Câmera Usada em Estádios de Futebol Está Ajudando Essa Ilha a Salvar Albatrozes
Crédito: Ed Dunens/Flickr

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Câmera Usada em Estádios de Futebol Está Ajudando Essa Ilha a Salvar Albatrozes

O sistema GigaPan transformou o local em 'O Show de Truman' de pássaros.

A Ilha Albatroz não é lá grandes coisas. É só um pedacinho de terra a 35 quilômetros da Tasmânia. Não cresce quase nada ali. É gelada, molhada e venta demais. Ninguém mora lá. Quer dizer, ninguém iria querer, né?

É, porém, um lugar perfeito para estudar os pássaros raros que batizaram a ilha. Algumas vezes por ano, pesquisadores pegam seus equipamentos (e seu remédio para enjoo), saltam num barco e viajam pelos mares agitados do Estreito de Bass para monitorar a ave marinha sob risco de extinção conhecida como albatroz-arisco (Thalassarche cauta).

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"Eles não são nada ariscos", admite Rachael Alderman, bióloga que tem administrado o programa de monitoramento de albatrozes-ariscos do governo da Tasmânia desde 2003. "Passo muito tempo na colônia com eles. São excelentes pais. Defendem seus ninhos, ovos e filhos com suas vidas."

O problema é que, se olharmos a história desses pássaros adultos, notamos que eles não têm conseguido se defender direito. A espécie foi quase extinta há um século por causa do comércio de penas. Em 1909, restavam apenas 300 casais na ilha.

Recentemente, os pássaros encararam outra ameaça. Muitos deles estavam sendo capturados pelas redes de pescadores. "Por volta dos anos 80, os pesquisadores perceberam o que estava acontecendo e em qual escala, bem como os impactos daquilo", disse Alderman. "O monitoramento foi estimulado por causa da preocupação em torno da captura acidental decorrente da pesca".

"Muita coisa acontece na temporada de acasalamento que não podemos ver"

Hoje, disse Alderman, a população é muito mais sadia. Cerca de 5.000 pares de pássaros – 40% de sua espécie – retornam à Ilha Albatroz todos os anos para depositarem seus ovos e os chocarem.

Os cientistas querem garantir que a população continue bem. Fazer isso significa empreender uma perigosa jornada anual à Ilha Albatroz para ver quantas das aves pequenas sobrevivem e quantas das jovens – que podem ter nascido ali há uma década – voltam ao seu lugar de nascimento para acasalar pela primeira vez.

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Não é fácil. Os cientistas só podem passar uma ou duas semanas na ilha estudando as aves por ser um local inóspito e caro de se visitar. Em contraste, os pássaros passam até seis meses ali esperando os ovos chocarem e os bebês criarem penas.

"Muita coisa acontece na temporada de acasalamento que não podemos ver, detectar ou medir", disse Alderman. Os ovos podem não chocar, tempestades podem inundar os ninhos ou os pais podem passar tempo demais no mar em busca de comida. Compreender estes fatores logo cedo para criar estratégias de preservação será essencial para conservar a espécie no longo prazo.

Como eles poderiam coletar mais dados sem ficar mais tempo na Ilha Albatroz?

Acabou que a resposta estava nos estádios de beisebol e de futebol.

Mais especificamente, a solução é um sistema de câmeras projetado inicialmente para a NASA, mas utilizado em estádios de beisebol e futebol há pouco. A câmera GigaPan tira centenas de fotos individuais que se combinam em imagens panorâmicas enormes do público do estádio. Os fãs então podem marcar seus rostos entre os milhares fotografados no dia de um jogo.

Cientistas pensaram que poderiam fazer o mesmo com a vida selvagem.

Primeiro, porém, seria necessário personalizar a câmera para as condições severas e de longo prazo. "Do jeitinho australiano, abrimos ela toda", disse Tim Lynch, pesquisador-sênior da CSIRO, agência de pesquisa federal australiana. Lynch e seus colegas a modificaram w criaram um novo chip para controlar sua alimentação e fornecer maior controle sobre quando tiraria fotos; a seguir, colocaram o equipamento na Ilha Albatroz próximo a um morro cheio de ninhos.

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O primeiro teste durou apenas cinco dias, mas foi o suficiente para provar que poderiam monitorar o que havia acontecido nos ninhos individuais ao longo daquele tempo.

Com os resultados em mãos, descobriram como colocar a câmera em um case à prova d'água, trocaram a bateria por uma que duraria seis meses, e desenvolveram um método de posicioná-la na ilha sem danificar o solo. Depois retornaram à Ilha Albatroz, largaram a câmera por lá durante uma temporada inteira de acasalamento, coletando-a (junto de seus dados) na próxima visita.

"Funcionou belamente", disse Alderman. "Aguentou uns ventos bem fortes e clima severo." A câmera registrou seis meses de imagens – duas panorâmicas por dia – que então seriam examinadas pelos pesquisadores no conforto de seus escritórios.

Não só puderam observar ninhos específicos a qualquer momento, como também usaram um software chamado Time Machine, desenvolvido pela Universidade Carnegie Mellon, para criar filmes de meses de cada ninho em relação ao panorama geral. O software permitia que acompanhassem ninhos por toda a temporada no lugar de vê-los só algumas semanas por ano. "Você fica mais afiado com certos pássaros", disse Alderman. Eles poderiam rodar o vídeo para frente e pra trás em busca de mudanças notáveis, como quando os ovos chocavam ou não.

Todas essas informações serão essenciais para a preservação da espécie, já que agora sua população começou a cair por razões ainda misteriosas aos cientistas.

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"Estamos notando declínios no sucesso do acasalamento", disse Alderman. "Está ficando mais difícil gerar outros pássaros e notamos quedas também na sobrevivência dos jovens."

Os pesquisadores sabem que algo está acontecendo, mas não o quê. "É difícil identificar a causa deles passarem anos no mar", declarou Alderman.

Estudiosos precisam descobrir rápido por que albatrozes não se adaptam bem às mudanças. Os pássaros botam somente um ovo a cada ano ou dois e não copulam até terem cinco anos de idade, muitas vezes mais. "Não é como se eles pudessem evoluir rapidamente ou algo assim", disse.

Algumas das ameaças – e possíveis soluções – já foram identificadas. Uma delas é a chuva. Atuais modelos climáticos prevêem que a ilha enfrentará mais tempestades. "Se isso acontecer em determinada época, os ninhos inundarão e os ovos serão perdidos", comentou. "Talvez possamos deixar mais material para os ninhos para que eles os façam mais altos ou coisa do tipo. Queremos testar essas ideias enquanto os pássaros estão abundantes e há tempo."

As condições no mar serão mais complicadas de serem descobertas, mas a câmera pode ajudar aí também. Os pássaros-pais dividem seus deveres; um choca o ovo enquanto o outro vai ao mar em busca de comida. Se a mamãe ficar fora muito tempo, pode ser indício de que não está fácil encontrar peixes por perto. Isso pode ser sinal de mudanças climáticas ou efeito da atividade pesqueira, que, além de focar nas mesmas presas dos albatrozes, muitas vezes mata os pássaros sem querer com suas linhas e redes.

"Começamos a notar sinais de declínio na população", disse Alderman. "Temos bons motivos para crer que isso continuará." Encaixar todas as peças do quebra-cabeça dessa queda exigirá muito trabalho, mas a GigaPan já está a postos.

A câmera acaba de voltar para a Ilha Albatroz para sua segunda temporada. Os dados coletados este ano serão essenciais para a preservação da espécie no futuro.

Tradução: Thiago "Índio" Silva