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O documentário político que foi banido pelo governo indiano

Vê "An Insignificant Man" na íntegra e lê a nossa entrevista aos realizadores.

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“Na Índia, não cresces a querer ser realizador de documentários - cresces a querer ser um realizador", explica Vinay Shukla em conversa telefónica com a VICE. No entanto, contra todas as probabilidades, An Insignificant Man, um documentário de Shukla e Khushboo Ranka, que explora o habitualmente silenciado tema da política indiana, está agora a ser lançado pela VICE globalmente através de todos os nossos canais digitais e, mais tarde, no canal de televisão VICELAND.

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A política é tendencialmente um jogo bastante sujo, especialmente na Índia. "Nem eu, nem Khushboo viemos de um passado político", garante Shukla. E acrescenta: "Antes disto, não fazíamos ideia de como a política funcionava. Somos ambos originários daquele tipo de família indiana decente, que te diz 'não te aproximes da política - não é coisa boa, nem é para pessoas boas'". Contudo, quando começaram a reunir ideias para o filme, as eleições eram a coisa mais interessante a acontecer. O acto eleitoral acabaria mesmo por inaugurar uma nova era no país, ao afastar o BJP e Narendra Modi, de um domínio de 15 anos sobre o Congresso. E foi também o momento em que nasceu um novo partido: o AAP.

"Quando o AAP estava a começar, era basicamente uma startup - estavam a tentar perceber as coisas, havia uma energia incrível à sua volta", explica Shukla, quando falamos sobre a forma como os realizadores conseguiram ter acesso a uma área da política que habitualmente tenta estar afastada dos olhares públicos. O cineasta salienta: "Estavam a fazer campanha pela transparência e por uma forma de governação mais interactiva".

Por sorte, Shukla e Ranka conseguiram acesso ao AAP mesmo no momento em que o partido se estava a formar, o que lhes permitiu acompanhar o seu fundador e actual Ministro-Chefe de Déli, Arvind Kejriwal, desde as conversas sobre política até emergir como uma força que luta pela democracia na Índia. A perspectiva única de Shukla e Ranka’s unique perspective e a sensação de "vamos-aprendendo-pelo-caminho" acabou por criar não apenas o primeiro documentário do país sobre este assunto, como também um olhar honesto, sem inibições, sobre o que se passa por detrás da neblina.

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Vê também: "Os realizadores de "An Insignificant Man" revelam como foi documentar a vida política indiana"


Encontrámo-nos com os realizadores para conversar sobre a forma como se consegue acesso, sobre a perspectiva da Índia em relação ao cinema documental e ainda sobre a sua luta impossível contra a censura governamental para conseguirem lançar o filme.

VICE: Como é que vocês começaram a trabalhar juntos?

Khushboo Ranka: Eu e o Vinay somos amigos e tínhamos trabalhado juntos em Ship of Theseus. Foi uma inspiração ver esse filme ganhar forma e depois podermos viajar com ele a sítios como o Irão e o Egipto. Conhecemos um monte de realizadores e artistas - foi uma alturea muito inspiradora para nós. Quando regressámos, sabíamos que queríamos fazer outro filme. Só queríamos agarrar nas câmeras e começar a filmar.

Um filme destes é algo de que nunca se tinha ouvido falar na Índia. Como é que foi a receptividade por parte das pessoas?

A política na Índia é extremamente opaca. O acesso é quase impossível e mesmo esta forma mais de observação não é algo que as pessoas tenham experimentado por aí além. Quando começámos a filmar, muita gente ficava espantada com o grau de acesso que tínhamos. "Ninca vimos nada assim", diziam-nos. A novidade do filme tem várias faces - desde o conteúdo, à forma, ao facto de as pessoas poderem ver os políticos que vêem todos os dias, no contexto de uma história maior. E as pessoas responderam muito bem a isso.

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Como é que conseguiram esse acesso?

Vinay Shukla: Quando o AAP estava a começar, os seus membros eram elementos novos na cena política, que faziam reivindicações bastante ousadas e garantiam que iam erradicar a corrupção. Em última análise acho que eles simplesmente pensaram que alguém deveria filmar essa história. Para ser honesto, não havia muita gente a levá-los a sério - particularmente nos media. Era do género "activistas a transformarem-se em políticos… quando é que isso alguma vez correu bem?".

Quando começámos a filmar, ficámos espantados com tudo a que estávamos a assistir - com a forma como a política se joga no terreno. Quando sais para o terreno e vês a extraordinária confusão em que as coisas funcional a nível político, é estranho dares por ti ali no meio. Queríamos tentar levar essa experiência ao nosso público. E foi por isso que tentámos manter o formato de observação - em que não há ninguém a dizer-te como deves pensar, mas sentes que estás ali naquela sala.

No início o filme foi banido e quando a proibição foi levantada acabou por ter uma distribuição limitada nas salas de cinema. Podem contar-nos de que forma é que os documentários são tratados e lançados na Índia?

Ranka: Efectivamente, o filme foi banido numa primeira fase, porque nos pediram para fazer algumas coisas que para nós eram impossíveis. Foi-nos solicitado que obtivéssemos permissão do primeiro-ministro, que basicamente era o mesmo que teres de pedir a Donald Trump autorização para mostrares o filme nos Estados Unidos. Portanto, lutámos contra isso a nível judicial. Depois, fixemos um lançamento limitado. Na primeira semana, lançámos em cerca de 25 salas e na segunda semana alargámos para 64. Os resultados na primeira semana foram muito além do que esperávamos.

Shukla: Homestamente, tem sido muito complicado convencer as pessoas que há público para um filme como este. Quando revelámos que queríamos fazer um filme sobre o processo político na Índia, disseram-nos que o "establishment" viria atrás de nós, por estarmos a tentar marcar uma posição política - em particular por se tratar de um partido novo. Portanto, talvez tenhamos sido um bocadinho ingénuos ao levarmos as coisas avante e quando nos deparámos com o problema da censura, lembrámo-nos várias vezes das pessoas que nos avisaram para termos cuidado.

É preciso lembrar que, quando começámos a filmar, tínhamos ambos 26 anos. Dois putos que, simplesmente, sabiam usar uma câmera DSLR. Não tínhamos experiência e nenhuma ideia de como se fazia um documentário. Foi, de muitas maneiras, um filme impossível, no entanto, a palavra começou a espalhar-se as pessoas começaram a perceber que era um filme sobre os bastidores da política indiana, que era algo que nunca tinha sido feito antes. E, basicamente, o público, achou que o filme é muito interessante. Enquanto realizadores de documentários aceitamos isso como um grande elogio. Em última análise as pessoas saem da sala com a sensação de que passaram um bom bocado.


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