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Tecnologia

Como Preparar o Café da Manhã com a Sua Vagina

Mas não é só porque dá pra fazer que nós recomendamos que você faça.
Iogurte feito com secreções vaginais se parece muito com o popular iogurte caseiro, como esse da foto. via mellowynk/Flickr

A ideia surgiu quando uma amiga e eu conversávamos sobre as propriedades probióticas da vagina. "Por que existe um livro cheio de receitas feitas com porra e NADINHA no Google sobre cultivar líquido vaginal?", ela escreveu em uma mensagem para mim e algumas outras amigas.

Logo, sob o olhar reprovador do espírito de Julia Child, ela pegou uma colher, uma panela, um termômetro para doces e deu início a jornada para fazer iogurte a partir da sua vagina – o que há de mais radical em termos de culinária local.

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Cecilia Westbrook além de ser amiga pessoal minha, é médica/estudante de PhD da Universidade do Wisconsin. Já tínhamos feito piadas sobre a possibilidade de fazer iogurte a partir de secreções vaginais – piadas previsíveis sobre os benefícios dietéticos de se comer buceta, sobre chamar o produto de 'Queefer' [queef' é como os americanos chamam o barulho feito pelo ar ao sair da vagina] – mas então foi feita uma rápida busca no Google e: nada. Nem mesmo na literatura médica. A curiosidade bateu forte, e Westbrook se dedicou a pesquisar a coisa seriamente. Que escolha ela teria se não experimentar consigo mesma?

Toda vagina é lar de centenas de diferentes tipos de bactéria e organismos. Estes organismos – conhecidos como comunidade vaginal – produzem ácido lático, peróxido de hidrogênio e demais substâncias que mantém a vagina saudável. A bactéria dominante chama-se lactobacilo, que por acaso é a mesma utilizada na fabricação de leite, queijo e iogurte.

Mas Westbrook não fez seu próprio iogurte só pra poder fazer piadas incríveis. E certamente não foi porque ela estava com fome. Ela conhecia o bastante a química vaginal para saber que comer um tanto de iogurte feito a partir de seus sucos-de-mulher lhe faria bem. Sério.

Sua primeira fornada de iogurte tinha um gosto azedo, pungente, e que quase formigava na língua. Ela o comparou a iogurte indiano, e comeu-o com alguns mirtilos.

A razão eram bactérias probióticas que, quando ingeridas, podem ajudar a manter nossos intestinos saudáveis. Você com certeza já viu anúncios de iogurtes que supostamente fazem bem para sua digestão. Mas existem probióticos específicos para a vagina à venda também, que afirmam mantê-la saudável ao certificar que existam mais das "boas" bactérias do que das ruins lá embaixo.

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"Você pode consumir probióticos oralmente e estas bactérias podem parar na sua vagina", disse Larry Forney, microbiólogo da Universidade de Idaho. "Assim sendo, a ideia toda de comer iogurte para tratar da vagina te faz pensar 'Espera, tem alguma coisa errada com o encanamento aqui?', mas de alguma forma a coisa funciona."

Teoricamente, ao menos. E o que poderia ser mais saudável do que retirar bactérias saudáveis da sua vagina, pensou Westbrook, e cultivar mais para ingerir posteriormente?

O "método de retirada" destas bactérias foi feito com uma colher de madeira. Ela determinou um controle positivo (feito com iogurte comprado mesmo como a cultura inicial) e um controle negativo (leite comum sem nenhum aditivo), e combinou seu ingrediente caseiro na terceira fornada de iogurte. Da noite para o dia, a mágica por trás da biologia rendeu uma tigela de responsa.

Sua primeira fornada de iogurte tinha um gosto azedo, pungente, e que quase formigava na língua. Ela o comparou a iogurte indiano, e comeu-o com alguns mirtilos.

Acabou que, no fim das contas, essa não é a melhor das ideias.

De acordo com Forney, "quando você pega secreções vaginais, não coleta só os lactobacilos. Você está pegando tudo". E é possível que, de um dia para o outro, ou de mulher para mulher, "o que você está usando no seu iogurte não seja mais dominado pelos lactobacilos e sim outra bactéria, as quais poderiam ser patogênicas", explicou.

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Por vezes este desequilíbrio pode causar infecções fúngicas e outras coisinhas desagradáveis. Você não vai querer estes organismos no seu café da manhã. Até mesmo uma vagina saudável abriga organismos que podem ser problemáticos.

"É uma péssima ideia em linhas gerais", disse Forney. "Mas há um elemento aí que contem algum apelo: ela está usando bactérias da sua própria vagina."

Já que cada mulher tem um equilíbrio diferente entre bactérias e lactobacilos, os probióticos vaginais podem ter uma utilidade questionável. Agora se uma empresa ou universidade desenvolvessem probióticos personalizados para a flora microbial de cada vagina, seria bem mais eficaz do que o que encontramos no supermercado hoje, explicou Forney.

Os benefícios a saúde de ingerir seus próprios probióticos talvez não tenham sido tão diretos quanto Westbrook esperava, mas ao menos seu plano teve algum mérito. "Gosto do que ela faz em termos de princípios, mas é arriscado porque ela não sabe bem o que está fazendo e poderia acabar com um produto ruim", disse Forney.

O órgão responsável por alimentos e medicamentos dos EUA, a FDA, concorda. De acordo com Theresa Eisenman, assessora de imprensa do Centro de Segurança Alimentar e Nutrição Aplicada da FDA, "secreções vaginais não são consideradas 'alimento' e podem transmitir doenças humanas, um produto alimentício que contem secreções vaginais ou demais fluidos corporais é tido como adulterado".

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Em outras palavras, assim como leite cru e alguns queijos fedorentos, você não encontrará o "Iogurte grego da Ceci" à venda logo.

Westbrook já tinha feito sua segunda fornada de iogurte ao saber que ninguém deveria usar coisas da sua vagina para fazer iogurte. Mas apesar da desaprovação de todos, de Forney à FDA, ela está bem. E não fará mais isso.

"De certa forma, é tão óbvio. Tipo, claro que você pode fazer iogurte com base na sua flora natural. Mas quem faria isso?", disse Westbrook. "É claro que a feminista dentro de mim quer falar algo sobre como há beleza no ato de ligar seu corpo ao que você come e explorar os poderes que a vagina tem. Parte disso é um lance meio hippie místico e tal, mas também tem a ver com se sentir à vontade com seu próprio corpo, especialmente em uma cultura que parece tão desconfortável com o corpo feminino."

Independente disso, Westbrook disse que sua segunda fornada estava ainda mais azeda, semelhante ao gosto de leite quase estragado – prova de que, infelizmente, comer iogurte feito com secreções vaginais não é o mesmo que comer buceta de verdade.

Tradução: Thiago "Índio" Silva