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Revista de 2013 - A melhor fruta da época

Achava piada ao Nilton, mas depois fiz 12 anos

Tudo tem um prazo de validade.

No dia em que os extraterrestres visitarem a Terra, existe a remota hipótese de aterrarem em Portugal num qualquer descampado do Alentejo. A acreditar naquilo que li em tanta ficção, e caso tenham boas intenções, é bem provável que peçam um representante terráqueo com quem dialogar. Julgando pelo número de ouvintes e seguidores, existe uma probabilidade não-assim-tão-remota de que o orgulhoso português a estabelecer este contacto se lembre de recomendar o seu humorista favorito. E é disso que tenho algum medo, porque se o primeiro contacto intergaláctico for um “és o Fernando?”, esse será o dia em que estamos bem fodidos e eles rebentam com isto tudo.

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Deixa-me em paz, por favor. Falo-vos, claro, do Nilton. Para os sortudos que só vão à net ver pornografia e gatos no YouTube, é um auto-intitulado "contribuinte que faz stand-up comedy, mas que também escreve livros, edita DVDs, faz rádio e televisão quando assim tem de ser". Ao longo dos anos, e sem grande coisa que o justificasse, tornou-se numa personalidade quase indiscutível no que ao humor nacional diz respeito. Fruto daquele boom de humoristas que veio a surgir com o Levanta-te e Ri (alguns bons, muitos verdadeiramente péssimos), a verdade é que, pouco a pouco, foi conquistando o seu espaço, e mal damos por isso é 2013 e lá está ele, a apresentar o Cinco Para a Meia-Noite, a fazer as manhãs da RFM, a ser um dos portugueses mais seguidos no Facebook/Twitter e a fazer stand-up para milhares. Sim, a sério. O Nilton. Esse inventor de peças humorísticas tão memoráveis engraçadas terríveis como o “eu amo você”. O humor será sempre algo bastante sui generis. Iremos para sempre rir à custa de gordos a dar trambolhões, ou de piadas com o português, o francês e o inglês (desde que incluam algo de porco, claro). Aqui, há que ser justo:  poderia escolher um alvo com material muito pior do que o do Nilton. Estamos, afinal de contas, a falar de um país que elevou o Malucos do Riso a um estatuto de lenda televisiva e onde, por exemplo, o Mundo Catita e Último a Sair se mantêm como peças incompreendidas, levantando o sobrolho a muita gente. Posso ter como opinião que se as piadas boas fossem golos marcados, o Nilton seria o Hélder Postiga do humor nacional. Mas ok, quem sou eu para pôr em causa aquilo que faz rir este Portugal. Uma foca bebé morre por cada post no Twitter. No entanto, o motivo pelo qual escrevo tudo isto é simples: de todos os humoristas ou comediantes lusitanos, nenhum consegue ser mais irritante do que o Nilton. Não vou entrar em detalhe sobre estranhas coincidências de rábulas (sem metade da graça das originais, que já existem há anos), ou acerca de piadas absolutamente questionáveis que são justificadas por não precisar de ter piada em tudo o que se escreve. Não vou falar, mas posso colocar links, que foi o que acabei de fazer. Lembremo-nos: estamos a falar de alguém cuja fatia significativa do humor gira à volta de gozar com terceiros, incógnito. Sendo esta uma forma de fazer rir tão válida quanto outra, tudo se torna diferente (e muito mais engraçado) quando o mesmo tipo que mete uns dentes tortos para fazer pouco dos transeuntes leva a mal quando é criada a melhor página de 2012, insurge-se contra esta na sua própria página e ainda regressa para chamar a todos uns tristes sem vida a quem vai pagar a reforma com suas as piadas sem graça. Bem sei que para a sua incansável legião de seguidores este texto não será mais do que uma manifestação de “dor de corno, pá" ou de "tu tens é azia pelo sucesso, e por ter demonstrado que é um excelente profissional". Ah, o seu fanbase. Essa horda enraivecida, equipada com as t-shirts do Cão Azul, que perante a opinião contraditória trata de pegar na sua espada de cavaleiros da internet. É um pouco semelhante àqueles videojogos tipo Streets of Rage: durante o nível enfrentamos os rufias menores, que não representam grande desafio, mas surgem num número suficientemente grande para não os conseguirmos evitar. Quando, por fim, os derrotas é a vez do boss final sujar as mãos e tomar conta do assunto — neste caso, Nilton O Próprio e as suas bojardas categóricas de como és um falhado que nunca irá alcançar nada durante a existência. Inserir tom de voz malévolo. Não passarei de um hater cheio de inveja e é por causa de tipos como eu que Portugal não anda para a frente. Afinal, e segundo palavras do próprio: “Há dois tipos de artista: os conhecidos e os que enchem salas. Eu encho salas e isso é o mais difícil.” Que moral tenho eu? Permitam-me, ainda assim, que apresente a minha legitimidade para falar sobre o assunto: há cerca de seis/sete anos, recebi pelo Natal um livro de sua autoria — e acho que até foi um pedido meu. Enquanto o folheava, com aquele tom de desilusão familiar bem característico, um tio meu disse algo como “mas tu gostas disso?” Não o censuro. Se pudesse voltar atrás e falar com o meu Eu de 17 anos, dar-lhe-ia um tabefe e punha-o a pão e água até ganhar juízo.