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Você gostaria de saber todas as doenças que seu filho pode ter?

Médicos desenvolvem um controverso teste genético que detecta até 1.800 enfermidades em recém-nascidos.
Crédito: Sally Anscombe/Getty Images.

Você provavelmente sabe um pouco sobre seus riscos de desenvolver problemas de saúde. Talvez por que sua avó teve câncer de mama ou seu pai tenha Parkinson. Esse seu conhecimento é, no máximo, como uma foto em preto e branco borrada: você dispõe de uma ideia vaga a respeito do que poderá desenvolver na vida, mas desconhece todos os detalhes.

E se o conhecimento fosse como uma fotografia em cores, com um foco aprimorado?

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Médicos estão tentando entender se apresentar essas informações é algo útil no longo prazo. Eles estão analisando geneticamente recém-nascidos para cerca de 1.800 doenças genéticas e acompanhando as famílias por vários anos.

Isso faz parte de um estudo randomizado intitulado The BabySeq Project — pronuncia-se "baby seek", e se trata de um sequenciamento genético em seu núcleo — conduzido pelo Brigham and Women's Hospital e pelo Hospital da Criança de Boston, nos EUA. Os Institutos Nacionais de Saúde estão financiando o estudo.

A análise genética dá aos pais uma imagem nítida das condições que os bebês estão em risco de desenvolver ao longo da vida, mesmo que elas não apresentem nenhum sintoma no momento.

Cada criança nascida nos EUA hoje realiza um teste do pezinho obrigatório em âmbito estadual que analisa cerca de 30 condições tratáveis, incluindo a anemia falciforme e a fibrose cística. Contudo, com essa nova análise, os pais terão um portifólio maior da saúde de seus filhos. O que pode ser bastante poderoso, mas ao mesmo tempo, pode se mostrar uma sobrecarga de informações, dado que a maioria das condições analisadas pelo teste são incuráveis.

"Nós ainda não temos tratamento para 1.800 coisas — mas já temos para muitas outras coisas", afirma Alan Beggs, um dos investigadores principais do estudo e professor de Pediatria na Faculdade de Medicina de Harvard. "Estamos tentando compreender como isso pode ser um problema em potencial. Por um lado, mais pessoas serão auxiliadas, e mais vidas serão salvas com essas informações, ou será que as pessoas vão perder o sono, preocupadas com coisas que poderão, ou não, acontecer um dia?"

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Antes do lançamento do teste, os pesquisadores perguntaram aos pais de recém-nascidos nos dois hospitais se eles estavam interessados em realizar a análise genética de seus filhos se isso fosse oferecido como parte de um estudo. Oitenta e três por cento das famílias responderam que sim, de certa forma: 36% estavam um pouco interessadas, 28% estavam muito interessados e 18% estavam extremamente interessadas. "Algumas pessoas gostam muito de buscar informações", afirmou Beggs.

Essa descrição se aplica a Lauren e Kyle Stetson, que participaram do estudo e foram aleatoriamente colocados no grupo teste (metade dos participantes da pesquisa é colocada no grupo controle, e seus recém-nascidos não foram testados). Os resultados mostraram que sua filha, Cora, tem uma variante genética que aumenta o risco de desenvolvimento de uma deficiência de biotinidase parcial, uma doença que, em casos extremos, pode causar perda de visão e audição, erupções cutâneas e até perda de QI. Agora, a menina toma uma vitamina com iogurte todos os dias a fim de reduzir seus riscos. "Sempre achei que mais informações significam mais poder", Lauren Stetson contou à CBS News, "E para os que estão hesitantes, eu digo que mesmo que os resultados sejam assustadores, a ignorância sobre eles pode ser mais assustadora ainda."

"Isso, é claro, está alinhado com o caminho que esperamos da medicina, de que em vez de tratar as pessoas doentes, possamos antecipar as doenças e preveni-las", afirma o coautor Robert Green, geneticista do Brigham and Women's Hospital.

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Tanto ele quanto Beggs estão muito cientes da controvérsia em torno desse tipo de teste. Ter conhecimento em demasiado de riscos que, no fim, podem não se confirmar poderá levar a estresse e tratamentos preventivos desnecessários. Além disso, as pessoas estão mais preocupadas com a privacidade e a discriminação, Beggs afirma. Os pais estão consentindo com esses testes, não as crianças — assim, quando esses bebês tiverem 18 anos, pode ser que eles não queiram revelar essas informações, especialmente no caso de vazamentos de dados. Os dados genéticos coletados no estudo são armazenados em um laboratório acadêmico, e os pais também deram consentimento para colocá-lo em um banco de dados federal para pesquisas futuras.

Os dois hospitais envolvidos no estudo são hospitais de pesquisa, então os assistentes com frequência perguntam aos pacientes se eles estão interessados em fazer parte de um estudo sem qualquer contexto. Como hospitais são ambientes estressantes, e os pacientes costumam ter outras coisas em mente quando estão lá, a maioria diz não antes de ouvir os detalhes. Assim que os pais respondem sim, e recebem mais informações sobre o estudo BabySeq, somente 25% veem problema na participação. No total, espera-se analisar 240 recém-nascidos saudáveis do Brigham and Women's Hospital e 240 recém-nascidos da unidade de cuidado intensivo neonatal.

A lei de Não Discriminação de Informações Genéticas (GINA, na sigla em inglês), de 2007, protege as pessoas de certa forma — por exemplo, a lei afirma que operadoras de planos de saúde não podem negar cobertura com base na genética de uma pessoa. Mas não há nenhuma informação sobre seguros de vida. "É possível que daqui a 30 anos, quando os participantes dessa pesquisa forem comprar um seguro de vida, possa haver consequências negativas se essas informações forem reveladas, e se a sociedade não dispor de nenhuma proteção", diz Beggs.

Parece exagerado pensar em um recém-nascido atrás de uma apólice de seguro de vida. Mas faz sentido que seus pais tenham essa abordagem no longo prazo, especialmente no clima político atual. "Com a instabilidade que vemos em relação à abordagem à saúde no Congresso, é muito incerto o que vai acontecer com a rede de proteção dessas pessoas no momento em que as crianças forem adultos", afirma Green.

E essa é só uma parte de uma mudança muito maior na comunidade médica. Estamos aos poucos nos distanciando do tratamento de doenças e indo no caminho de sua prevenção. "Será um caminho árduo, porque nosso sistema é mais um sistema de doença do que de saúde", pontua Green. "O desafio é: como nós faremos essa mudança, para prever e prevenir uma doença? Essa é a direção que muitas pessoas acham que devemos ter."