O Grupo de Cientistas que Quer Salvar o Planeta do Próximo Grande Asteróide
Crédito: Daniel Oberhaus

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Tecnologia

O Grupo de Cientistas que Quer Salvar o Planeta do Próximo Grande Asteróide

Quem são os observadores da Guarda Espacial.

É uma tarde fria no pico do Monte Bigelow, localizado a uma hora de Tucson, no sudoeste dos Estados Unidos. O vento gelado queima meu rosto enquanto assisto às cores do pôr-do-sol iluminarem as montanhas de Santa Catalina.

Esse é o lar do Observatório Catalina da Universidade do Arizona, um lugar escondido no deserto cuja missão é descobrir e monitorar cometas e asteróides que passam a menos de 120 milhões de milhas da órbita da Terra — os chamados Objetos Próximos da Terra (os NEOs, na sigla original), que tem a maior chance de destruir a humanidade.

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Estou acompanhado de Eric Christensen, cientista da Universidade do Arizona e chefe da pesquisa, que fez a gentileza de me trazer até aqui para uma noite de observação. Christensen, de 37 anos, é um homem tranquilo e gentil, com sobrancelhas escuras que são acentuadas por sua cabeça careca. Tiramos nossas compras da caminhonete e as largamos no quarto que será nossa casa durante as três noites de observação — isso se as nuvens permitirem, é claro.

Depois de guardar as compras, apreciamos o pôr do sol e as nuvens imensas acumuladas no horizonte. "O tempo não está muito bom", diz meu companheiro.

O estado de Arizona tem em média 300 dias de tempo bom por ano. Como sou muito sortudo, escolhi uma das poucas noites de chuva para participar de uma atividade que exige visibilidade perfeita.

"As consequências de um impacto, mesmo que de um cometa ou asteróide pequenos, seriam devastadoras."

O celular de Christensen toca; é sua filha de quatro anos ligando para desejar boa noite. Ele some para dentro do observatório por alguns minutos antes de voltar.. O pesquisador dá mais uma olhada no céu escurecido e me empurra para dentro com a esperança de que possamos usar o telescópio antes que as nuvens cinzentas obscureçam nossas visões.

Para um observatório encarregado de evitar a extinção da humanidade, o clima aqui em Catalina é bem tranquilo.

O NASCIMENTO DA GUARDA ESPACIAL

Há algumas décadas, ninguém levava a ameaça espacial a sério. Isso mudou no dia 23 de março de 1989, quando um asteróide de 300 metros de diâmetro chamado 1989F passou a 800 mil quilômetros da Terra. Nas palavras do New York Times, "em termos cósmicos, podemos dizer que nos safamos por pouco".

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Se o 1989FC tivesse atingido a Terra, poucos humanos sobreviveriam à vida pós-impacto. E a parte mais preocupante desse caso foi o fato de que ninguém sabia que ele estava se aproximando. A existência do asteróide só foi constatada oito dias depois dele passar por nosso planetinha a míseros 74.000 k/h.

Christensen com um dos telescópios do Observatório Catalina. Crédito: Daniel Oberhaus

Após esse flerte com o apocalipse, o Congresso Americano pediu que NASA redigisse um relatório sobre a ameaça de um possível impacto. O documento escrito em 1992 — "O Relatório Guarda Espacial: Levantamento do Workshop de Detecção de Objetos Próximos à Terra Internacional da NASA" — não era lá muito otimista.

Caso a Terra fosse atingida por um grande asteróide, diz o relatório, seus habitantes seriam agraciados com chuvas ácidas, bolas de fogo e um longo inverno causado pela poeira que cobriria a estratosfera.

Nos momentos seguintes ao impacto, o local atingido — que abrange cerca de 10 ou 15 vezes o tamanho do asteróide — seria vaporizado. Plantas e animais sofreriam com temperaturas altíssimas por cerca de meia hora seguidas de uma "tempestade de fogo de dimensão continental". Depois, o planeta ficaria na escuridão total, coberto por densas nuvens de poeira que cobririam o sol por meses. As temperaturas cairiam drasticamente durante esse período e, quando a nuvem se dispersasse, o efeito estufa causado pela água acumulada na atmosfera aumentaria as temperaturas em até 10 graus acima da média.

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Para evitar um fim tão dramático, a NASA recomendou que universidades e observatórios se unissem em uma "Guarda Espacial" (um título informal cunhado em homenagem à série Star Trek). Esse grupo seria encarregado de identificar qualquer asteróide que se aproximasse da órbita da Terra.

