​Os Possíveis Futuros do Minhocão em São Paulo
Crédito: Felipe Larozza

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​Os Possíveis Futuros do Minhocão em São Paulo

O Minhocão incomoda muita gente, mas no futuro próximo ele será obrigado a mudar. O que fazer?

Sempre rola aquele papo de que cidades são selvas de concreto. Mas nada se parece tanto com isso de verdade quanto o Minhocão. Andar sobre o elevado num domingo é se emaranhar no meio dessa selva, olhar pros lados e ver prédios, olhar pra frente e ver o asfalto, pra baixo e ver carros. No fim do dia, as luzinhas começam a se acender e o ambiente fica meio sinistro, quase sem saída. São mais de três quilômetros a serem percorridos e não há como fugir do cimento. Na verdade, me senti no cenário de Blade Runner no meio daquele monte de concreto à noite. Agora, precisamos pensar no que fazer com esse monte de concreto para tentar mudar esse estranho cenário de São Paulo.

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Em 2006 a prefeitura de São Paulo lançou um concurso para concorrer ao prêmio Prestes Maia de Urbanismo. A proposta vencedora intensificaria essa sensação de estar numa selva de pedra futurista. O projeto dos arquitetos Juliana Corradini e José Alves se chama "O Novo Elevado" e consiste em remodelar o Minhocão, através de uma estrutura de metal em volta do concreto. "Acoplamos à estrutura de concreto existente uma nova estrutura metálica cuja cobertura configura-se num espaço de três quilômetros para usos de lazer e cultura. Este envelope metálico gera, num primeiro momento, um edifício suspenso onde hoje os carros trafegam", explica Juliana. Seria bem louco.

Essa ideia é factível hoje, enquanto os carros ainda trafegam pela minhoca. "Nossa estratégia era implantar o parque antes dos carros saírem de lá. Implantado o nosso projeto, a partir do momento em que os carros saíssem, iniciaríamos um processo de transformação, agregando novos usos ao longo dos três quilômetros do Elevado. Nosso discurso é valido enquanto os carros existirem lá. No dia em que o Minhocão for desativado, acho que um parque sobre as pistas de tráfego seria a opção mais adequada e ágil", diz Juliana. José aposta que o projeto de remodelar o Minhocão dessa forma é educativo: "Iríamos adquirir mais repertório urbano e assim não temeríamos a novidade e a inovação."

Nesse mesmo concurso, a proposta dos arquitetos Fernando Forte, Lourenço Gimenes e Rodrigo Marcondes Ferraz ganhou menção honrosa. O Rodrigo me contou que a ideia deles é demolir algumas partes do elevado e deixar outras, nos trechos mais largos da avenida, que seriam ocupados por espaços de lazer. "Fazer uma praça elevada, um parque pequeno, ou espaços públicos, como uma biblioteca, isso eu acho interessante, porque mantém de alguma maneira a história do que já existiu lá", ele explica.

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A questão é preservar a memória do espaço e ao mesmo tempo melhorar a situação da região. Uma das grandes preocupações do grupo foi com o que acontece embaixo do Minhocão, porque "ele escurece as ruas, piora o trânsito da região toda e os apartamentos mais baixos e perto da avenida ficam desocupados, porque é impossível conviver com o barulho", diz Rodrigo. Mas ele me disse também que o projeto é bem mais amplo: eles pensaram no trânsito – que vai ficar meio caótico por ali sem o Minhocão. "Primeiro é preciso fazer uma medição do tráfego do Minhocão, uma análise de como fazer essa ligação leste-oeste, e o Minhocão faz isso muito mal. Pra responder isso, a gente faria uma via ao lado da linha [diamante] do trem, propondo uma ligação leste-oeste mais eficaz. Por fim, faríamos um trecho com um túnel ali, e o Minhocão só seria demolido depois dessa construção", ele explica.

As ideias são interessantes, mas nada é certo, por enquanto – só o fato de que o dia do juízo final do Elevado Costa e Silva está próximo, ame-o ou odeie-o. No dia 31 de julho desse ano foi sancionado o novo Plano Diretor da cidade pelo prefeito Fernando Haddad, que determina em um artigo a desativação do Minhocão e a sua demolição ou transformação em parque. A decisão agradou todos os arquitetos com quem eu conversei. O vereador Nabil Bonduki o chama de "desastre urbanístico", que perdura em São Paulo há mais de 40 anos.

Perguntei a ele e ao vereador Police Neto, que ajudou a incluir o destino do Minhocão no Plano Diretor, o que eles achavam da construção do parque e os dois concordaram que é a alternativa mais barata. A segunda opção, da demolição, para o vereador Police Neto, é um desperdício. "Não tem sentido toda a energia gasta naquilo e todo o dinheiro público ser jogado fora", ele aponta.

Não tem sentido toda a energia gasta naquilo e todo o dinheiro público ser jogado fora

Sendo assim, ficaremos com o parque – ou alguma coisa próxima disso. Desde o ano passado existe a associação Parque Minhocão, que não tem um projeto definido, mas já colheu umas 4 mil assinaturas de pessoas que curtiriam dar um rolê nesse pico – e na verdade já curtem aos domingos e à noite, já que os carros não passam por ali, das 21h30 às 6h todo dia. Esse lance todo de parque no elevado foi inspirado no sucesso do High Line de Nova York, um parque elevado que foi construído numa linha de trem abandonada.

Mas esse High Line original feito no Brasil traria um outro problema: a especulação imobiliária. Um apê pela região sem o barulho e a poluição do Minhocão e talvez com um parque de bônus com certeza vai valer muita grana. A arquiteta Paula Santoro se preocupa com o que pode acontecer com a população de baixa renda e os moradores de rua que vivem ali embaixo: "Tanto a opção do parque quanto a opção da demolição são positivas, mas são tão positivas que podem expulsar as pessoas." Ela acha que os moradores têm que ser consultados. Seja lá o que for acontecer com aquele trambolho, tudo deve ser cuidadosamente planejado e o problema não é simples. "A gente tem que fazer uma opção consciente, não apaixonada", conclui.