FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

​Desenvolvedores Dizem por que Tá Difícil Criar Aplicativos para o Apple Watch

"Não é tão interativo assim."
Crédito: LWYang/ Flickr

Fazem três meses que o Apple Watch foi lançado e, por mais que não saibamos quantos reloginhos foram vendidos, tem um monte de aplicativos pra eles. Target. American Airlines. Twitter. CNN.

A gente sabe que a Apple é excelente nisso de convencer desenvolvedores a criarem apps para seus novos produtos. A empresa domina o mercado dos smartwatches, de acordo com analistas; deixou para trás o queridinho indie Pebble, o Samsung Gear e os relógios com o sistema Android Wear, como o Moto 360.

Publicidade

Ao mesmo tempo, falta ao Apple Watch o tal "app matador" — aquele lance que melhora tanto a sua vida a ponto de valer o custo de no mínimo 350 dólares do aparelho.

Parte disso se deve ao fato de que os desenvolvedores estão descobrindo como as pessoas usam o bendito relógio. Existe um aplicativo para o Instagram, por exemplo, mas não para o Facebook. "Não sei se conseguiríamos colocar tudo ali de uma forma que ficasse satisfatória", afirmou um gerente de produtos do Facebook ao New York Times esta semana.

"A atual falta de aplicativos tem bastante a ver com questões técnicas e limitações da primeira versão do watchOS"

Uma interação com seu Apple Watch ou qualquer dispositivo vestível deveria levar quatro segundos, em média, de acordo com Sean White, CEO do BrightSky Labs, responsável pelo 10app, aplicativo que funciona como controle remoto para a sua GoPro.

"Eu diria que está cedo ainda para os desenvolvedores compreenderem o que significa criar uma interface para o usuário do relógio e cedo para que a Apple saiba o que fornecer em termos de infraestrutura", afirmou White ao Motherboard.

Um aplicativo do Apple Watch leva tanto tempo e grana para ser desenvolvido quanto um para iPhone, ou seja, pode custar de 10.000 a 50.000 dólares, dependendo da complexidade. Os desenvolvedores podem não estar prontos para investir em um aparelho tão novo e com um mercado tão pequeno — já na casa dos milhões, se o chutômetro estiver correto.

Publicidade

Desenvolvedores e consumidores também podem se sentir menos inclinados a aderir ao produto por causa de suas limitações: lentidão, restrições de design e o fato de que ele tem que ser emparelhado com um aplicativo de iPhone. Muito disso melhorará na segunda versão de seu sistema operacional mas, neste momento, a experiência nem sempre é das melhores.

Então o que seria preciso para termos mais aplicativos no Apple Watch? Faz sentido mesmo colocar aplicativos em um relógio? Para responder as dúvidas, conversamos com três desenvolvedores diferentes sobre como é trabalhar na criação de aplicativos que rodam em um dispositivo desconhecido, caro e minúsculo.

MOTHERBOARD: Você tem um Apple Watch?

Sean White [10app]: Estou usando o meu agora. Rola um relógio exclusivo para desenvolvedores. Se você ver na rua um modelo Sport com pulseira azul, possivelmente é um desses.

Pam Selle [aplicativo de segurança do lar, não-divulgado]: Não. Programo no Mac, mas não tenho um iPhone ou Apple Watch. Quis criar para eles porque muitas pessoas os usam.

Boris Bügling [Brew]: Sim. Uso-o para ver as notificações e controlar o aplicativo de música em meu celular. Estou satisfeito. É um produto de primeira geração bastante caprichado.

E qual sua opinião sobre ele?

Bügling: O maior problema até então é o funcionamento dos aplicativos de terceiros. Em comparação aos aplicativos da Apple, que rodam direto no relógio, os outros rodam no iPhone, e o relógio serve como display externo com algumas interações. Como a comunicação se dá por Bluetooth de baixa tensão, é lenta e nada confiável. Além disso, ela ocorre com cada pressionar de botão. Isso torna os aplicativos meio que inúteis, porque demoram demais para funcionarem ou serem utilizados. Isso deve ser resolvido em grande parte com o novo WatchOS 2 no outono, que permitirá aos desenvolvedores criarem aplicativos que rodarão direto no relógio, com o mesmo desempenho e usabilidade dos apps da Apple.

Publicidade

Quais os desafios de design exclusivos do Apple Watch?

Selle: Em linhas gerais, há uma dose alta de restrições no design da Apple, especialmente com o Apple Watch, que restringe como você pode dispor seu aplicativo. Tive que seguir uma série de regras bem rígidas quanto ao visual do app, o que foi bem complicado. Achei-o mais limitador que o iPhone. Simplesmente não podia colocar um botão onde quisesse. Haviam áreas em que poderia instalá-los. Além disso, o texto teria que ter um tamanho certo e estar em determina área. Tudo muito limitador.

