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Politică

Cidadania e voto. O que pensam os jovens portugueses da política?

Falámos com oito embaixadores do Festival Política, para tentar perceber até que ponto o universo político pode encontrar na juventude uma forma de se reinventar.
(Da esq. para a dir.) Saliu, Sofia e Vicente, são três dos embaixadores da segunda edição do Festival Política.

A segunda edição do Festival Política, que se realiza de 19 a 22 de Abril, no Cinema São Jorge, em Lisboa, abre com um debate em forma de pergunta: “A justiça é racista?”. Na sala 2 do espaço lisboeta vão, assim, esgrimir-se argumentos sobre um dos temas que tem marcado o ano politico, pela voz e acção dos colectivos activistas afro-descendentes, num país em ambiente pós-colonial.

E a política serve para isto mesmo, discutir e questionar o espaço público sobre os direitos que temos e aqueles que ainda faltam cumprir. Que direitos? Pergunta, pois, o Festival Política. A resposta pretende ser dada entre debates, sessões de cinema, mostra de arte e festas temáticas. Do ano passado mantém-se na programação o momento e a oportunidade de os visitantes poderem estar cara-a-cara com os deputados eleitos na Assembleia da República.

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Vê: "VICE Special Report: Uma Casa Dividida"


Haverá também música clássica e mais popular e também aquela que nos faz repensar as fronteiras do que se pode conseguir politicamente através da arte. Afinal, todas as manifestações sociais servem para nos ajudar a pensar politicamente aquilo que é o espaço público.

A VICE convidou os embaixadores e embaixadoras do Festival Política para responderem a algumas questões e reflectirem sobre o papel da política na actualidade.

João Silva Jordão, 30 anos, activista, jornalista e doutorando em Urbanismo, vice-presidente da Associação Família de Refugiados e fundador do blog Casa das Aranhas

Foto cortesia Festival Política

VICE: Olá João! De que forma a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

João Silva Jordão: O termo "política" é, por definição, a arena sob a qual se discutem os assuntos da sociedade (ou da cidade, se formos ao termo original).

Achas que os jovens se têm vindo a desligar da política e da participação activa na cidadania? Porquê?

Normalmente, a alienação política (o desligar-se da política) é visto como sendo um acto de estupidez. Obviamente, mais participação seria, em geral, uma coisa boa. Mas, eu tento compreender o que faz com que as pessoas o façam. Conheço imensas pessoas muito inteligentes que não votam e penso que algumas delas há muito perceberam que a maioria das decisões que afectam a nossa vida não acontecem no Parlamento, que não as podemos afectar assim tanto com o poder do voto.

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A subida da abstenção está, para mim, directamente ligada com a transferência do poder para grupos secretos e agentes privados. Digo isto, relativamente ao voto. Já o desligarem-se da cidadania, isso sim é um factor muito negativo, demonstra algum cinismo e, por vezes, preguiça e individualismo. Mas, também é o resultado natural de como a nossa "democracia" é construída. Dizem-nos que podemos e devemos afunilar toda a nossa vontade política para o voto e que, assim, podemos mudar o Mundo e é mentira. E todos sabem que é mentira.

A sobrevivência de quase todos os sistemas políticos, infelizmente, depende da alienação e da estupidificação das pessoas. É preciso parar de culpar somente, por exemplo, os jovens, e começar a identificar os programas de engenharia social que fazem com que eles tenham tendência a afastar-se. Nos nossos tempos, a indústria que visa distrair as pessoas é imensa e muito eficaz.

Em Portugal, como noutros países da Europa, sabemos que a abstenção dos jovens nos actos eleitorais é alta, embora seja complicado encontrar dados completamente claros. Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar?

Eu, sinceramente, não vou ser aquele que vai dizer a um jovem "vai votar, porque assim vais mudar o Mundo". Seria desonesto. Eu voto. Mas, percebo quem não o faz. Muitas pessoas sentem-se traídas, sabem que as promessas eleitorais não são cumpridas. Que o seu voto muitas vezes vai alimentar projectos de vaidades, vai aumentar egos e que não vamos ter influência real sobre aqueles que elegemos.