Um desastre dessa magnitude só poderia ser causado por um asteróide com vários quilômetros de diâmetro. Estima-se que o asteróide que supostamente matou os dinossauros há cerca de 65 milhões de ano tinha cerca de 9.6 km de diâmetro. Acredita-se que seu impacto, que formou uma cratera de 177 km na Península de Yucatán, tenha criado uma explosão equivalente a um milhão de megatoneladas de explosivos.

Apesar da terrível perspectiva de uma colisão, a NASA não acatou suas próprias recomendações até 1998. Motivada pela previsão (errada) de um astrônomo de Harvard de que um asteróide passaria a 50.000 quilômetros da Terra em 2028, a NASA anunciou a criação de um Programa de Observação de Objetos Próximos da Terra (NEOO, na sigla original), incubido de rastrear 90% dos NEOs com mais de um quilômetro de diâmetro durante a próxima década.

Embora o nome oficial do programa seja NEOO, muitos dos seus membros ainda se referem ao grupo de observatórios como Guarda Espacial. Hoje a organização conta com uma série de observatórios, incluindo Christensen e sua equipe de quatro astrônomos no Observatório de Catalina, o Sistema de Resposta Rápida e Telescópio Panorâmico (Pan-STARRS) no Havaí, o Laboratório Lunar e Planetário da Universidade do Arizona, o Laboratório Planetário em Kitt Peak, e o Near Earth Asteroid Tracking (NEAT), localizado na Califórnia.

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Apesar dos riscos, o uso de armas nucleares para destruir asteróides ainda é visto como uma opção viável

Em 2005, o Congresso Americano expandiu o escopo da Guarda Espacial: a partir de então, o grupo ficaria encarregado de rastrear 90% de todos os NEOs com diâmetro maior do que 140 metros até 2020. Trabalho duro, se considerarmos que podem existir mais de meio milhão de objetos desse tipo no nosso sistema solar.

Embora esses objetos sejam menores do que os alvos originais do programa, eles também tem o poder de causar danos. "Nosso planeta está exposto a todo tipo de cometas e asteróides", disse Dan Mazanek, um engenheiro de sistemas espaciais do Centro de Pesquisa Langley da Nasa. "As consequências de um impacto, mesmo que de um cometa ou asteróide pequenos, seriam devastadoras."

Há dois anos a Terra sentiu na pele o tipo de dano que pode ser causado por um pequeno asteróide — e isso porque ele nem chegou ao solo.

CHELYABINSK

No dia 13 de fevereiro de 2013, moradores de Chelyabinsk, uma cidade russa próximas à fronteira com o Cazaquistão, recebeu uma visita inesperada direto do espaço. Por volta das 9:30 da manhã, os habitantes levantaram os rostos em espanto para olhar a grande bola de fogo e fumaça que cruzava os céus. Depois de adentrar a atmosfera terrestre a aproximadamente 64.000 km/h, o meteoro explodiu a uma altitude de 97 mil pés e liberou cerca de 500 quilotoneladas de energia — quase 25 vezes a energia liberada pela bomba atômica lançada em Hiroshima.

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O meteoro não apenas surpreendeu cientistas e a população; ele também feriu ao menos 1.220 pessoas com a energia liberada em sua explosão.

É de se imaginar que todo esse dano tenha sido causado por um meteoro de tamanho considerável, certo? Ledo engano — esse meteoro tinha apenas 20 metros de diâmetro.

Vídeo das consequências da colisão em Chelyabinsk.

O evento ressaltou a importância prática da catalogação e monitoração de meteoros de pequena escala, visto que o meteoro era bem menor do que a base imposta pela NASA.

"Creio que mais pessoas estão se conscientizando acerca do risco de impactos. Mas é difícil se preocupar com algo que acontece a cada cem, mil, 10 mil ou milhões de anos", disse Mazanek. "Isso nos atrapalha a racionalizar e internalizar essa ameaça. Mas o que importa é que, quando isso acontecer, o mundo não será mais o mesmo. O incidente de Chelybinsk certamente mudou a vida das pessoas da área e acredito que também trouxe mais atenção para o risco de um impacto maior."

