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Tecnologia

A História do Beagle 2, o Rover Marciano que Enfim Foi Reencontrado

Anos após seu lançamento e um ano após a morte de seu criador, o módulo foi visto novamente.
​Sim, é ele. Créditos: NASA/JPL/Universidade do Arizona

​O Natal de 2003 deveria ter sido um dos dias mais felizes da vida de Colin Pillinger. Era quando o Beagle 2, veículo espacial que ele concebeu, propôs e desenvolveu, deveria ter pousado em Marte. Mas o Beagle 2 nunca contatou a Terra; o horário agendado para o pouso passou, e o módulo de aterrissagem não enviou mensagem nem usou telemetria para confirmar o que aconteceu. Mais de 12 anos depois — infelizmente, um ano após a morte de Pillinger —, a NASA encontrou o Beagle 2.

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A câmera HiRISE, do orbitador de reconhecimento de Marte da NASA, é uma máquina incrível de alta resolução, muito potente, responsável por algumas das fotos mais impressionantes e detalhadas de Marte que temos. Ela não só encontrou vestígios do Beagle 2 em Isidis Planitia, como parece que o Beagle 2 chegou a pousar com êxito.

O módulo de aterrissagem do Beagle 2, da Agência Espacial Europeia (ESA), fazia parte do programa Mars Express; o Beagle original, evidentemente, era o navio que levou Charles Darwin às Ilhas Galápagos. O rover — uma tigela rasa de 65 centímetros de diâmetro e 25 de profundidade — estava munido de instrumentos que buscariam vida em Marte por meio de análises geoquímicas e atmosféricas: um par de câmeras estéreo, espectômetros, um microscópio e uma toupeira mecânica projetada para perfurar o solo do planeta.

O Beagle 2 foi projetado com um braço robótico que abrigava uma série de instrumentos científicos. Créditos: NASA

Para chegar ao local de aterrissagem, em Isidis Planitia, um território de baixa altitude que daria vazão para uma frenagem aerodinâmica vigorosa, o plano era usar tecnologias testadas e aprovadas. Um escudo protegeria o Beagle 2 do calor escaldante ao entrar na atmosfera e depois se soltaria do rover, ao passo que um pára-quedas estabilizador deveria se abrir, puxando o principal pára-quedas em seguida. A 160 metros da superfície, airbags seriam acionados ao redor do módulo, como um casulo. Assim que o rover atingisse o solo, o pára-quedas se separaria dele. O Beagle 2, então, quicaria e rolaria até parar, e se ajeitaria com o auxílio de sua tampa articulada; independente da configuração da aterrissagem, a abertura da tampa ajeitaria o rover.

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Mas a empreitada do Beagle 2 assumiu riscos. O pára-quedas do rover foi desenvolvido em apenas 15 semanas, e apenas dois modelos foram fabricados, um para o vôo e outro para testes no deserto do Arizona. O segundo modelo passou por uma série de testes de queda, reboque e extração, mas nenhuma das provas simulou as condições atmosféricas de Marte.

Os airbags construídos para acomodar o Beagle 2 em um casulo de segurança passaram por apenas um teste. As almofadas infladas foram jogadas sobre uma superfície chata, diferente das condições que provavelmente encontrariam em Marte. Em comparação, os airbags que a NASA usou nos rovers marcianos Spirit e Opportunitypassaram por centenas de testes em superfícies variadas, em diversos ângulos.

Uma questão mais problemática ainda, talvez, do que os testes limitados foi a falta de contato com o Beagle 2 durante a aterrissagem. O último contato que a ESA travou com o veículo foi no dia 19 de dezembro, quando ele se separou do orbitador Mars Express. O rover estava em boa forma, parecia pronto para o pouso. Então, chegou a hora de fazer contato com ele na superfície de Marte, e os computadores terrestres não sintonizaram nada além de silêncio.

Tentativas para encontrar o Beagle 2, ou seus restos, com imagens orbitais da área de aterrisagem só vingaram agora, anos depois. A área destinada para pouso media 169 X 100 quilômetros, um território considerável para cobrir. O porte pequeno do rover também complicou a tarefa. Enxergá-lo em imagens orbitais foi extremamente difícil, mas não impossível.

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A imagem da câmera HiRISE, do dia 29 de junho de 2014. Créditos: NASA/JPL/Universidade do Arizona

A indicação inicial de que o Beagle 2 fora encontrado veio das fotos da HiRISE tiradas nos dias 28 de fevereiro de 2013 e 29 de junho de 2014. Michael Croon, antigo membro da equipe de operações do programa Mars Express, da ESA, avistou um bom candidato para Beagle 2 no canto de uma imagem e enviou um pedido ao programa público de buscas para fotografarem o local novamente.

Imagens subsequentes mostraram um ponto brilhante se movendo, indício que só é visível à medida que o ângulo do Sol sobre os painéis solares muda, dependendo do horário, dia e época do ano. Sinais que aparentam ser o pára-quedas e a tampa da porção traseira do rover também foram encontrados na região.

Segundo as imagens, parece que o Beagle 2 não concluiu a preparação de pouso, o que explicaria por que ele nunca enviou sinais à Terra depois de chegar à superfície; os painéis solares do módulo de aterrissagem deveriam estar devidamente instalados para que a antena funcionasse. Ou talvez alguns painéis solares não estejam refletindo a luz como outros por estarem posicionados em um ângulo específico. A equipe da HiRISE terá que aguardar as próximas imagens para confirmar exatamente o estado atual do Beagle 2.

Encontrar um rover perdido em Marte é incrível, mas infelizmente não responde a pergunta sobre o que aconteceu com o Beagle 2. A falha dos airbags ainda é uma possibilidade, causando danos significativos por conta de uma aterrissagem bruta. O rover pode ter sucumbido à falhas elétricas ou mecânicas — não faltavam partes articuladas no veículo. Qualquer funcionamento defeituoso poderia ter engatilhado uma cadeia de estragos.

Talvez só saberemos a história do Beagle 2 quando enviarmos astronautas para checar de perto. Mas, de qualquer forma, encontrar o rover aparentemente intacto é uma evolução amarga e vitoriosa. Encontramos a espaçonave, e descobrimos que quase funcionou!