FYI.

This story is over 5 years old.

Noticias

Não há espaço para se jogar futebol nos hospitais

O povo brasileiro falou em Lisboa.

Caso tenhas vivido debaixo de uma pedra, que porventura ainda não tenha sido atirada à policia, o Brasil tem sido palco de uma onda de protestos contra as políticas da boa imagem e da estereotipagem: a terra do futebol, do samba e da religião. Aquilo que se tem visto nos últimos anos é um esforço por parte do governo de embelezar o país e varrer o pó para debaixo do tapete, à semelhança daquilo que eu fazia em casa quando era puto. Tal foi a tareia que levei quando fui apanhado a fazer isso que nunca mais tive coragem de usar um cinto e é mesmo isso que o povo brasileiro reivindica — que o governo não tenha mais coragem para roubar. Entre gritos de justiça, o que se pede é o fim da palhaçada feita com o orçamento público. Em Portugal, a comunidade brasileira atinge os 109 mil habitantes, formando a maior colónia de estrangeiros no país. Não será de estranhar, por isso, que tenham sido convocadas manifestações em Lisboa e no Porto em apoio ao que se tem passado no Brasil nas últimas semanas. Aproveitei a situação para ir à rua e saber o que é que a geração Coca-Cola em terras de Camões pensa. Aroldo, 44 anos, professor universitário VICE: O que é que achas desta manifestação?
Aroldo: Soube pela internet e decidi vir. Fiquei maravilhado! Lembrou-me de quando metemos fora o presidente Collor. Temos de o fazer novamente. Com a Dilma?
Sim, ela anda a roubar muito! Mas foste afectado por isso?
Sim, tentei ser professor no Brasil. Dei aulas numa universidade. Depois fui professor nos subúrbios e lá fui ameaçado por alunos que eram traficantes. Ninguém quer educar o povo. A começar pelo Lula, que é um sapo barbudo sem dedos. Explica lá isso.
Eu ensinava inglês, na universidade federal de Brasília. Lá, não existiam livros, os alunos que vinham do sistema público não sabiam falar correctamente, por culpa do sapo sem dedos. Eles queriam números e não qualidade, estávamos a dar diplomas a semi-analfabetos que terminavam o curso e que não adquiriam conhecimentos. Luís, 23 Vives cá em Portugal há quantos anos?
Luís: Há nove. E que tal esta manifestação?
Acho que os brasileiros de todo o mundo deviam fazer parte desta manifestação. Mesmo quem não está no Brasil deve lutar por quem lá está. Foste afectado pela situação do Brasil?
Eu não, mas tenho um primo que levou dois tiros e que ficou sete ou oito horas à espera no hospital público. Morreu à espera de ser atendido. Catarina, 19, estudante Catarina, tu não és brasileira.
Pois não, sou portuguesa. Mas acho que todos devemos fazer o mesmo. Porquê?
Acho que o povo português tem o costume de estar calado. Às custas desse tipo de atitude, o nosso país chegou onde chegou. Realmente, acho que tens razão. Rodrigo, 26, estudante O que é que te motivou a vir cá?
Rodrigo: Acho que é importante, porque não importa se estamos em Portugal ou na Holanda, ou em qualquer outro sítio, [o Brasil] é o nosso país. Já vives em Portugal há muito tempo?
Três anos. Adoro Portugal, adoro Lisboa e quero morar aqui para sempre. Mas nasci no Brasil e quero manifestar-me pelo Brasil, porque o mundo tem de ser para todos. Vieste para cá em função disso?
Sim, mas não de forma negativa. Se não fosse o governo Lula, não teria frequentado a universidade e não teria agora a possibilidade de ter um bom emprego aqui. Então, a situação está boa?
Estava boa, mas o povo cansou-se de ser chamado de palhaço, de ver todo a gente a investir no Mundial. Até porque a educação e a saúde estão na merda. Fotografia por João Domingos