O caso de Chelyabinsk levou a ameaça de um impacto para o campo do real, mas muitos cientistas alertam que tais incidentes não devem ser retratados de forma sensacionalista. "Tem gente que gosta de usar o impacto de Chelyabinsk para dizer 'ah, se o meteoro tivesse caído em um ângulo mais fechado, as sequelas seriam muito piores'— mas qualquer evento pode ser extrapolado para algo pior. É uma hipótese arbitrária", disse Christensen. "Se soubéssemos sobre o meteoro de Chelyabinsk, digamos, há 10 anos, duvido que faríamos qualquer coisa para impedí-lo além de estudá-lo com muito cuidado e evacuar a população. É um equilíbrio muito complicado — não podemos exagerar esse risco, mas também não podemos ignorar algo que pode representar uma ameaça muito real."

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PONTINHOS NUMA TELA

Em Catalina, parecia que Christensen e eu não iríamos contribuir com nenhuma descoberta naquela noite. Quando estava escuro o suficiente para ver estrelas, as nuvens já haviam tomado o céu. Percebendo minha tristeza, Christensen sugeriu que fizéssemos algumas simulações para passar o tempo. "Você não está perdendo nada muito empolgante", disse ele enquanto abria o programa. "Não é como se tirássemos fotos em alta resolução desses asteróides — olha só."

A tela se acende com uma confusão de quadradinhos numerados, cada um dos quais representava um quadrante do céu de Catalina. Quando Christensen clica em um dos quadrados, surge um pequeno pontinho pixelado que atravessa a tela chuviscada. É assim que se descobre um asteróide, diz ele.

A equipe rastreia cada um desses pontinhos por cerca de uma hora e tira fotos em intervalos regulares para calcular seu deslocamento e calcular sua trajetória, duas informações essenciais para os relatórios do observatório.

O processo de descobrir novos NEOs é dolorosamente lento, o que faz todo o sentido, em especial considerando o tamanho do campo de estudo (o céu) e a magnitude dos objetos estudados (asteróides entre 140 e 1.000 metros de diâmetro).

Homem olhando a Cratera Barringer, ao lest de Flagstaff, no norte do Arizona, criada por um meteorito com apenas 50 metros de diâmetro. Crédito: Daniel Oberhaus

O campo de visão do telescópio principal de Catalina cobre aproximadamente um grau ao quadrado (unidade de medida utilizada na astronomia) do céu — para entender, é bom lembrar que o raio de uma lua cheia tem cerca de meio grau — e é considerado o maior telescópio de observação em funcionamento.

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"Não temos como saber onde esses asteróides estão. No entanto, sabemos, com base em observações passadas, quais são os locais ideais para observá-los", disse Christensen. "Algumas pessoas comparam isso a procurar suas chaves debaixo de um poste, mas a analogia da chave não funciona muito bem, porque não estamos procurando apenas um molho de chaves, e sim milhares deles."

Apesar dos desafios, o observatório Catalina descobre cerca de 600 novos NEOs por ano, o que fazia dele o observatório mais eficiente antes do Sistema de Resposta Rápida e Telescópio Panorâmico (Pan-STARRS), uma unidade da Guarda Espacial no Havaí, quebrar o recorde no ano passado. Catalina foi responsável por 617 dos 1.477 NEOs descobertos ano passado, e a Pan-STARRS, por 620.

LEVANDO A PESQUISA PARA O ESPAÇO

Embora seja grande o número de descobertas feitas pela equipe de Catalina, há coisas que não podem ser observadas da superfície da Terra. É por isso que alguns visionários defendem a possibilidade de instalar sistemas de detecção no espaço.

"Se tivéssemos missões espaciais voltadas para a detecção de possíveis ameaças, poderíamos encontrar objetos que não podem ser vistos da Terra", explicou Christensen.

Sistemas espaciais não são afetados pelas condições climáticas terrestres. Além disso, eles podem conduzir pesquisas de forma muito mais constante. Também podem utilizar técnicas como a análise por infravermelho, que não funciona na Terra graças à atmosfera quente do planeta.

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A Fundação B612, uma ONG americana que busca proteger o planeta de impactos (e que não faz parte do programa NEOO da NASA), está construindo o Telescópio Sentinela, que em teoria será lançado na órbita da Terra para acelerar o processo de descoberta de NEOs. De acordo com a Fundação, o Sentinela será lançado na garupa de um foguete SpaceX Falcon 9 em 2016. Uma vez em órbita, ele terá capacidade para detectar 90% de todos os NEOs com mais de 140 metros de diâmetro.