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Penso que, antes disso, temos de mudar o sistema, como por exemplo fazer com que uma pessoa possa retirar o seu voto e, eventualmente, fazer com que sejam retirados os mandatos àqueles em quem votámos, se essa pessoa se sentir traída, sentir que o seu voto foi errado. É ridículo pensar que meter uma cruzinha numa caixinha, de quatro em quatro anos, faz com que haja democracia e transparência. A "democracia" representativa é insuficiente. Temos que apronfundar a democracia e fazer com que funcione de uma maneira mais séria antes de apontarmos o dedo à abstenção.

Corroboras daquela crença popular institucionalizada de que os políticos são todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

Todos não, mas a maioria sim, sem dúvida absolutamente nenhuma. O povo quando diz isso, pode estar a exagerar ligeiramente, mas não está muito longe da verdade. Olhem o caso mais recente da Lusoponte. Um gajo que é ministro, concessiona a ponte quando era ministro, depois vai trabalhar para a empresa que ganhou com isso depois quando o seu mandato acaba. Não há vergonha mesmo nenhuma. Quando as pessoas dizem "os políticos são uns ladrões", é a sabedoria popular a falar. Têm razão.

Ana Teresa Moura, 19 anos, frequenta a licenciatura em Relações Públicas e Comunicação Empresarial

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Ana Teresa Moura: A política pode mudar as sociedades, tal como podemos observar na história das nações. As diferenças políticas que se podem verificar entre países demonstram que um Estado é modelado pela sua história política que por sua vez é modelada e modeladora da sociedade. Mas será que só a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades ou poderão as sociedades mudar a política?

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Achas que os jovens se desligam da política e da participação cidadã? Porquê?

Enquanto jovem posso afirmar que uma das razões é a fraca aposta na integração dos jovens. A política deveria fazer parte da educação de todos os jovens. Ao invés de os desmotivarem fazendo-os pensar que “os políticos são todos iguais”, deveriam explicar-lhes a história toda para que, conhecendo a história, possam participar no futuro, ser parte integrante da sociedade em que se inserem.

Eu tive a sorte de fazer parte de uma família que se interessa por política e por ser participativa, no entanto, a grande maioria dos meus amigos e das pessoas com quem me relaciono não têm essa sorte. Por essa razão, penso que nos deveriam ser fornecidas mais ferramentas, através de projectos escolares, por exemplo, para que pudéssemos pensar a política de outra forma.

A abstenção dos jovens nos actos eleitorais, em Portugal, como noutros países da Europa é preocupante. Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar?

Com toda a informação que temos actualmente, não me parece que alterar esse estado de coisas passe por mudanças a nível de informação, mas sim por impulsionar mudanças comportamentais. Talvez se existisse uma maior participação dos jovens nas juventudes partidárias. Fazer-nos entender que há futuro para nós e que esse futuro passa pela nossa participação agora.

Já pensaste em seguir uma carreira política?

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Sim, já. O ano passado frequentei a Licenciatura em Relações Internacionais, no ISCSP. Pensava que queria ser política. Mas, descobri que quero ser Relações Públicas. Talvez um dia tenha um projecto que me permita trabalhar a questão da abstenção e pensar uma solução ao nível da comunicação.

Os políticos são mesmo todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

Infelizmente, penso que sim. Não o vejo como um fatalismo, mas como uma necessidade de mudança da sociedade para que a política seja um meio mais aberto e não tão elitista.

Saliu Djau, 23 anos, natural da Guiné Bissau, finalista da licenciatura em Relações Internacionais no ISCSP da Universidade de Lisboa, voluntário da Cruz Vermelha Portuguesa através da Delegação da Amadora, co-fundador da Tabital, associação sócio-cultural que trabalha para a integração de migrantes, especialmente, oriundos da África Ocidental

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma achas que a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Saliu Djau: Através de políticas públicas mais justas e inclusivas. Na formulação das políticas públicas tem que se ter sempre em conta as necessidades e os problemas dos cidadãos, por mais pequeninas que sejam essas questões. Os governos têm que ter a flexibilidade suficiente para resolver, de forma justa, as situações que vão surgindo e que não eram esperadas. Nesse processo, o activismo político é importante, porque acaba por criar uma relação de proximidade entre os cidadãos e os policy makers.

