FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

O Plano Fracassado de um Espaçoporto Comercial no Subártico

O plano era lançar cargas orbitais e suborbitais de diversos veículos, embarcações de vários tamanhos, tanto para o setor privado quanto para clientes governamentais.
O que restou do espaçoporto canadense. Créditos: Martin Lopatka/Flickr.

Em dado momento, o Mojave Air and Space Port (Aero e Espaçoporto de Mojave) — o primeiro espaçoporto civil licenciado dos EUA — não era o único espaçoporto projetado para a América do Norte. Não, o porto celestial, localizado no deserto californiano, tinha um rival. E em vez de miragens e calor escaldante, a localização do espaçoporto alternativo era o subártico canadense.

Nos anos 90, um dos primeiros espaçoportos comerciais do mundo quase foi construído numa cidade remota, ao Norte do Canadá, na beira da tundra ártica, perto da Baía de Hudson — até que uma falta de investimentos não deixou os planos saírem do papel.

Publicidade

A empresa Akjuit Aerospace Inc. foi fundada em 1992 para desenvolver o "primeiro espaçoporto polar comercial e internacional do mundo" na cidade de Churchill, Manitoba, de acordo com materiais de publicidade esquecidos, ainda disponíveis online. O plano era lançar cargas orbitais e suborbitais de diversos veículos, embarcações de vários tamanhos, tanto para o setor privado quanto para clientes governamentais, tudo a partir de uma localização "idealmente sob medida para lançamentos orbitais polares e de alta inclinação", escreveu o então presidente e CEO Siobhan Mullen.

Imagens do panfleto da empresa.

Durante décadas, o local ficou conhecido como Centro Churchill de Desenvolvimento de Foguetes, ou Forte Churchill, um centro histórico que foi usado desde os anos 50 como rampa de lançamento para foguetes, pesquisas atmosféricas, viagens de sobrevivência e pesquisas militares, até ser fechado em 1981. Segundo a Agência Espacial Canadense, "mais de 3.500 vôos suborbitais foram lançados do local."

No início dos anos 90, a empresa aeroespacial Mullen e Akjuit concebeu um plano para dar à instalação um novo alento, oferecendo "serviços completos, de chave na mão, para consumidores espaciais comerciais, não militares", antes do novo milênio. Em 1994, a empresa assinou um arrendamento de 30 anos para o antigo local de testes para foguetes, e então juntou uma equipe técnica de 21 firmas, lideradas pela indústria aeroespacial americana e pela empresa fornecedora de soluções de defesa Raytheon.

Publicidade

O primeiro espaçoporto polar comercial e internacional do mundo

Os preparatórios começaram, e a capacidade operacional inicial para lançar veículos orbitais estava prevista para o meio de 1996. Algumas instalações pré-existentes do Forte Churchill foram renovadas, uma nova infraestrutura foi construída, e um espaçoporto canadence em funcionamento ganharia uma torre de lançamento, montagem de veículos e uma instalação para processamento de cargas, além de um centro de controle para as missões.

A estratégia da empresa se baseava em "um consenso geral de previsões industriais", já que a demanda por pequenos satélites estava prestes a crescer drasticamente no mundo todo. Indústrias estavam começando a optar por um hardware menor e mais barato, que não necessariamente requeria uma plataforma de lançamento ou órbitas geossíncronas. A Akjuit Aerospace queria se posicionar como pioneira nesse espaço (trocadilho intencional).

A SpacePort Canada se especializaria em oferecer vôos diretos ao Pólo Norte e possibilitar o posicionamento de cargas em órbitas sincronizadas com o Sol (órbitas em que naves ficam sempre no hemisfério iluminado). Seus clientes, Mullen contou à revista da Universidade da Pensilvânia, em 1998, eram "empresas envolvidas em comunicação de dados, comunicação multimídia e comunicação de voz ao redor do mundo".

E enquanto a maioria dos outros locais de lançamento da época ainda "pertenciam ao governo e operavam e lançavam apenas veículos do próprio país", de acordo com Mullen, sua empresa havia fechado uma parceria com a Rússia para dar um novo propósito aos velhos mísseis balísticos intercontinentais (ICBMs), em veículos que eles lançariam em Churchill.

Publicidade

No papel, pelo menos, o projeto tinha tudo para dar certo. Mas dinheiro sempre foi um problema — e exatamente quanto o projeto precisava para obter sucesso, e quanto ganhou, ninguém sabe ao certo. Cerca de 100-300 milhões de dólares é um custo frequentemente citado em materiais online da época. Se for mesmo o caso, a empresa sequer chegou perto.

Segundo o jornal Western Producer, em maio de 1998, "a empresa angariou mais de 8,5 milhões de dólares com os residentes de Churchill, sua equipe técnica e outros investidores de Manitoba e do Canadá." Mullen foi citada na revista da Universidade da Pensilvânia no mês anterior, dizendo que sua equipe havia angariado quase 22 milhões de dólares no total.

Até então, o primeiro lançamento comercial da SpacePort Canada fora posto de lado inúmeras vezes — agora, estava agendado para o ano 2000. A empresa enfim conseguiu lançar um foguete de sondagem, no dia 28 de abril de 1998, como um teste para a Agência Espacial Canadence, mas o sucesso fugaz não durou muito.

Apenas duas semanas depois, a empresa publicou um comunicado, segundo o noticiário Nunavut Edition Headline News, dizendo que "embora a Akjuit tenha alcançado um vasto progresso no mercado de lançamentos orbitais [e] na indústria de pequenos satélites, a grande base de clientes antecipada para a SpacePort Canada continuou a atrasar decisões de lançamento." Como resultado, a Akjuit "não foi capaz de assegurar investimentos interinos adicionais para sustentar as operações até que as negociações com clientes europeus e americanos fossem concluídas".

Publicidade

Por fim, a Akjuit Aerospace, e portanto a SpacePort Canada, fechou naquele ano.

Desde o começo, a empresa estava ciente de que seus laços com o mercado florescente de espaçoportos eram precários. Em um documento, os executivos da empresa escreveram que era "improvável haver espaço para mais de um espaçoporto comercial de sucesso no futuro próximo, e que certamente não havia espaço para dois deles na América do Norte, mesmo a médio e longo prazo", caso a Akjuit não agisse rápido.

E, de fato, foi exatamente o que aconteceu. Se um espaçoporto privado, comercial, é o que você deseja, o Mojave Air and Space Port é o único em jogo. E o Forte Churchill — ao menos de acordo com a Agência Espacial Canadense, em torno de 2004 — ficou "praticamente deserto".

Tradução: Stephanie Fernandes