Físicos colidiram quasipartículas pela primeira vez
Um sistema de laser de femtossegundos da Universidade Estadual de Ohio. Crédito: OSU

FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

Físicos colidiram quasipartículas pela primeira vez

Colidir quasipartículas pode não ser fácil, mas essa possibilidade promete a compreensão de todo um quasimundo.

Existem partículas na natureza que não são bem partículas; é meio estranho mesmo: embora não sejam como suas colegas, elas são reais e se comportam e se relacionam com as partículas fundamentais que todos conhecemos e amamos. São as chamadas quasipartículas. Elas podem ser compreendidas como tipos diferentes de comportamento coletivo, desempenhados por partículas de múltiplas partículas que acabam se parecendo com versões novas de partículas que não existem de verdade no universo. Bastante esquisito, né?

Publicidade

Um exemplo: imagine um único elétron preso a um núcleo atômico de um metal. De repente, surge algo que muda o elétron de posição e, como resultado, acontece uma mudança coletiva do núcleo e dos outros elétrons que orbitam o átomo. Essa mudança tem a propriedade de se parecer com um único elétron maiorzão em vez de uma coleção de partículas que reagem ao movimento de um elétron de massa normal.

Algo que os físicos gostariam muito de fazer é colidir as quasipartículas em um colisor, assim como os fótons e os prótons esmagados no LHC (sigla em inglês para o Grande Colisor de Hádrons). Esse procedimento poderia nos ajudar a compreender as quasipartículas, por assim dizer, o que seria muito importante, levando em consideração seu papel na supercondutividade em altas temperaturas e também nossa compreensão da mecânica quântica.

Conforme descrito quarta-feira em um artigo, seguido de um comentário na revista Nature, físicos das universidades alemãs Regensburg e Marburg e da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, dos EUA, tiveram sucesso na colisão de pares de quasipartículas em um material isolante chamado disseleneto de tungstênio. Com o auxílio de pulsos de laser na escala de femtossegundos, eles foram capazes de executar o experimento até que as distâncias iniciais entre as quasipartículas e suas velocidades iniciais estivessem bem-definidas, pré-requisito para poder colidi-las.

Publicidade

Acontece que colidir quasipartículas não é tarefa fácil. Elas não tendem a permanecer juntas por muito tempo, e o subproduto da colisão que os físicos gostariam de observar aparece em escalas de attossegundos (a trilionésima parte de um segundo).

Quão profundamente as quasipartículas imitam seus irmãos legítimos?

"Assim como num acelerador de partículas convencional, é importante evitar colisões acidentais das quasipartículas em algum lugar entre elas", me contou Rupert Huber, coautor do estudo e diretor do grupo de Eletrônica e Protônica Quântica Ultrarrápida da Universidade de Regenburg.

"Como as quasipartículas estão incorporadas em um meio muito denso de bilhões e bilhões de partículas que interagem, tais colisões acidentais ocorrem em escalas de tempo de femtossegundos", explicou. "Logo, a velocidade é crucial. Ao utilizarmos a onda de luz portadora e oscilante como maior campo de aceleração possível de ser controlado, somos capazes de completar todo o ciclo de vida da preparação, aceleração e recolisão de quasipartículas]mais rapidamente do que o espalhamento não intencional das quasipartículas no ambiente denso, o que nos possibilita interpretar o resultado do experimento no âmbito microscópico."

O comentário que acompanha o estudo, assinado pelo físico quântico Dirk van der Marel, da Universidade de Genebra, na Suíça, esclarece as coisas. Em primeiro lugar, pares de quasipartículas de cargas opostas são criados dentro do material de disseleneto de tungstênio por meio de um pulso de laser de femtossegundo. Essas partículas são, então, lançadas em um rastro linear criado por um segundo pulso de luz, que estabiliza um campo elétrico. As diversas propriedades desse segundo pulso de luz são ajustadas a fim de direcionar as quasipartículas em uma colisão frontal. Perceba, novamente, que tudo isso acontece em um intervalo de tempo menor do que um único comprimento de onda de luz.

Publicidade

"A colisão causou a aniquilação mútua das quasipartículas e a emissão de um fóton, o qual foi detectado pelos autores", explica van der Marel. "O experimento é, assim, similar aos estudos de aniquilação elétron-positron em aceleradores de partículas de altas energias (os positrons são as antipartículas dos elétrons, o que significa que eles têm cargas opostas e massa igual ao do elétron)". É de interesse particular dos pesquisadores o efeito da interação Coulomb – isto é, a força de atração ou repulsão entre partículas eletricamente carregadas – em suas quasipartículas. Quão profundamente as quasipartículas imitam seus irmãos legítimos?

"A beleza das ferramentas experimentais de Langer e seus colegas reside no fato de que elas finalmente permitiram que as quasipartículas e suas interações mútuas fossem estudadas nos materiais em que eles se manifestam", diz van der Marel. "As quasipartículas positivas e negativas do experimento dos autores são similares aos elétrons e prótons no vácuo, porém, uma variedade rica de quasipartículas incomuns também poderá ser estudada, das quais ainda não conhecemos nenhuma partícula elementar equivalente."

"As quasipartículas não apresentam somente interesse acadêmico", continua. "Elas também determinam muitas propriedades e funcionalidades dos materiais, tais como a resistência elétrica, a capacidade térmica e o magnetismo. Há muitos motivos para estudar as quasipartículas nos materiais nos quais elas se manifestam."

Colidir as quasipartículas pode não ser fácil, mas essa possibilidade promete a compreensão de todo um quasimundo.

Tradução: Amanda Guizzo Zampieri