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Achas que os jovens se desligam da política e da participação cidadã? Porquê?

Muitos jovens, infelizmente, perderam confiança nas instituições e nas pessoas que escolhem para os representar e proteger os seus direitos. As abstenções traduzem esses sentimentos claramente. Os políticos têm que repensar a maneira como fazem a política.

Como podemos pensar politicamente para alterar, por exemplo, a situação de falta de pleno cumprimento dos direitos humanos?

Os direitos humanos têm que ser a base indiscutivel na formulão de políticas. A protecção dos direitos humanas não é só responsabilidade dos políticos, mas também de qualquer indivíduo. Qualquer pessoa deve, nas suas acções, ter sempre em conta os direitos humanos, assim como os nossos dirigentes os devem considerar nas suas tomadas de decisão. Os direitos humanos estão sempre presentes, assistem-nos como pessoas humanas.

Os jovens são frequentemente acusados de não quererem saber de política. Porque é que achas que isso acontece e como é que se pode mudar essa perspectiva?

Como já referi, é falta de confiança e desilusão. Os nossos líderes não têm sido bons “modelos”, mostram-se ineficientes e incapazes de tomar decisões em certos momentos e quando pressionados, tomam decisões mal improvisadas. Para mudar isso, os políticos, os nossos lideres, têm que saber aproximar-se dos cidadãos e reconquistar confiança. E claro, devem cumprir os seus deveres com transparência e honestidade.

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Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar e a não alinharem no lado da abstenção?

Eu diria que votar é a melhor arma que temos até agora. É a melhor forma de nos expressarmos e exigirmos mudanças. É a melhor maneira de lembrarmos aos nossos líderes políticos que o poder pertence ao povo e que, quem estiver na sede do poder para não defender o interesse do povo não merece a nossa confiança, tomamos o poder de volta.

Já pensaste em seguir uma carreira política?

Não penso nisso. E ainda bem que há varias formas de contribuir para a construção de boas comunidades e sociedades democráticas mais justas.

Os políticos são mesmo todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

Claro que não. Mas, quando vivemos constantemente com situações em que os políticos se envolvem em corrupções e processos escandalosos, fica difícil separar os bons dos maus. Contudo, acredito que não sejam todos “ladrões”.

Vicente Costa Alves, 19 anos, estudante de Ciência Política e Relações Internacionais e activista, ex-coordenador do grupo de estudantes da Amnistia Internacional da NOVA, observou de perto a situação dos refugiados, tanto em Portugal como na Grécia e trabalha agora com o programa Erasmus+ e mobilidade para jovens

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma pode a política mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Vicente Costa Alves: De todas as formas possíveis e imaginárias. Tudo é política. Da interação entre pai e filho ao voto, o Homem tem sempre a preocupação da “política”, aquilo que é público. A política é também um mecanismo de reflexo de colectivos. Sem ela, o Homem, animal social, está derradeiramente sozinho nas suas aspirações e necessidades. É assim que a política muda o nosso contexto e é mudado por ele, alterando e sendo alterada pelas comunidades e sociedades. Sem política, não há progresso. Sem política, não há voz. Sem política, não há diálogo. Sem política, não há Homem.

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Achas que os jovens se têm vindo a desligar da política e da participação cidadã?

A nossa preocupação em “tirar o curso”, encontrar emprego, arranjar uma casa, agravada por um contexto sócio-económico desfavorável, tira espaço para reflectirmos sobre a maneira de nos organizarmos, como nos expressamos, como nos fazemos ouvir. A sobrecarga das chamadas “ciências exactas”, aliada ao bicho-papão do emprego tira aos jovens a motivação para um interessa pela política ou pela participação cívica.