White: É o tal "problema do dedo gordo". Se você coloca o dedo no relógio, cobre quase que 30% do espaço de interação. Este não é um problema específico do Apple Watch e sim de qualquer relógio. Por isso a coroa é usada como interface.

"Não é tão interativo assim"

Bügling: Espaço muito pequeno na tela e tempo limitado para interações já que não é muito conveniente ficar mexendo num relógio por muito tempo. Também há problemas com a inserção de dados, já que não há teclado e ditar não é algo que os usuários sempre queiram fazer. Falta de conectividade direta também é um desafio: ao passo em que o Apple Watch tem suporte à wi-fi e conectará a qualquer rede conhecida, ele precisa do iPhone para conexões móveis e para conectar a novas redes wi-fi pela primeira vez. Isso significa que é mais importante do que nunca pensar no uso offline de um aplicativo.

Publicidade

Por que não existem mais aplicativos fodas para o Apple Watch e, por outro lado, mais usuários?

White: Acredito que em parte isso ocorra porque as pessoas demoram a se acostumar com a interação com algo em seu pulso. Nos anos 90, as pessoas andavam com um celular, uma agenda eletrônica e algo para ouvir músicas. Eram três aparelhos diferentes que convergiram porque o espaço é limitado. Da mesma forma, você vê gente com FitBits e pulseiras e um telefone e um relógio. Minha noção é de que tudo converge. Vemos muitas evidências disso agora, no sentido de que as pessoas tiram o telefone do bolso cada vez menos. A promessa dos dispositivos vestíveis é que cada vez mais prestaremos atenção ao mundo que nos cerca.

Selle: Creio que a plataforma em si seja muito limitada. Fiquei bastante surpreso quando vi o tanto de trabalho que dava comunicar dados entre o aplicativo no celular e o Apple Watch. Era de se esperar que essa funcionalidade já estivesse ali de cara. Acho que os entusiastas e indies realmente ampliam a plataforma e fazem muita coisa bacana, mas levando em conta o trabalho exigido para se levar um aplicativo preexistente ao Apple Watch e suas limitações, não é tão interativo assim. É mais uma tela externa do seu celular. Se qualquer coisa mais importante acontecer, você terá que pegar o telefone. Isso impediu as pessoas de irem além mesmo. Talvez se o preço cair, vejamos mais coisas rolando. Um Pebble custa menos de 100 dólares, com código aberto e totalmente hackeável. Quando ocorre algo de interessante ou criativo, é no Pebble.

Publicidade

Bügling: Creio que um dos principais problemas é a experiência terrível com aplicativos de terceiros por conta de questões de desempenho. Isso faz com que muitos apps simplesmente não sejam viáveis porque os usuários não esperariam pelos constantes atrasos. Mas claro que há também o fator da base limitada. As pessoas não querem pagar por aplicativos em seus celulares, o que complica justificar o desenvolvimento para um mercado ainda menor. Penso que a atual falta de aplicativos tem mais a ver com questões técnicas e limitações da primeira versão do watchOS. Parece bem claro que a Apple focou nos aplicativos que já vem com ele, deixando uma solução meio cagada nas mãos dos desenvolvedores. Acho que a nova versão solucionará estes problemas.

Vocês acham que é uma boa interface para aplicativos?

Bügling: Os aplicativos que funcionam bem tem que estar realmente voltados para seus problemas, já que é bem chato mexer em um relógio por mais que um minuto. Isso é algo que a Apple reforça bastante em suas diretrizes. Alguns exemplos que creio funcionarem bem: TransitHopper, que mostra as principais conexões no trânsito próximas a você e que te levarão para casa rapidinho. Os aplicativos de música e a própria Apple TV também são legais. O aplicativo do Uber que permite chamar um carro com um único toque é outro bom. O que funciona melhor são essas interações rápidas, com poucas informações passadas num piscar de olhos.

Publicidade

"Quando ocorre algo de interessante ou criativo, é no Pebble"

White: Sim. Mas não creio que, da mesma forma que você nunca meteria o iMovie no celular, deveria pegar um aplicativo iOS e meter no relógio. Muitos desses aparelhos vestíveis são feitos para serem micro-interações, coisas que levam segundos por vez. Você não vai parar ali e assistir 15 filmes no seu relógio.

Selle: Minha opinião pessoal é que não. É um lance da Apple, então as pessoas vão tentar tirar o melhor dali e fazer coisas interessantes com ele… Mas quando dei uma olhada nele, ao menos na sua primeira versão, me parecia mesmo um monitor externo para celular, o que não é lá muito atraente. Quando penso no futuro, não penso nisso.

As entrevistas foram resumidas e editadas para fins de clareza. As entrevistas com White e Selle ocorreram por telefone, já a com Bügling foi realizada via email.

Tradução: Thiago "Índio" Silva