Votos de Feliz Natal Diretamente da Lua

1968 foi um ano angustiante para o mundo — assassinatos, revoltas e guerra pareciam constantes — e para a agência espacial americana também. O ano começou com o programa Apollo perigosamente atrasado para um pouso lunar, programado para o fim da década, mas terminou de forma espetacular, com a primeira equipe de astronautas em órbita ao redor da Lua.

Quando o programa Apollo começou, em 1961, a NASA tinha tudo planejado. Cada missão foi construída com base na anterior. As peças da espaçonave — o Módulo de Comando e Serviço (CSM) e o Módulo Lunar (LM) — seriam testadas separadamente e então juntas em órbita terrestre, antes da configuração completa partir rumo à Lua. Testes de vôo lunar orbital incluiam tentativas de pouso. O plano exigia que a NASA se ativesse a um cronograma rigoroso. Mas em 1967, tudo começou a ruir.

Durante um teste de pré-lançamento da primeira missão Apollo tripulada, no dia 27 de janeiro de 1967, um incêndio tomou a cabine de pilotagem. A tripulação morreu, e o acidente revelou falhas fatais na espaçonave. Redesigns substanciais foram necessários, o que acarretou mais testes não tripulados antes que outro vôo tripulado pudesse pensar em decolar.

O restante de 1967 e a primeira metade de 1968 foram dedicados ao conserto dos problemas e a testes não tripulados de novas máquinas. Então, em agosto de 1968, a NASA sofreu outro golpe. A União Soviética, retardatária na corrida espacial desde 1965, apareceu de repente com o vôo orbital lunar. A espaçonave Zond 5, não tripulada, voou até a Lua, contornou seu lado mais longínquo e retornou à Terra em segurança. Quando a NASA soube da missão, através da CIA, não restavam dúvidas para os gestores de que a União Soviética planejava acrescentar uma tripulação ao vôo seguinte da Zond 5 e vencer a NASA na chegada à Lua.

E então, sob pressão, o gerente do programa Apollo George Low apareceu com uma solução elegante e audaciosa: esqueçam os cronogramas e os testes incrementais, enviem o próximo vôo Apollo à Lua.

O próximo lançamento tripulado da NASA estava agendado para outubro de 1968. A missão Apollo 7 era um teste de navegação do CSM em órbita terrestre. Low sugeriu que, caso tudo desse certo com a Apollo 7, usassem a mesma espaçonave para a Apollo 8 — somente o CSM —, rumo à Lua, assim que houvesse uma janela para um novo lançamento, em dezembro. A missão seria um excelente teste para a programação de trajetória lunar que os engenheiros vinham desenvolvendo, e era a melhor chance da NASA de levar um homem à Lua antes da União Soviética.

Em agosto, deram início aos planos para um possível voo lunar da Apollo 8; o protocolo interno era manter o projeto oculto da mídia. A tripulação era conhecida: Frank Borman, Jim Lovell e Bill Anders; a questão não era somente como otimizar o vôo, mas como justificar os riscos que a missão lunar implicava. Uma ideia era arremessar a tripulação ao redor da Lua. Seria a opção de contorno mais segura, visto que a gravidade estava no comando.

Entrar em órbita lunar seria mais arriscado — a tripulação teria que queimar o motor principal para entrar em órbita, e queimá-lo novamente para sair da órbita e retornar à Terra. Essa alternativa seria excelente para missões futuras, pois saber como adentrar e deixar a órbita lunar permitiria com que a NASA lidasse com o problema antes do esperado, dando à agência uma probabilidade maior de respeitar o prazo para pouso na Lua. Se o motor falhasse, no entanto, os astronautas porderiam ser sugados em órbita, sem chances de voltar para casa.

Engenheiros veteranos da NASA sentiram-se confiantes o bastante com o equipamento e a equipe, e também farejaram uma injeção de moral em potencial, proporcionada pelo vôo circunlunar. Tudo que precisavam fazer era convencer o gerente da agência James Webb, que não estava muito seguro. Em setembro, a pressão apertou. A União Soviética lançou algumas criaturas vivas, incluindo tartarugas russas, para uma volta sublunar em torno da Lua, à bordo do Zond 5. A missão retornou à Terra no dia 21 de setembro, e corriam boatos de que a intenção era decolar com humanos em seguida, rumo à Lua.

Por fim, Webb entrou no barco, e ficou decidido que a tripulação entraria em órbita. Quando a missão Apollo 8 decolou, dia 21 de dezembro de 1968, foi a primeira vez que homens voaram num Saturn V, o foguete mais alto, pesado e poderoso que já fora construído. Após a rota de três dias em direção à Lua, a espaçonave entrou em órbita lunar na véspera de Natal.

No caminho, Lovell, Anders e Borman tiraram as famosas fotos da Terra crescente sobre a Lua, e na véspera de Natal, transmitiram uma mensagem ao vivo da Lua: uma leitura do livro de Gênesis.

Uma das fotos do "Nascer da Terra", tirada por Anders com uma câmera Hasselblad, tornou-se lendária. "Por acaso, eu estava com o filme colorido na máquina e tinha lentes longas", ele lembra. "Tudo que fiz bater fotos. sem parar.. Não é uma foto muito boa, em termos de fotografia, mas é especial. Foi o primeiro registro do nosso planeta, e ficou particularmente impressionante porque contrasta com um horizonte deslumbrante… Depois de todos os treinos e estudos que concluímos como pilotos e engenheiros para chegar com segurança à Lua e voltar, como seres humanos explorando a órbita da Lua, o que descobrimos mesmo foi o planeta Terra."

Quanto à escolha de ler o Gênesis: "Nos disseram que, na véspera de Natal, teríamos a maior audiência a escutar a voz humana de todos os tempos", Borman disse em 2008. "E a única instrução que recebemos da NASA foi fazer algo apropriado."

Por sugestão da esposa de um jornalista, os três homens decidiram ler os primeiros dez versos do Gênesis. Lovell salientou que "é a fundação de várias religiões do mundo, não apenas do cristianismo".

Em 1970, Madalyn Murray O'Hair, o famoso ativista ateu, processou o governo dos Estados Unidos por ler a Bíblia como violoação da Primeira Emenda. O processo foi indeferido pela Suprema Corte por falta de jusrisdição (a NASA não recomenda observações religiosas públicas no espaço desde então).

A tripulação contornou a Lua dez vezes na véspera do Natal. Na manhã de Natal, esquentaram os motores para escapar da órbita lunar e voltar para casa. À torre de controle, que estava ansiosa para saber se a manobra havia funcionado, Lovell comunicou: "Informamos que Papai Noel existe."

Após 20 horas em órbita lunar, não tiveram problemas com a queima do motor principal. Iniciaram a rota de três dias em direção à Terra, e chegaram no dia 27 de dezembro de 1968. Alguns meses depois, astronautas americanos pousaram na Lua.

Esta matéria foi publicada originalmente em 25 de dezembro de 2011.

Tradução: Stephanie Fernandes