A NASA está financiando projetos semelhantes, incluindo o Wide-field Infrared Survey Explorer (WISE), cuja função é vasculhar o cosmos em busca de asteróides em rota de colisão com a Terra. O projeto foi reativado em 2013, após um período de dois anos de hibernação. Há também o NEOCam, um telescópio infravermelho que poderia observar objetos tanto dentro quanto fora da órbita terrestre graças à sua órbita, .

Esses sistemas de detecção espaciais são bons em encontrar cometas de longo período, isto é, aqueles que levam mais de 200 anos para completar uma volta ao redor do sol.

Infelizmente, os esforços para rastrear asteróides perigosos estão sucumbindo graças a problemas financeiros e organizacionais

"Os cometas de longo período vêm dos limites mais longíquos do sistema solar", disse Mazanek. "Eles compõem uma pequena porcentagem do número de objetos. No entanto, representam um problema muito sério: em alguns casos, esses cometas podem ser detectados meses ou anos antes da colisão, enquanto um asteróide pode ser visto décadas antes de qualquer aproximação."

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Há uma sensação de urgência na voz de Mazanek, algo que não senti em minhas conversas com Christensen. Embora Mazanek evite exagerar o perigo, ele já passou muito de sua vida divagando sobre as consequências de uma colisão do tipo, o que o deixou, com toda razão, ansioso para ver esse campo de estudo receber mais atenção.

No momento, mais de 12.700 NEOs foram descobertos e catalogados — um número impressionante. Mas conhecer suas trajetórias não é de muita ajuda, sobretudo quando não temos nenhuma ideia do que fazer caso um asteróide resolva dar um pulinho na Terra.

"O perigo é real", disse Mazanek. "Nós já fomos atingidos e seremos atingidos de novo."

HÁ UM ESTERÓIDE VINDO EM DIREÇÃO À TERRA. E AGORA?

Em Armagedom, filme de 1998, uma equipe de cientistas da NASA planeja detonar uma bomba nuclear em um asteróide, pulverizando-o antes que chegue à Terra. Para minha surpresa, esse plano não é tão absurdo.

Num dia quente de maio de 1995, engenheiros espaciais e um grupo de cientistas americanos e russos se encontraram no Laboratório Nacional Lawrence Livermore, localizado nos limites de São Francisco, para o Workshop de Defesa Planetária, uma conferência dedicada ao estudo e prevenção de ameaças extraterrestres.

Dentre os inúmeros participantes célebres estava Edward Teller, pai da bomba de hidrogênio. Durante uma das palestras, Teller divagou sobre a possibilidade de colocar uma bomba nuclear de uma gigatonelada na órbita terrestre. O mecanismo seria capaz de destruir NEOs de até 1 km de diâmetro, ou alterar a rota de NEOs com 10 km ou mais.

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Apesar da ideia de usar uma bomba nuclear poderosíssima para evitar uma catástrofe ser absurda, a sugestão de Teller faz bastante sentido — pelo menos em teoria. De acordo com um estudo da NASA, no caso de uma possível colisão, as soluções nucleares seriam entre 10 ou 100 vezes mais eficientes do que as alternativas não-nucleares.

Eficácia à parte, a solução nuclear ainda é muito controversa. As Nações Unidas proibiram o uso de armas nucleares no espaço. É claro que essa bomba seria utilizada para fins pacíficos, mas isso não muda o fato de que estaríamos colocando uma ogiva nuclear na órbita do planeta.

Eric Christensen procurando novos asteróides no Observatório de Catalina. Crédito: Daniel Oberhaus

Também existe um lado negativo nesse plano. Um exemplo é o fato de que muitos objetos celestes são formados por fragmentos de asteróides, algo como "pilhas de entulho" unidas pela gravidade. Nesses casos, um contra-ataque nuclear iria despedaçar essa estrutura, criando estilhaços que poderiam atingir a Terra.

Apesar dos riscos, o uso de armas nucleares para destruir asteróides ainda é visto como uma opção viável.

Na conferência de Conceitos Avançados e Inovativos organizada pela NASA em 2014, Bong Wie, do Centro de Pesquisa de Desvio de Asteróides da Universidade do Estado de Iowa, propôs a criação de uma nave espacial que interceptaria o asteróide, para em seguida lançar um dispositivo cinético, que, acoplado a uma ogiva nuclear, criaria um buraco em sua superfície. Ele recebeu R$600.000 da NASA para desenvolver seu "Veículo Hiperveloz de Intercepção de Asteróide", o que sugere que ainda existe um interesse considerável pelas estratégias nucleares.

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Entretanto, o número de métodos não-nucleares ultrapassam o de estratégias nucleares.