Para além disso, não posso deixar de referir, sem sombra de dúvida, que o descrédito da política tem subido exponencialmente ao longo dos anos. Claro que não é um rótulo sem culpa: gerações de políticos velhos, maioritariamente homens brancos, tira a motivação a qualquer jovem que neles não consegue encontrar um modelo a seguir, ou um camarada de luta. Para uma criança, um herói não é nada mais que uma motivação. Uma motivação para construir e fortalecer certos ideias para nos tornarmos alguém. Sem um herói, sem alguém que se aproxime de nós como é que querem que nós nos aproximemos de alguma coisa, com interesse e convicção?

Como é que vês por exemplo que a política pode contribuir para questões como o cumprimento pleno dos Direitos Humanos?

Os Direitos Humanos são talvez a questão mais sensível da política nacional e internacional, isto porque partem de um pressuposto Ocidental, estabelecido há quase 100 anos, num contexto pós-guerra nunca mais sentido. Ora, esperar que uma sociedade totalmente alienada do sofrimento do Holocausto e embalada num conforto material excessivo lute por direitos não palpáveis e idealistas, é algo praticamente impossível num mundo plural, repleto de diferentes línguas, culturas, religiões e maneiras de viver.

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Os Direitos Humanos são verdadeiramente a nova Torre de Babel. Ao procurarmos fazê-la crescer cada vez mais alto, mostrámos o defeito dos seus alicerces e com isso sofremos. A Primavera Árabe é o mais forte exemplo de que há memória recente – ao forçar a revolução de uma sociedade não-ocidental, com base numa com valores totalmente determinados pelo Ocidente, destruímos o progresso que tal sociedade tinha já feito para alcançar o SEU ideal de organização e direitos. É a partir desta ideia que devemos repensar politicamente a situação dos Direitos Humanos à escala global: não podemos forçar os outros a pensar como nós. Precisamos, ao invés, de os ensinar a pensar como nós, ou, numa perspetiva mais acertada, a pensar no que lhes podemos oferecer.

Todos pensamos de maneiras diferentes, mas também todos possuímos mecanismos para fazer os outros pensar. Aqui está a solução: que se debata, que se fale e que se escreva, que se grite e que se arranhe, mas que não se force. Porque forçar um direito é talvez a ideia mais bizarra da nossa geração.

Achas justa a acusação de que os jovens não querem saber de política? Como é que essa perspectiva pode ser alterada?

Essa acusação é revestida por um manto de hipocrisia e indiferença, partindo dos mais velhos que esqueceram o seu papel de garantes da continuação do espírito de participação política da sua geração. Em termos práticos, essa mudança de mentalidade parte de mudanças estruturais, por quotas e meios de abertura democrática, dos órgãos representativos e decisórios, de maneira a incluir representantes de todas as gerações, sem diferenciação de classe, género ou etnia. Sem um exemplo para o qual olhar, desmotivamos os jovens de participar num sistema no qual já dificilmente acreditam.

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Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar?

Em primeiro lugar, cabe à sociedade dar aos jovens as ferramentas e a possibilidade de votar antes de os tentar convencer. Para compreender como combater a abstenção devemos primeiro observar as suas razões estruturais: grande parte dos jovens vive fora da sua área de eleitor, quando estudam ou trabalham e estão pouco disponíveis para se deslocarem e investirem numa viagem de fim-de-semana para votar.

Para além desta primeira razão, facilmente combatida com medidas que facilitem o voto on-line, ou o voto à distância, noutras áreas de eleitor, os jovens são também desincentivados de votar por campanhas pouco apelativas, programas de difícil compreensão e sem fácil acesso por parte de um clássico "jovem preguiçoso e desinteressado", como alguns os rotulam.

Para convencer as pessoas da minha idade a votar é necessário primeiro facilitar-lhes a vida. Os programas precisam de uma linguagem simples e compreensível, os partidos têm de abandonar os cartazes sobre estacas e chegar às “internetes”, às ruas e aos cafés, onde os jovens esperam alguém que também queira ouvir a sua opinião.

Já pensaste em seguir uma carreira política?

