de Maloney, a cidade que vivenciou a primeira morte a tiros de uma geração e a comunidade online que acompanhava seu trabalho com profundo interesse tentam juntar as peças.

Tradução: Stephanie Fernandes