FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

A Guerra Cibernética Entre o Canadá e a China Continua

Agentes chineses têm atacado o maior órgão de tecnologia dos canadenses, criando uma possível crise diplomática entre os dois países.
Crédito: Dan/​Flickr

Pode ser difícil imaginar o Canadá e a China como inimigos políticos, mas estamos começando a ver o que se esconde atrás dos panos da diplomacia internacional: os dois países têm travado uma dura batalha de ciberespionagem.

A CTV News noticiou que hackers chineses têm atacado o NRC (Conselho de Pesquisa Nacional do Canadá, em português), maior órgão de tecnologia e ciência do país, desde o mês passado. Os ataques ficaram tão intensos que os chefões do NRC decidiram desconectar os servidores do órgão, de modo a evitar possíveis invasões.

Publicidade

O NRC desenvolve pesquisas de última geração no setor aeroespacial, de tecnologia de segurança, de mineração, de saúde e na área da astrofísica. Em outras palavras, o órgão possui um tesouro intelectual perfeito para os piratas chineses, conhecidos por seus ataques à propriedade intelectual. As informações roubadas são utilizadas para suprir a demanda das empresas estatais chinesas.

Conversei com o Departamento de Relações Exteriores do Canadá sobre a última onda de ciberataques chineses. O porta-voz Adam Hoge disse que John Baird, Ministro das Relações Exteriores do Canadá, tem consciência da situação, e que ela já está sendo discutida nos mais altos campos diplomáticos.

"O ministro viu nessa situação uma oportunidade de ter uma discussão direta com o ministro chinês; os dois tiveram uma conversa franca sobre o caso", escreveu Hodge em uma comunicado via email para o Motherboard, a respeito da conversa entre Baird e Wang Yi, o Ministro de Relações Exteriores da China.

"Nosso governo leva esse assunto muito a sério; estamos discutindo a situação nos níveis mais altos de nossas administrações, tanto em Pequim quanto em Ottawa", diz o comunicado.

O NRC disse que o Sistema de Segurança de Comunicações (CSEC, sigla em inglês), espécie de NSA do Canadá, identificou os ataques e avaliou a seriedade dessas investidas.

"Recentemente, o Governo do Canadá, com a ajuda do CSEC, detectou uma tentativa de invasão ao arquivo digital do Conselho Nacional de Pesquisa do Canadá", afirmou o NRC em um comunicado oficial. "Seguindo a avaliação da NRC e de seus sócios de segurança, foram tomadas as ações necessárias para conter e solucionar essa falha de segurança, incluindo a proteção dessas informações e a notificação do Comissário de Privacidade do Canadá. O NRC também fez questão de informar seus clientes e partes interessadas sobre essa situação."

Publicidade

Sabe-se que o exército da China possui um poderio ciberbélico muito sofisticado, com ataques ministrados direto do prédio do Exército de Libertação Popular, em Pequim.

Conhecido como PLA Unit 61398,esse grupo de hackers já foi indiciado pelo FBI pelo roubo de segredos comerciais – entre seus alvos estão produtores de drones e o Departamento de Estado dos EUA.

Os ataques ao Canadá seguem o mesmo padrão dos outros ataques chineses. Como escrevi em maio, documentos divulgados no Ato de Acesso à Informação afirmam que o Canadá registrou cinco ataques spear phishing ao Departamento de Propriedade Intelectual Canadense – esse tipo de ataque é a marca registrada dos agentes chineses da Unit 61398.

Quando minha última reportagem foi publicada, o agente de inteligência da CSIS e Chefe da Ásia e do Pacífico Michael Juneau-Katsuya me disse que o Canadá estava abertamente em conflito econômico e de espionagem digital com os chineses. A julgar pelos últimos acontecimentos, isso ainda não mudou.

Outros ataques foram registrados durante a última década. Esses ataques incluem a grande ofensiva ao governo canadense em 2011, quando hackers chineses sopostamente atacaram IP's da Organização de Defesa e Pesquisa do Canadá.

"Todo país tem algum programa de espionagem industrial. A China é um dos vários países que tentam roubar tecnologia para benefício próprio", disse o expert em segurança Robert Masse, novo diretor canadense da firma de segurança digital Mandiant, responsável pelo relatório sobre a ciberespionagem chinesa em 2013.

Publicidade

"Eles espionam qualquer país que possua alguma tecnologia ou propriedade intelectual que lhes seja útil", disse Masse. Ele diz que sabe de vários outros incidentes envolvendo espionagem chinesa no Canadá, "mas não posso falar sobre vários deles… é algo que vem acontecendo há anos."

Masse disse que os agentes chineses costumam utilizar ataques do tipo spear phishing para acessar outras redes; após isso, eles entram nos sistemas de computação governamentais, vasculhando as redes atrás de informações úteis.

"Biotecnologia, energia, tecnologia aeroespacial, informações militares – qualquer empresa [canadense] relacionada a esses ramos é um alvo e tanto para vários governos, incluindo o chinês. A China tem um forte grupo ofensivo, cujo objetivo é obter tecnologia de outros países", ele disse.

O NRC e o Departamento de Propriedade Intelectual Canadense são os principais alvos desses ataques – mas não os únicos. Existem indícios de que a Nortel, falecida gigante de tecnologia canadense, tenha sido um grande alvo dos espiões chineses por anos.

Não sabemos se o Canadá planeja apenas se manter na defensiva. O país é parte dos Cinco Olhos e é aliado dos EUA, o arquirrival cibernético da China; é possível supor que o país esteja preparando uma ofensiva, mas não temos nenhum confirmação oficial do fato.

A questão mais importante é: com ataques cada vez mais invasivos e bem-sucedidos, por quanto tempo esse conflito velado se manterá nas sombras da internet? Um encontro cara a cara entre Baird e Wang Yi demonstra a seriedade da questão: é bem provável que esse conflito cibernético venha a público.

Tradução: Ananda Pieratti