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Ciclos

Trabalhe de casa, o trânsito agradece

O home office melhora o trânsito, a qualidade do ar e ajuda na produção do trabalhador.

Ilustração: Issao Nakabachi

'Esta matéria faz parte do projeto Ciclos, uma série sobre mobilidade urbana feita pela VICE em parceria com o Itaú.'

A rotina de André Gomez não era muito diferente da maioria dos paulistanos. Ele morava em Santo André e trabalhava numa agência de endomarketing em São Bernardo, a 5 km de distância. A cada dia, perdia entre 40 minutos e uma hora e meia no trânsito para ir e voltar de carro — um pouco abaixo da média de São Paulo de 1h44 diários, segundo levantamento do Ibope. Mas, em 2011, uma luz se abriu sobre sua firma e a vida dele melhorou bastante. Naquele ano, a agência entregou a chave do escritório, parou de pagar aluguel e mandou todo mundo para casa. Não, André não entrou para a estatística do desemprego: ele entrou para a estatística dos brasileiros que fazem home office.

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Home office, ou teletrabalho em português de Portugal, é o nome que se dá para quem trampa sem sair de casa. Além de reduzir o estresse e melhorar a produtividade dos profissionais envolvidos, o modelo tem um vantagem que beneficia mesmo os pobres mortais que ainda não puderam entrar na onda: tira uma frota considerável de carros da rua e reduz o desperdício de tempo da cidade como um todo. E nesse caso, tempo é dinheiro, mas muito dinheiro. De acordo com um estudo da FGV, o trânsito excessivo de São Paulo custou R$ 40 bilhões só em 2012.

Grande parte disso, R$ 30 bilhões, foi perdido em horas produtivas, ou seja, tempo morto sentado ao volante. Enquanto se buscam saídas, a melhora de infraestrutura sempre é uma questão. No entanto, mesmo num ambiente perfeito o trânsito sempre vai comer uma parte do dia. A Constante de Marchetti é uma teoria segundo a qual não importa o quanto a cidade se altera e se adeque a novas realidades, o tempo gasto em deslocamento para o trabalho tende a se manter ao redor de uma hora diária — quando muda, é para cima. Para escapar totalmente disso, só eliminando a viagem de uma vez.

"Home office é certamente uma das melhores políticas de gestão de demanda de viagem, pois diminui a necessidade de viajar", diz Marcos Paulo Schlickmann, engenheiro civil e doutorando em sistemas de transporte no programa MIT Portugal. Marcos ressalta, no entanto, que ainda é cedo para notar um impacto significativo da prática na mobilidade urbana. Mas é possível chegar lá.

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Uma estimativa da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades indica que 12 milhões de pessoas trabalham em home office no Brasil. Este número é abrangente, inclui desde profissionais liberais que não respondem a ninguém, até executivos engravatados de multinacionais. Consultoria de RH especializada na prática e em direito trabalhista, Mônica Carvalho conta que o tempo economizado é uma das grandes vantagens do home office — inclusive para os empregadores.

"Você tem um profissional mais descansado, com tempo para se dedicar a família, exercícios, comer melhor. O reflexo disso tudo é uma melhora no desempenho. Inclusive, profissionais que trabalham em home office chegam a soluções mais criativas para resolução de problemas", diz Mônica. As empresas, por sua vez, economizam com aluguel de espaço e infraestrutura. "No entanto, ainda há uma tendência a implementar o home office de maneira informal, sem aditivos de contrato, por exemplo, o que pode causar problemas", explica a especialista.

"Esse modelo também não pode ser imposto aos funcionários, precisa ser oferecido para adesão", diz ela. Por incrível que pareça, há quem resista por conta do medo de, ao se afastar do dia a dia da firma, ser esquecido pelo chefe na hora da promoção. A crença se relaciona à valorização do esforço em detrimento ao desempenho. Mas, para garantir que se mantenha uma relação entre a equipe, o ideal é separar um dia por semana para trabalhar alocado. "Com exceção de pequenas empresas de tecnologia, por exemplo, onde sequer faz sentido ter um escritório", afirma Mônica.

Além de contribuir para o bem-estar de quem pratica o trabalhar em casa contribui para redução do trânsito, e o home office ainda possibilita a melhora na qualidade do ar da cidade, por exemplo. Segundo a Pesquisa de Mobilidade Urbana de 2012 do Metrô de São Paulo, 12 milhões de viagens diárias de carro são feitas na região metropolitana. De acordo com o Plano de Controle de Poluição Veicular 2014-2016 da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo, para reduzir a emissão poluição a um patamar melhor, seria necessário diminuir o número de viagens em 3.3 milhões.

Quando se fala em home office, no entanto, uma coisa precisa ser ressaltada: não fique largado. O escritor Tom Wolfe uma vez falou sobre seu processo de trabalho algo na linha de "todo dia, antes de começar a trabalhar, eu tomo um banho e visto um terno. Só depois sento à mesa". André não chega a tanto, mas segue a regra. "Eu sempre tomo um banho antes de começar e me arrumo como se estivesse indo para o escritório", conta. É amigo, você pode até ficar em casa, mas de cueca é que não vai ser.

Acesse o site www.projetociclos.com.br  e assista ao documentário sobre mobilidade urbana que fizemos em parceira com o Itaú.