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A homenagem da Música Portuguesa A Gostar Dela Própria aos carros ardidos no Andanças

No meio da destruição há quem consiga sempre construir.
Frame do vídeo "Roberto Moniz - 'Carga de Cinzas'", de A Música Portuguesa A Gostar Dela Própria

E de repente, numa tórrida tarde de Agosto, o País inteiro ficou a conhecer o Andanças, aquele festival que muitos adoram odiar e outros tantos acreditam piamente ser a quinta-essência festivaleira deste nosso cantinho com mais melhores cenas do Mundo por metro quadrado que lagartos chorões no final do Campeonato que está prestes a começar.

O incêndio que devorou 422 carros num parque de estacionamento do evento - que terminou no domingo em Castelo de Vide - encontrou na silly season jornalística pasto mais que suficiente para continuar a arder dias a fio mesmo depois de extinto. Não foi caso para menos, note-se. Não há memória de uma situação desta dimensão num festival português - não vamos dizer nomes, mas no primeiro Sudoeste, em 1997, houve quem visse tudo a arder e tenha entrado em pânico antes de perceber que eram só os ácidos a agigantar umas mini fogueiras no campismo, à altura tão improvisado que se fosse hoje ia tudo preso.

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A coisa foi grave e podia ter sido muito pior. Ainda assim, a organização do Andanças decidiu continuar com o programa das festas e, aparentemente, ninguém levou a mal. Não é de espantar. Carros são um dos símbolos máximos desta sociedade capitalista que nos estrafega sem dó nem piedade, portanto, a bem dizer, 400 veículos a arder deveria era ter dado origem a um movimento espontâneo de celebração entre os participantes e, no final, a organização até podia ter levado a cabo um gigantesco baile improvisado no meio daquele cenário de devastação mecânica. Uma espécie de dança da libertação.

Podia, mas para isso é preciso um sentido de humor a modos que jeitoso. Coisa que, a avaliar pelos directos das televisões (uma espectacular e extremamente fiável fonte de avaliação, como todos sabemos), escasseia quando se percebe que uma coisa é a conversa libertária new age, outra bem diferente é dar cabo da vida a quem trabalha. E a esmagadora maioria dos carros que arderam eram de voluntários, comerciantes e artistas que ali estavam, precisamente, a trabalhar.

Ainda assim, há sempre quem consiga tirar o melhor das adversidades e construir sobre a destruição. Foi o caso de Tiago Pereira e do seu projecto A Música Portuguesa A Gostar Dela Própria. Gente que também ficou sem carro e provavelmente sem outros bens materiais que muita falta lhes vai fazer, mas que, não foi de modas e, assim que foi possível, agarrou-se à música e à arte para dar a volta ao texto. O resultado foi este.

"Hoje de Lisboa, disse às meninas da MPAGDP no Festival Andanças (Oficial), que seria bonito gravarem um vídeo com o Roberto Moniz no meio dos carros queimados, ele tocaria Rajão em homenagem ao nosso carro RJ, fui vendo fotos e dizendo enquadramentos e eis que surgiu! Grandes Nádia Araújo, Ap Silvestre e Sofia Matias que aí sobrevivem, eu não conseguiria! Viva a música que salva as mentes!"