Por que a PEC 241 pode devastar a ciência brasileira
Grana curta congelada, disputas ferrenhas entre pesquisadores, fuga de cérebros, tecnologias paradas e falta de avanço na saúde. Seria tudo isso um luxo dispensável? Crédito: Wikimedia Commons

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Tecnologia

Por que a PEC 241 pode devastar a ciência brasileira

Grana curta congelada, disputas ferrenhas entre pesquisadores, fuga de cérebros, tecnologias paradas e falta de avanço na saúde. Seria tudo isso um luxo dispensável?

A famigerada PEC 241 virou assunto até nos botecos brasileiros. Apelidada carinhosamente de "PEC do fim do mundo" e "PEC da maldade", ela determina que o orçamento do governo federal só poderá crescer de acordo com a taxa de inflação pelos próximos 20 anos. Em miúdos: o único jeito de um ministério aumentar seus gastos é se a inflação subir. Se isso não acontece, tudo permanece como está. No caso particular da ciência, isso pode ser uma verdadeira tragédia.

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Começou com o puxadinho ministerial

Uma das primeiras medidas do governo Temer foi fundir o antigo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação à pasta das Comunicações. Entidades importantes como Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) foram contra a ideia. Um dos problemas é que a ciência está dividindo o orçamento e administração com uma área que não é exatamente próxima -- as comunicações. Além de ter que dividir a grana, que já era curta, o novo ministério não ficará focado apenas nas questões relativas ao mundo científico.

A grana curta congelada

O principal problema criado pela PEC 241 é o fato de que o orçamento de 2016, que servirá de base para os investimentos futuros, era baixo. Na realidade, é o pior em sete anos: R$ 4,6 bilhões. Nos últimos 10 anos, encolheu 30%. A previsão para o ano que vem é de que seja de R$ 5,9 bilhões, a ser dividido com as comunicações. Crescimento deste valor só se a inflação subir. E a taxa estará limitada à taxa de crescimento. É claro que a SBPC e a ABC já se mostraram contrárias e manifestaram seu descontentamento aos deputados por meio de uma carta entregue aos 513 parlamentares.

Miolos em disparada para fora

Grande parte da ciência brasileira sobrevive graças às bolsas concedidas pelo governo. Um orçamento congelado, na prática, impede a expansão da ciência nacional. Pode atrapalhar o desenvolvimento de novas linhas de investigação científica, uma vez que as já existentes serão priorizadas. Os recursos existentes serão disputados à tapa e muita gente deve ir ao exterior para conseguir pesquisar: é a chamada "fuga de cérebros". Em agosto, por exemplo, o CNPq cortou 20% das bolsas de iniciação científica), oferecidas a estudantes do ensino médio e da graduação. E há um rumor de que mais tesouradas estão por vir: repercutiu nas redes sociais uma informação não confirmada de que as bolsas de produtividade em pesquisa, concedidas a pesquisadores de destaque, também terá uma redução entre 20% e 30%.

De avental e pires na mão

Os cientistas já cogitam uma alternativa caso a PEC seja aprovada. A ideia seria criar uma espécie de "Lei Rouanet", para permitir às empresas financiar pesquisas em troca de renúncia fiscal. Esse modelo não é o ideal, no entanto. O Brasil participa de diversos projetos de pesquisa internacionais que requerem fundos constantes. Qualquer interrupção pode comprometer os cientistas brasileiros e impedir seu trabalho.

Ciência não é luxo

Os mais pragmáticos podem dizer que vivemos um momento de crise e investir em ciência não é prioridade. Que o momento é de colocar dinheiro na educação, saúde, transporte… Deixar de investir em ciência, porém, é impedir que o país crie novas tecnologias, processos produtivos, remédios, tratamentos de saúde e mais. A longo prazo, esse congelamento pode significar um grande atraso para a nossa economia, o que, por sua vez, pode gerar mais crises futuras.

Diogo Antonio Rodriguez é jornalista e editor do meexplica.com. Na coluna Motherboard Destrincha, ele resume os assuntos mais intrincados da ciência e da tecnologia. Siga-o no Twitter.