Já e até fui além do pensamento. Mas, ao ingressar na política activa, por via de partidos e juventudes partidárias, reparei que em Portugal, infelizmente, tudo se baseia na política do “tacho”.

Achas que os políticos são mesmo todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

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Não. No entanto, a corrupção na política é uma realidade que, para além de ser mediaticamente visível, é também uma demonstração do carácter que define a maioria dos portugueses, para transtorno de alguns e negação de outros. Os políticos não são todos uns “ladrões e trafulhas”, mas o sistema no qual participam é definido por regras de "ladrão e trafulha", a mando de uma elite que, escondida por detrás dos grandes escândalos, com a imprensa nas mãos, controla tanto a opinião pública que determina os actores deste sistema, como também as possibilidades que estes têm quando chegam ao poder.

Jéssica Aleixo, 20 anos, está no primeiro ano de licenciatura em Estudos Africanos

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma pensas que a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Jéssica Aleixo: A política é essencial no nosso dia-a-dia, em todos os contextos. A política pode melhorar a nossa qualidade de vida, não se restringe apenas a uma sociedade, mas sim globalmente. É importante haver uma organização entre as comunidades e a política possibilita isso, apesar de ser difícil de alcançar.

Achas que os jovens se têm desligado da política e da participação cidadã?

Os jovens desligam-se da política, essencialmente devido à educação. A meu ver, quando há desde o início uma base sobre este assunto, nomeadamente em casa, existe logo um interesse por parte dos jovens, pois são confrontados directamente com o assunto num ambiente que lhes é confortável. Contudo, acho também que a educação a nível escolar é fundamental para o interesse dos jovens, aliás a junção das duas é imprescindível! Actualmente a maioria dos jovens não tem interesse devido a estes dois factores, pois são influenciados negativamente de acordo com os estímulos que lhes são dados no quotidiano (redes sociais, entre outros…).

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Então, como é que se pode alterar a perspectiva de que os jovens não querem saber de política?

Não podemos generalizar. Do meu ponto de vista, não são só os jovens que não querem saber, mas também pessoas de outras faixas etárias. Essa visão existe actualmente, pois são os jovens que têm a capacidade para demonstrar os seus desejos por um futuro melhor, visto que é o futuro dos mesmos que está em causa. Esta perspectiva só mudará quando realmente existir uma “porta” que olhe para os jovens que estão a lutar por esse futuro, lutando pelas resoluções dos problemas actuais, mesmo que não sejam directamente relacionados com eles.

Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar e a não ficarem do lado da abstenção?

Acho que essa atitude em relação ao poder de voto, tem muito a ver com o desinteresse pela política e por existir o pensamento de que “não é o meu voto que irá mudar alguma coisa”. Eu optaria por uma abordagem honesta com os jovens, mostrando-lhes como está o Mundo actualmente e os problemas que enfrentamos, referindo essencialmente que, se ninguém fizer nada por achar que não irá fazer a diferença, então nunca avançamos.

Pensas que os políticos são mesmo todos uns "ladrões e uns trafulhas", como é comum dizer-se?

Não podemos generalizar, existem pessoas honestas e não honestas em todo o lado. Contudo, ao olharmos para a actualidade, apercebemo-nos que existe muita corrupção, levada a cabo essencialmente por políticos. Não digo que todos sejam uns “ladrões e trafulhas”, mas na minha opinião é difícil encontrar alguém honesto no meio político, apesar de não podemos “condenar” ninguém sem provas em contrário.

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Sofia Canteiro, 20 anos, está a tirar a licenciatura em Relações Internacionais, é membro do Núcleo Académico para a Protecção Ambiental do ISCSP-UL

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma pensas que a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Sofia Canteiro: A política é para a sociedade um garante da ordem e da logística do funcionamento de um Estado. A política é o coração da sociedade, moldando todas as acções e reacções, tanto dos seus dirigentes como da sua população. Encontramo-la em todos os cantos de um Estado ou de uma comunidade, tudo é política. As medidas certas podem elevar uma sociedade de modo a atingir um nível de vida melhorado, as erradas podem destruir um povo. Se fosse um objecto viria numa caixa e diria “Fragile. Handle With Care”.