Em 2010, a Junta de Pesquisa Nacional dos EUA (NRC, na sigla original) encomendou uma pesquisa sobre a monitoração de asteróides e as possíveis estratégias para evitar um impacto futuro. As estratégias propostas no estudo e aquelas propostas por outros cientistas independentes variam entre o mundano e o futurista: de nuvens de vapor lançados na trajetória do asteróide ao uso de solenóides, no qual asteróides ricos em ferro são atraídos por uma bobina eletromagnética posicionada na órbita, o que retardaria o impacto.

Muitas agências espaciais defendem que a energia cinética não-nuclear é perfeitamente capaz de alterar o curso de um asteróide; a ideia é usar uma nave de alta densidade, ou até mesmo outro asteróide, como forma de transporte. Em um relatório de 2007, a NASA definiu a a estratégia não nuclear como a "resposta mais madura" para a ameaça espacial, apesar da bomba nuclear ser a estratégia mais eficiente.

A missão Impacto Profundo, iniciada em 2005, é um ótimo exemplo de uso da estratégia cinética. A NASA lançou "uma nave não-tripulada do tamanho de uma mesinha de centro em direção a um cometa de larga escala", o que ajudou os cientistas a determinar a porosidade e composição química dos cometas que atravessam o espaço profundo. Esse foi o primeiro dispositivo cinético enviado com sucesso para o espaço, algo que pode ser crucial para o futuro da pesquisa acerca da mitigação de asteróides.

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Outra técnica é a ablação de superfície, que basicamente utiliza energia concentrada para produzir um feixe que esquenta a superfície do NEO, transformando sua superfície sólida em gás.

Isso pode ser feito de duas formas: por meio do uso de lasers ou com o uso de energia solar, semelhante à uma lupa sendo utilizada para criar fogo.

Além dos obstáculos tecnológicos, esses sistemas de ablação trazem outro problema: a possibilidade deles serem utilizados para fins malignos, como destruir cidades com lasers espaciais.

Outra estratégia considerada pela NASA é a a catapulta eletromagnética, um sistema de propulsão futurista.

Em essência, a catapulta eletromagnética foi criada como um método de lançamento de naves. Nessa estratégia, o foguete de lançamento é substituído por um motor linear que alcança altíssimas velocidades. Quando acoplada a um asteróide, a catapulta eletromagnética pode usar detritos do próprio asteróide para guiar o objeto por uma trajetória prédeterminada. Além de diminuir sua massa, um equipamento desses usaria a propulsão do lançamento de seus próprios detritos para alterar a rota do asteróide.

Então qual seria a desavantagem de uma catapulta eletromagnética?

"Para mudar a órbita de um asteróide, é preciso jogar esses detritos em uma direção específica", disse Mazanek. "Asteróides giram sobre seu próprio eixo, o que significa que é preciso esperar até ele estar na posição ideal para o lançamento desse material. Logo, a imprevisibilidade da rotação torna essa técnica ineficiente — o asteróide pode girar de forma completamente aleatória.

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Além disso, as catapultas eletromagnéticas são sistemas grandes e complexos. Dependendo das circunstâncias, uma catapulta pode levar anos para ser instalada em um asteróide, tempo que teremos caso ele esteja perto da terra.

A última opção é o trator gravitacional. Esse plano consiste em cercar o asteróide com uma ou mais naves que utilizarão a força gravitacional para alterar sua rota. Embora essa opção tenha a vantagem de causar o mínimo de destruição possível, o tempo necessário para sua aplicação seria enorme; uma nave tem um poder gravitacional baixo demais para mudar a rota de um asteróide automaticamente.

ATRASOS E DESORGANIZAÇÃO

A Agência Espacial Européia se juntou à NASA para desenvolver uma missão de Análise sobre Impacto e Desvio de Asteróides (AIDA, na sigla original). A missão, que será iniciada em 2020, irá testar se uma nave é ou não capaz de desviar a rota de um asteróide. O alvo da missão é o 65803 Didymos, um corpo celeste binário composto por um asteróide grande e um cometa menor. Caso a nave seja lançada em 2020, ela irá atingir o asteróide por volta de outubro de 2022.

A missão contará com dois veículos, um que irá monitorar o asteróide e avaliar os resultados da missão, e outro entitulado como Teste de Redirecionamento de Asteróide Duplo (DART, ou dardo em inglês), que irá basicamente servir como uma arma cinética: em outras palavras, a nave irá se chocar contra o asteróide menor.

