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Tem Mais Aedes Aegypti do que Pipa no Céu da Zona Norte de São Paulo

Região é a primeira a adotar a campanha de combate à dengue encabeçada pela Prefeitura em parceria com o Exército.

A regra básica antes da operação é camisa de manga comprida e muito repelente. Foto por Felipe Larozza.

O cheiro de citronela invade a Avenida Clávasio Alves da Silva, no bairro do Limão, Zona Norte de São Paulo. Na parte externa da Unidade Básica de Saúde Adelaide Lopes, um contingente de 50 soldados e cabos do 8º Batalhão da Polícia do Exército se besunta de repelente para mais um dia de trabalho.

A parceria entre a Prefeitura e a o Exército começou pela Zona Norte de São Paulo. Foto por Felipe Larozza.

A parceria dos militares com a Prefeitura da cidade no combate à dengue começou no dia 23 de abril. O prazo inicial da operação é de um mês, mas com grandes possibilidades de extensão. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, a equipe visita duas mil residências por dia num raio de um quilômetro e a média de recusas caiu de 20% para 2% depois dessa ação. "Há uma mudança de atitude positiva da população, que está abrindo as suas casas para que haja a visita do agente de zoonose e do militar do Exército. Isso se deve à elevada confiança que a sociedade tem no Exército. Ela se sente segura em abrir a sua casa para a entrada da dupla", explica o otimista coronel Ricardo Piai Carmona, porta-voz do Exército na operação.

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A agente de zoonose Silvana Barros da Silva e o Soldado Castro, a dupla dinâmica. Foto por Felipe Larozza.

A agente de zoonose Silvana Barros da Silva e o soldado Castro são uma das 50 duplas formadas para combater o Aedes Aegypti. Eles param de porta em porta na tranquila Rua Leonel Rabello, também no Limão. Dogs passeiam pelos paralelepípedos, moradores tocam suas vidas e a gatinha Marie toma sol de barriga pra cima, vestindo roupinha cor-de-rosa.

Silvana fez faculdade de pedagogia e há cinco anos trabalha na área. Com paciência e didatismo, explica aos moradores os perigos dos vasinhos, dos baldes e das garrafas com água parada. Conta também um dos principais motivos do mais recente boom dos casos de dengue. "Eu tenho encontrado muito foco em água de reuso por causa da faltá d'água". E fala sobre a parceria com o Exército com mais descrença do que o esperado. "Pra mim, não teve nenhuma diferença. Tanto com eles ou sem eles, é a mesma coisa".

A primeira casa visitada tem o agradável cheiro de legumes sendo cozidos na panela de pressão, mas esconde um quase inocente vaso de plantas com o fundo molhado; já a segunda tem um problema na laje, que armazena água da chuva; e a terceira e a quarta residência não autorizaram a entrada. Na quinta habitação, um vaso com um líquido esverdeado, provavelmente há dias, enfeita a elegante sala/cozinha americana. Em todas as moradias, um item em comum: possíveis criadouros do mosquito da dengue. Segundo o coronel Carmona, 70% das residências apresentam algum possível foco do mosquito.

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Casa no bairro do Limão com possível criadouro do mosquito da dengue. Foto por Felipe Larozza.

A pouco mais de cinco quilômetros do bairro do Limão, na Brasilândia, a dengue é quase regra na família Santos. A aposentada Geralda Silvino dos Santos, de 74 anos, mal consegue se manter em pé. A fraqueza nas pernas, a dor nas costas e a moleza castigam. Até sua voz anda trêmula. Acostumada a zanzar a pé ou de ônibus pelo bairro, está agoniada pelos dias impostos de descanso. "Eu tenho medo de sair e cair. Eu saía muito, ia pra todo canto. Ia ao mercado, pagava uma conta. Eu passava a mão nos meus documentinhos e ia lá pra Parada (de Taipas). Ia andando, voltava andando se fosse possível, mas, depois que deu isso aí, eu fico reclamando, porque só fico dentro de casa. Eu não gosto de ficar parada", conta a matriarca diagnosticada com dengue há cerca de uma semana.

Os 'dengosos' da família Santos. Ainda faltam mais três familiares contaminados. Foto por Felipe Larozza.

A moradia de dona Geralda, assim como as outras residências do terreno da família, não apresenta nenhum foco do mosquito, mas um terreno vizinho, com o mato alto e uma casa abandonada, sem teto e com água parada em vários pontos, é o grande vilão. "Eu tenho quase certeza que é de lá. Não tem como um local abandonado ter os devidos cuidados. Um potinho de margarina, uma garrafa, uma privada sanitária, tem diversos lugares", conta o segurança Lucas Fernandes, neto de dona Geralda que a chama de mãe. Há cerca de um mês, foi sua vez de ficar acamado por conta de uma picada do Aedes.

Dona Adalgisa ao lado do terreno abandonado e possível foco da dengue. Foto por Felipe Larozza.

Dona Adalgisa, filha de dona Geralda, teve a dengue comprovada no dia 29 de abril. Sua filha Jéssica teve a versão hemorrágica e mais agressiva da doença. Neto de dona Geralda, o professor de Educação Física Rodrigo Ribeiro de Souza, de 25 anos, está suando frio e mal consegue sair da cama. "Começou com fraqueza no corpo; depois, dor de cabeça. Depois, náusea e febre", ele explica os sintomas. O estudante Matheus Vitório de Souza, de 17 anos, e o mecânico de refrigeração Erik Vitório de Souza, de 21, também moribundam pelo quintal.

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O terreno de moradores há dois anos tem…

…água parada…

…e falta uns tecos de teto. Fotos por Felipe Larozza.

No total, oito pessoas tiveram ou ainda sofrem com os sintomas da picada do mosquito no terreno. Outros vizinhos da Rua Olga Benário também apanharam a doença na Brasilândia. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, o bairro ainda não está na mira da ação da Prefeitura com o Exército. A próxima parada é a Vila Maria, também na Zona Norte. Para o coordenador do combate à dengue, Alessandro Giangola, a prioridade não é o bairro do Limão, e sim a Zona Norte, região com o maior número de ocorrências em São Paulo. Ele explica o planejamento do projeto. "Nesses locais, a gente tá vendo ocorrências de dengue. Não necessariamente esses locais estão em emergência. A gente pode verificar também locais onde está começando a transmissão de dengue". Giangola destaca ainda que as denúncias devem ser feitas pelo número 156, da Prefeitura; após a ligação, o reclamante deverá pegar um protocolo e acompanhar o processo.

Enquanto fazíamos a apuração desta reportagem, mais uma pessoa da família Santos foi infectada com uma picada do Aedes Aegypti.