​O Que Rolou No Primeiro Dia do Julgamento do Silk Road

O julgamento do suposto cérebro por trás do Silk Road, o comércio online anônimo que entre outras coisas vendia drogas ilícitas, começou oficialmente na tarde de terça-feira com declarações da acusação e defesa, bem como a primeira testemunha, o agente especial da Segurança Nacional Jared Deriyegnan.

A acusação argumentará que Ross Ulbricht, um educado programador texano, fundou o site responsável que lucrou mais de um bilhão de dólares de forma suspeita. Já a defesa afirmará que Ulbricht está sendo responsabilizado no lugar de criminosos mais sofisticados que escaparam do FBI. Os procedimentos tiveram início com a escolha do júri e pela leitura de uma lista previamente censurada de testemunhas feita pela juíza Katherine Forrest.

O promotor-assistente dos EUA Timothy Howard fez a declaração de abertura da acusação, delineando uma imagem sinistra do Silk Road como "um paraíso online para a compra e venda de drogas" que o governo afirma ter sido criado e administrado por Ulbricht sob a alcunha "the Dread Pirate Roberts" ou DPR.

"Este caso trata de uma parte secreta e obscura da internet", disse Howard, dando início à sua declaração. "Trata de um site chamado Silk Road, onde pode-se comprar e vender drogas ao clique de um mouse".

"E aquele homem", disse, apontando ao réu, "Ross Ulbricht, era seu chefão".

Howard então prosseguiu, fazendo um sumário de todas as provas que acusação pretende levar ao julgamento contra Ulbricht, muitas das quais já foram divulgadas, além de muitas outras adições. Ele descreveu detalhadamente o dia que os agentes do FBI prenderam Ulbricht, seguindo-o de seu apartamento até a seção de ficção científica de uma biblioteca pública em San Francisco, onde o pegaram com seu notebook aberto após esperarem que ele se conectasse ao Silk Road.

No notebook de Ulbricht, disse Howard, investigadores encontraram registros de vendas de drogas, chats incriminadores, uma lista de afazeres relacionadas ao Silk Road, e um diário pessoal cheio de "confissões devastadoras" sobre como ele havia criado e administrado o site.

"Eu sou o Silk Road, o comércio, a pessoa, o empreendimento – tudo", tudo isso de acordo com uma declaração Howard afirma ter sido encontrada no computador.

Howard também declarou que quando o notebook de Ulbricht foi interceptado, ele estava em um chat sob o pseudônimo DPR com um agente infiltrado do FBI que se passava por administrador do site.

"Ulbricht foi pego com a mão na massa acessando o Silk Road", afirmou Howard, "Dread Pirate Roberts foi desmascarado como Ulbricht, o réu".

Porém, enquanto o advogado de Ulbricht, Joshua Dratel, admitiu pela primeira vez durante a sessão na terça-feira que Ulbricht criou o Silk Road a título de 'experimento econômico', ele afirma que o réu passou o comando do site para outros administradores pois o trabalho era "estressante demais", em 2011, passados alguns meses.

A defesa argumenta que estes administradores então devolveram o site para Ulbricht em 2013 quando souberam da investigação federal, recrutando-o inadvertidamente para assumir a culpa.

Em última instância, a defesa planeja argumentar que por conta da natureza anônima da internet, não há como provar com 100% de certeza que Ulbricht estava agindo no papel de DPR durante a ascensão e queda do site.

"A internet é um lugar esquisito", disse Dratel em sua declaração. "As pessoas podem criar perfis de si mesma e de terceiros de forma que não teríamos nem como imaginar há 25 anos atrás".

No entanto, a acusação afirma ter ao menos uma testemunha que conhecia Ulbricht na vida real: um antigo colega de faculdade que disse que ter ajudado na programação do site, e que depois forçou Ulbricht a admitir a ele o que estava fazendo.

Muitos trouxeram à tona preocupações quanto aos aspectos técnicos do caso, que não seriam entendidos pelo júri típico, e a juíza Forrest já mencionou que levará isso em consideração durante o julgamento. Quando Deryegnan testemunho, ele incluiu uma explicação muito simples do que é a rede anônima Tor, que era necessária para conectar-se ao Silk Road. Deryegnan mostrou um vídeo passo-a-passo ao júri de como a rede camuflava endereços de IP (outro conceito que ele explicou amplamente).

Deryegnan afirmou ter ouvido falar do Silk Road pela primeira vez ao trabalhar como agente especial da Segurança Nacional no aeroporto O'Hare em Chicago. Ele afirma ter aberto uma investigação do site após ter visto mais de milhares de apreensões chegando pelo correio em O'Hare em 2011. Deryegnan forneceu fotos de algumas das drogas apreendidas para o júri.

Ele afirmou que para investigar o site, criou uma conta lá e passou milhares de horas explorando-o, chegando a fazer mais de 50 compras quando disfarçado.

Por conta desta pesquisa e mais, Howard disse que o estado pode provar que Ulbrich, no papel de Dread Pirate Roberts, participava de todas as operações do site. De acordo com a acusação, ele dava dicas para os comerciantes de como enviarem seus produtos pelo correio, resolvia problemas entre clientes e vendedores, supervisionava e pagava funcionários, e, por último, ganhou mais do que 18 milhões de dólares das mais de 1 milhão de transações com drogas que se deram no site ao longo do tempo através de comissões de no mínimo 10% em cima de cada compra.

A acusação também afirma que Ulbricht atraía vendedores que nunca haviam vendido drogas antes com a facilidade e anonimato do Silk Road. Um destes comerciantes servirá de testemunha.

Howard também disse que Ulbricht encomendou diversos assassinatos para proteger o site, o que foi alegado em queixas criminais feitas em Nova York e Maryland. Por mais que estes assassinatos não tenham sido bem-sucedidos, mostraram que "ele estava disposto a tudo para proteger seu império".

Durante as próximas quatro a seis semanas, a acusação apresentará evidências para tentar provar tudo isso. Nesse meio-tempo, Dratel afirma que Ulbricht não era Dread Pirate Roberts, mas sim "o cara certo para ser derrubado".

"Que Ross é o DPR é uma contradição tão fundamental que desafia o senso comum", disse Dratel. "O verdadeiro DPR ainda está lá fora."

Tradução: Thiago "Índio" Silva