Os EUA usaram detentos para treinar algoritmos de reconhecimento de tatuagem
As 15 mil tattoos usadas na experiência inicial vieram de prisioneiros que não consentiram com o experimento. Crédito: Pixabay/brenkee

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Tecnologia

Os EUA usaram detentos para treinar algoritmos de reconhecimento de tatuagem

As 15 mil tattoos usadas na experiência inicial vieram de prisioneiros que não consentiram com o experimento.
Janus Rose
New York, US

Pesquisadores do governo dos EUA estão trabalhando em conjunto com o FBI para criar um sistema automatizado de identificação de tatuagens que usa prisioneiros de instituições federais e estaduais como "fonte inesgotável de informações gratuitas", afirmam documentos disponibilizados pela Fundação Fronteira Eletrônica (EFF, na sigla original).

Não é nenhum segredo que a polícia já utiliza tatuagens como forma de identificar suspeitos. Mas, recentemente, o FBI se uniu a um grupo de cientistas do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (NIST, na sigla original) para criar um sistema capaz de identificar, agrupar e chegar a conclusões sobre pessoas com base em suas tatuagens — algo que a Fundação Fronteira Eletrônica afirma violar a Primeira Emenda à constituição americana, que garante a liberdade de expressão da população do país.

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Um slide retirado de uma apresentação do NIST, intitulado "Por Que Tatuagens?", deixa claro como a polícia poderia usar o sistema, que foi desenvolvido em conjunto com empresas terceirizadas, universidades e instituições de pesquisa privadas, para traçar um perfil da população. O slide afirma que tatuagens "sugerem ligações com gangues, subculturas, crenças religiosas e/ou ritualísticas, ou ideologia política" e que, portanto, "possuem inteligência; mensagens, significados e motivações".

Além disso, os pesquisadores omitiram o fato de que as 15.000 tatuagens usadas na experiência inicial, a "Tatt-C", vieram de prisioneiros que não consentiram ao experimento — o que é, aparentemente, uma violação das regras federais de ética em pesquisas.

O uso de detentos em pesquisas científicas deve seguir uma série de regras criadas para protegê-los. Mais especificamente, essas normas definem que qualquer pesquisa deve ser supervisionada por um conselho independente, que, por sua vez, deve incluir ao menos um detento.

Mas, de acordo com os documentos obtidos pela Fundação Fronteira Eletrônica, os pesquisadores não divulgaram o uso de prisioneiros na experiência, afirmando apenas que os dados foram "coletados operacionalmente". A diretoria do NIST teria aprovado a experiência retroativamente, sob a impressão de que não havia sido baseada em dados reais.

Esses dados foram entregues à 19 empresas e organizações, incluindo a MorphoTrak, uma empresa de tecnologia biométrica que tem colaborado com várias agências governamentais dos EUA.

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"Os pesquisadores do NIST estão utilizando imagens obtidas em prisões e penintenciárias sem nenhuma preocupação para com as as normas éticas recomendadas. Muito pelo contrário: eles estão tratando esses detentos como uma fonte infinita de informações", escreveram Dave Maas e Aaron Mackey, pesquisadores da Fundação Fronteira Eletrônica.

"Agora, com o NIST e o FBI no limiar de uma nova experiência que utilizará 100.000 fotos de tatuagens, os encarregados devem suspender essa pesquisa até que se lide com a violação da primeira emenda, com as questões éticas e com os problemas de privacidade identificados pela FEP", escreveram Maas e Mackey.

O sistema de reconhecimento de tatuagens seria uma adição à crescente coleção de bancos de dados biométricos do FBI, muitos dos quais contêm pessoas que nunca foram suspeitas de nenhum crime, muito menos acusadas ou condenadas.

Em um de seus últimos comunicados, o FBI revelou seu desejo de tornar seu gigantesco arquivo de reconhecimento facial imune à Lei de Privacidade americana, com base na crença de que esses dados poderiam ajudar a identificar e prevenir crimes. No final do ano passado, esse arquivo já contava com mais de 52 milhões de rostos, incluindo fotos de milhões de americanos inocentes que solicitaram vistos internacionais ou tiveram seus antecedentes checados por seus empregadores.

Tradução: Ananda Pieratti