Tomei Café de 'Cocô de Gato' Sintético e Não Foi uma Merda
Da esquerda para a direita: grãos de café puros, grãos torrados e grãos da Afineur fermentados e depois torrados. Kaleigh Rogers/Motherboard

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Tecnologia

Tomei Café de 'Cocô de Gato' Sintético e Não Foi uma Merda

Na verdade, foi bem bom.

Há muita gente por aí disposta a pagar 50 dólares por meio quilo de café fermentado por micróbios que imitam o sabor de grãos evacuados por um animal similar ao gato – a civeta, um mamífero popular em savanas, em florestas tropicais e, também, em algumas regiões mediterrâneas.

Quer dizer, ao menos existem pessoas suficientes para que a startup produtora desse cafezinho arrecadasse 15.000 dólares no Kickstarter em seis horas e, depois, em menos de uma semana, duplicasse o valor.

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Escrevemos sobre a Afineur, de Nova York, no ano passado. A empresa utiliza micróbios cuidadosamente selecionados para fermentar grãos puros de café antes de torrá-los; em seguida, replicam de modo sintético o kopi luwak, o sofisticado café produzido pelas civetas, que comem o café e depois têm os grãos removidos de suas fezes.

Apelidado de "café de cocô de gato", o kopi luwak custa 500 dólares o quilo e, apesar de ser obtido por meios naturais, várias empresas criaram um sistema de abuso de animais que Camille Delebecque, fundador da Afineur, compara à produção de foie gras.

"Muitas pessoas ouviram falar do kopi luwak e elas também têm conhecimento de seu lado ruim, o que faz parte do interesse", Delebecque me contou. "Já eu acho que há interesse em utilizar micróbios para criar um tipo novo de alimento fermentado."

Em vez de forçar a alimentação de animais selvagens, a Afineur utiliza ciência para criar sua especialidade de café a um preço baixo. Delebecque, um microbiólogo, e sua cofundadora Sophia Deterre, uma química, analisaram as moléculas do grão do café para determinar quais criam determinados sabores e trabalhou com o auxílio de uma barista para obter o gosto correto. Eles então escolheram os micróbios que corroem os grãos para fermentá-los. Assim, quebraram algumas moléculas e ressaltaram outras.

O processo leva cerca de dois dias, Delebecque me contou. Após esse tempo, eles o torram e os grãos estão prontos para virar bebida.

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Delebecque veio ao nosso escritório me oferecer um teste de degustação e, como um cientista de verdade, ele insistiu em fazer tudo com precisão. Ele ferveu a água com sua própria chaleira (nossa água quente não era adequada), pesou o pó do café e a água com uma balança elétrica e, por fim, marcou o tempo de preparo a um segundo antes de me servir um copo do tamanho de um de tequila.

O laboratório de preparo portátil de Delebecque. Kaleigh Rogers/Motherboard

Os grãos, o pó e o café pronto não cheiram como café. Para meu nariz nem um pouco refinado, o aroma era mais floral, talvez um pouco azedo, como iogurte. Alguns colegas de trabalho gostaram mais assim do que torrado. Sabores à parte, o café estava bom. Forte porém doce e sem o refluxo amargo típico que sentimos com a xícara de café tradicional. Amo café e, embora esteja longe de ser um connosseur – me contento em beber um copo de lavagem do McDonalds, assumo –, bebo um ou dois copos quase todas as manhãs há uns bons seis anos, posso afirmar que se trata, sim, de uma bebida de qualidade.

"Para esse primeiro café, nos concentramos em reduzir o amargor porque é uma característica comum dos cafés e algo de que muitas pessoas não gostam", Delebecque explicou. "Ele também esconde diversas outras notas, como as frutadas e florais. Se puder diminuir o amargor, é possível enfatizar outras notas."

A iguaria, enfim. Kaleigh Rogers/Motherboard

Acontece que isso não é barato. A opção mais popular na campanha do Kickstarter custa 45 dólares e os apoiadores recebem um pacote de 300 gramas de grãos, a ser entregue em dezembro. Todo mundo prepara seu café de um modo diferente, o que altera a quantidade de xícaras que se pode obter com um pacote; Delebecque calculou que um pacote de 300 gramas pode preparar o equivalente a seis garrafas de vinho de café. Uma garrafa de vinho é composta por 750 gramas, o que equivale a 25 xícaras de 180 gramas de café a cerca de 1,80 dólares cada. Se você é um folgado como eu e compra seu café na rua todos os dias em vez de preparar em casa, 1,80 dólares não são tão ruins, e, comparado com os grãos fermentados por civetas, é muito barato.

Delebecque está confiante de que conseguirá administrar o sucesso do Kickstarter para colocar os grãos Afineur nas prateleiras das cafeterias em Nova York, bem como vendê-los pela internet. Ele planeja desenvolver outros aromas e inspirar as pessoas a pensar de modo diferente em como os microrganismos podem ser utilizados na produção de alimentos.

"Queremos mostrar que os micróbios podem fazer coisas úteis por nós", afirmou Delebecque. "Quando se fala em micróbios, a maioria das pessoas pensa em doenças, mas é possível fazer coisas realmente interessantes com eles."

Tradução; Amanda Guizzo Zampieri