Achas que os jovens se desligam da política e da participação cidadã? Porquê?

Julgo que existe um grande sentimento de impotência perante o actual sistema político, económico e social. Pessoalmente, tenho dias em que o sentimento é tão avassalador que não consigo impedir de me sentir frustrada e de pensar que não vou conseguir fazer uma mudança significativa. Isso pode ser um dos motivos.

Mas, outro ponto essencial é a falta de informação, de informação sem floreados, sobre como é a política em Portugal. Parece existir uma quantidade gigante de jovens que não se interessa, ou se desliga, porque é tudo tão complicado e as lutas partidárias pelo poder parecem tão confusas e instáveis, que é o suficiente para os afastar. Apesar de vivermos num Mundo onde nunca foi tão fácil obter informação, o conformismo instalou-se porque também na comunicação social, inconscientemente (ou não), lados são tomados e é mais fácil aceitar uma opinião moderada já formada, do que pensar e analisar a vida política.

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Como é que se podemos pensar politicamente sobre problemas como o dos Direitos Humanos, por exemplo?

Acho que a única maneira é a intervenção em massa. Numa altura em que os interesses políticos e as instituições internacionais têm tanto poder, uma iniciativa comandada por apenas uma pessoa ou um grupo restrito não basta. É preciso haver uma consciência colectiva para os problemas globais. Não basta assinar uma petição, a participação activa é essencial.

A abstenção jovem preocupa-te? Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar?

Como mulher, o direito ao voto é algo que ainda está muito fresco como um momento histórico, pelo que tomo o acto de votar como algo poderosíssimo. Apesar do sentimento de impotência que pode surgir de tempos a tempos, o facto de vivermos numa democracia onde o nosso voto importa, é muito importante pois mostramos em primeira mão a nossa vontade política. A participação é importante pois a falta dela pode levar ao surgimento de extremismos, ou ao aparecimento de opiniões morais que estavam (ou achávamos nós) enterradas no passado.

Já pensaste em seguir uma carreira política?

Já, mas agora não é algo que queira. Não que saiba objectivamente o que quero fazer, nesse aspecto continuo às escuras, mas acho que não me sentiria realizada a trabalhar num sistema com que não concordo, com todas as suas burocracias e a constante análise da opinião pública e da sociedade civil.

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Concordas com a crença popular de que os políticos são mesmo todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

Acredito que não. Há muita gente com boas intenções e vontade de fazer mudanças positivas na política, de servir a sociedade e não os seus próprios interesses. Temo é pela corrupção que está entranhada na política desde há muito tempo, mas mantenho uma atitude positiva no que toca aos novos políticos. É uma geração diferente, com interesses diferentes.

Marcelo Yamada, 21 anos, imigrante nipo-brasileiro em Portugal, activista da Academia Cidadã nas áreas do ambientalismo, questões LGBTI+, gentrificação e cidadania activa juvenil e é estudante de Relações Internacionais

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma entendes que a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Marcelo Yamada: A política é a forma como um determinado conjunto de pessoas, organizações e outras entidades tentam alcançar um consenso sobre decisões colectivas e vinculativas e cujos temas dizem respeito a todos os intervenientes, num contexto de jogo de interesses. Por outras palavras, política poderia ser definida através da metáfora da competição de influências: aqueles que têm uma maior capacidade de influenciar as decisões, acabam por vencer em nome dos próprios interesses.

Dada a minha definição, digo que a política é a linha orientadora, é o que dá forma e enquadra uma comunidade dentro de um quadro de regras e leis que devem ser respeitada por todos os seus membros. É da política que saem todas as decisões e as linhas orientadoras do rumo que a sociedade deve tomar, assim, é necessário que todas as comunidades representadas tenham a sua voz ouvida neste processo de tomada de decisão, de modo a verem os seus direitos respeitados. Não acho que seja a política a mudar a vida das comunidades. Acho que é a própria sociedade que se muda a si própria através da política, um processo de decisão colectiva, na qual todas as comunidades representadas deveriam participar na defesa dos seus interesses.

