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LEIA: "Uma cronologia do caso de violência sexual envolvendo Marco Feliciano"
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Como falei, prefiro não me aprofundar em teorias da conspiração sobre qual a versão que prevalece nessa história. Me cabe só observar o mesmo processo de estigmatização que recai sobre Patrícia. O mesmo processo aconteceu não muito tempo atrás no caso tenebroso do estupro coletivo no Rio de Janeiro. Com algumas diferenças de intensidade, claro, já que a vítima do estupro coletivo era pobre, desassistida pela sociedade e menor de idade.Patrícia, ao contrário, é uma velha conhecida de todas nós, sobretudo por suas ferrenhas opiniões contra o feminismo. Inclusive no campo da luta contra o aborto, no qual ela já comentou que as feministas queriam legalizar a prática para fazer "sexo ilícito". Durante toda a sua construção de militante jovem do PSC, antifeminista e da direita conservadora, a jovem sempre criticou a esquerda e teceu comentários dolorosamente preconceituosos sobre a comunidade LGBT e outras minorias.Nós duas, eu e Patrícia, somos pessoas diferentes em quase todos aspectos e com opiniões muito divergentes sobre o que é a liberdade da mulher e o feminismo. Talvez deva considera-la como inimiga ideológica e já a critiquei em uma audiência aberta sobre o direito de abortar. Mas agora ela se pronunciou sobre um tipo de violência que é muito comum entre nós mulheres. Na minha cabeça, um conflito interno muito grande se instaurou em Patrícia quando ela denunciou a violência sexual — e talvez não fosse a única. Ela denunciou e fez um ato que muitas vezes é relacionado com a militância feminista. Patrícia, mesmo relutando com todas as forças, tomou uma atitude feminista para evitar que se machucasse e que também outras mulheres se machucassem.
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Ironicamente, como a própria Patrícia fez questão de destacar, as únicas pessoas que apoiaram sua denúncia foram as feministas. Foi um apoio tão imediato em comparação ao ataque das pessoas que supostamente estariam ao lado de Lélis, que ela declarou publicamente que foram grupos feministas e LGBT que deram apoio incondicional ao seu caso. A denúncia avança as trincheiras políticas e demonstra como a figura do agressor se sente impune em praticar atos contra a liberdade sexual da mulher. Foi um caso tão grande que quase conseguiu abafar outra história igualmente capciosa de violência contra a mulher, que é a suposta agressão praticada pelo senador Telmário Mota (PDT-RR) contra uma estudante no fim de 2015, a qual retirou posteriormente as denúncias e desmentiu o caso. Rodrigo Janot, procurador-geral da República pediu para que o STF abra um inquérito para apurar o caso.A política é um dos vários ambientes que podem se tornar insalubres para uma mulher. Começando pelo fato de que não há participação feminina efetiva na política brasileira (9% na Câmara e 13% no Senado) e ainda há espaço para políticos exaltarem torturadores de mulheres e crianças no plenário. Uma mulher que aparece peitando essa estrutura será questionada, inclusive quando ela possuiu um histórico tão caricato como o de Patrícia. Ela será posta à prova a todo momento pelos próprios jornalistas que conseguiram o furo — que a descreveram como "poderia ser mais uma mulher querendo atenção na internet".A frieza de Patrícia nas entrevistas e seus discursos calculadíssimos causam estranheza em quem assiste. Como ela consegue permanecer tão forte mesmo ter sido violentada por um político influente e ter sido ameaçada com uma arma? Por que ela, supostamente, aceitou o suborno de Bauer para se calar sobre o abuso? Talvez realmente devêssemos duvidar da palavra de Patrícia, assim como deveríamos acreditar que o vídeo de Feliciano, ao lado de sua mulher, seja balela. Sim, a presunção de inocência, afinal de contas, é um direito previsto constitucionalmente. Mas quantas vezes nós já duvidamos da palavra de uma mulher sem hesitar, mesmo quando ela estava falando a verdade?Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter e Instagram.