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A AIDA pode ser a primeira missão a conseguir desviar um asteróide com sucesso. Infelizmente, ela ainda está na fase de planejamento. Embora iniciada em 2012, a missão ainda não tem um programa de lançamento.

O estado da missão AIDA reflete um grande problema dentro da Guarda Espacial. Infelizmente, o objetivo instituído em 2005 (encontrar todos os NEOs de 140 metros ou mais na próxima década) está sucumbindo graças a problemas financeiros e organizacionais

"É bem provável que a Terra seja atingida por um asteróide em algum ponto do futuro."

Após relatórios da Junta de Pesquisa Nacional deixarem claro que a falta de verba torna essa meta impraticável, o NEOO aumento a verba do programa em dez vezes entre 2009 e 2014. Mesmo assim, o projeto ainda enfrenta muitas dificuldades. Uma auditoria divulgada em setembro do ano passado descreveu o programa NEOO como uma operação desestruturada e com objetivos vagos.

Lindley Johnson, único funcionário da NASA presente no projeto na época, acredita que essa avaliação foi um pouco injusta.

"Acho que nós somos uma equipe muito coesa. Sinceramente, acho que os avaliadores nunca haviam visto um programa igual a esse", disse Johnson com um forte sotaque texano.

Por mais rígida que a auditoria tenha sido, Johnson reconhece que a crítica trouxe mudanças. "Ganhamos mais funcionários, além de mais cientistas e executivos trabalhando na nossa nova estrutura", disse ele à Motherboard.

Quanto à suposta falta de estrutura da Guarda Espacial, Johnson acredita que a acusação se deve à natureza do programa.

"O Programa NEOO tem e sempre terá uma estrutura mais flexível, pois aproveitamos unidades e observatórios já existentes ao invés de construir uma estrutura só nossa", diz ele, se referindo aos observatórios que formam a Guarda Espacial. "Não existem nenhum funcionário da NASA no comando desse projeto."

A nova verba foi utilizada para contratar mais funcionários para o escritório principal do projeto (a unidade conta com 3.5 funcionários fixos, incluindo Johnson), e direcionar mais recursos para a detecção de asteróides. Segundo as estatísticas apresentadas por Johnson, o investimento trouxe resultados: em 2014, mais de 1.4000 objetos foram localizados, um número bem maior do que os 1.000 do ano anterior.

Mesmo com esse novo afluxo de dinheiro, diz Johnson, o programa ainda está muito aquém de suas metas. Ele estima que apenas 15% dos NEOs maiores de 140 metros foram descobertos, e reconhece que o programa não irá alcançar a meta de localizar todos esses asteróides até 2020.

"Para isso, precisaríamos de um sistema mais avançado", diz. "Para cumprir essa meta em uma década ou duas, seria necessário muito mais dinheiro do que o que temos hoje."

AGORA É SÓ ESPERAR

Não há nenhuma dúvida de que um impacto de larga escala poderia acabar com a vida na Terra. Considerando que os "sustos" mais recentes nos pegaram de surpresa, seria de se imaginar que o estudo dessas ameaças recebessem grandes investimentos.

O problema é que uma catástrofe desse tipo se desenrola em um ritmo geológico — em outras palavras, muito devagar. Os humanos não conseguem compreender esse tipo de ameaça, e a forma calma com que Christensen e outros pesquisadores falam sobre esse perigo pode estar prejudicando sua própria missão.

"Me incomodo toda vez que ouço alguém falar sobre o risco de colisão como uma ameaça existencial à humanidade", disse Christensen. "De certa forma, isso é verdade — se fizermos uma previsão dos próximos milhares de anos, é claro que um asteróide é um grande risco. O problema é que é muito fácil exagerar esse risco; quando isso acontece, sinto o impulso de defender o outro ponto de vista, e acabo minimizando essa ameaça. É bem provável que a Terra seja atingida por um asteróide em algum ponto do futuro. Na verdade, a Terra é atingida por asteróides todos os dias, mas eles são tão pequenos que nem chegam a ser considerados como asteróides — eles são conhecidos como meteoroides. Os grandes impactos guiaram a evolução da vida na Terra, e continuarão a ser uma grande força evolutiva."

"O fato é que podemos utilizar a tecnologia moderna para identificar essas ameaças, e isso é extremamente importante. Se podemos fazer isso com um investimento relativamente baixo, não vejo porque não fazê-lo."

Tradução: Ananda Pieratti