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Achas que os jovens se têm vindo a desligar da política e da participação cidadã?

Os jovens desligam-se da política por influência da sociedade em que vivem. Sociedade esta em que os indivíduos não se demonstram interessados em exercer o seu papel de cidadãos activos no processo de decisão colectiva; e em que muitos mal sabem o significado de política.

Como é que se pode mudar essa perspectiva?

De modo geral, a maioria dos indivíduos perderam a confiança na política. Os jovens são uma consequência deste fenómeno, visto que, apesar de representarem o futuro, são bastante influenciados pelos exemplos e ensinamentos que recebem em casa. Um dos factores mais relevantes para esta perda de credibilidade é o facto de pairar na sociedade a má interpretação do que é política. Para a grande maioria, política não passa de partidos e eleições. Assim, muitos pensam que os parlamentares não cumprem a função de os representar na luta pela melhoria das suas condições de vida.

É engraçado observar esta característica das democracias ocidentais, em que muitos, ao esperar que sejam os políticos a decidirem o melhor para as suas vidas, acabam por deixar de acreditar na política. A meu ver, é preciso dar a conhecer às pessoas as várias formas que têm para influenciar o processo de decisão colectiva de uma sociedade, de modo a que as próprias comunidades defendam os seus interesses. Os jovens, representando o futuro de uma sociedade, deveriam ser mais motivados e sensibilizados pelos pais e pela sistema de educação a exercerem a sua cidadania no que toca a participarem activamente na política, em nome da defesa dos seus direitos e dos seus interesses.

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A abstenção preocupa-te. Como é que convencerias pessoas da tua idade a votar?

Não convenceria ninguém a votar. Penso que votar é o direito de cada um, portanto as pessoas votam se quiserem. Se uma pessoa não tem interesse em participar no processo de decisão indirecto de uma sociedade, está no seu direito. Pela lei, ao não irem às urnas, os cidadãos já estão a exercer a sua cidadania. O problema não é a abstenção, mas a forma como ela é vista. Penso que se deveria dar representatividade no parlamento à abstenção, devendo os lugares ser ocupados por cidadãos que não se vêem representados por nenhum dos partidos, de forma rotativa ao longo de uma legislatura. Julgo que só tentaria convencer as pessoas a irem votar no caso de perigo de ascensão de uma ditadura ao poder.

Já pensaste em seguir uma carreira política?

Já pensei. Mas, fiquei-me pelo pensamento. Não me vejo na vida político-partidária, apesar do meu interesse pelo assunto.

Os políticos são mesmo todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

Para todas as regras existem excepções.

Fábio Magalhães, 18 anos, frequenta o primeiro ano da licenciatura em Gestão de Recursos Humanos no ISCSP

Foto cortesia Festival Política

VICE: De que forma pensas que a política pode mudar a vida das comunidades e das sociedades?

Fábio Magalhães: De todas as formas, tendo em conta que tudo é política.

Achas que os jovens tendem a desligar-se da política e da participação cidadã? Porquê?

Acho que se deve à falta de interesse, porque sentem que a política é algo que lhes está muito distante.

Como é que se pode mudar essa perspectiva?

Abrangendo nos programas de ensino a política, de maneira a que os jovens estejam informados, ganhem interesse e se tornem activos na participação cidadã.

Preocupa-te a abstenção? Como é que convencerias alguém da tua idade a votar?

Mostrando-lhe a realidade do País, as dificuldades pelas quais as pessoas passam, o que está bem feito ou mal feito e informando sobre os objectivos políticos de cada partido candidato, com a finalidade de fazer perceber que é preciso votar para mudar!

Já pensaste em seguir uma carreira política?

Não, até agora não é algo em que tenha pensado.

Acreditas naquela ideia popular de que os políticos são todos uns "ladrões e uns trafulhas"?

Claro que não. Como em todas as profissões, existem bons e maus profissionais e a política não é excepção.


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