Mulheres que tocam em blocos de Carnaval contam o que já ouviram dos homens

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reportagem

Mulheres que tocam em blocos de Carnaval contam o que já ouviram dos homens

Além do fiu fiu, as minas também têm que enfrentar todo um discurso babaca e machista.

Não é só do fiu fiu, da mão boba e o beijo roubado que as mulheres reclamam durante o Carnaval. Além deste tipo de assédio, aquelas que integram as baterias e sopros de blocos carnavalescos contam que não são respeitadas enquanto ajudam a colocar o bloco na rua. Durante o evento Teta sem Treta, que rolou na semana passada, no Rio, mulheres falaram que outras violências enfrentam durante a folia.

O Teta teve como objetivo unir mulheres que tocam nos blocos cariocas para debater não só o assédio, mas outras situações de machismo sofridas no Carnaval. "Tem muitas mulheres que tocam que ainda não estão ligadas nesta história de se juntar para tocar junto. E transformar as marchinhas é uma proposta que ainda está limitado ao mundo militante feminista, a ideia era abrir", conta Carolina Coelho, uma das organizadoras do evento.

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O Teta sem Treta surgiu em 2017, quando um grupo de mulheres resolveu se juntar para tocar a fim de levantar uma grana para um evento que aconteceria no Uruguai: "A partir disso, surgiu a ideia de um Carnaval feminista, com novas marchinhas. A gente acha importante ressignificar essas músicas com as nossas letras e nossa história e repensar o Carnaval que a gente quer e vai fazer daqui para frente", diz Carolina. Conversamos com algumas percussionistas para ouvir histórias de como é ser mulher e tocar no carnaval.

Erica Cyriaco, 31 anos, surdo, integrante do Multibloco

"Várias vezes homens acham que eu não toco surdo, porque é um instrumento pesado, e os foliões ficam tentando me ensinar, pedem emprestado o instrumento. Eu toco surdo de terceira, eles ficam marcando no andamento todo errado, e aí eu nem olho né."

Claudia Vaz, 32 anos, agogô, integrante do Maria Vem Com As Outras

"O que sempre acontece é que quando um folião vem pedir para tocar o instrumento, eles só pedem para as mulheres. Como se a gente fosse boazinha, ou como se fosse um hobby e os homens tocassem sério, então dessa forma não atrapalham o bloco."

Carolina Coelho, 30 anos, xequerê

"Um amigo me falou que eu escolhi o xequerê porque é um instrumento mais fácil, me diminuindo. Me senti incomodada, falei para ele tomar vergonha na cara."

Simone Regina, 35 anos, percussão integrante da Fanfarra Black Clube, Surdos e Mundos e Moita

"Vejo muitas colegas de sopro passando pelo mesmo problema: tentam puxar uma música, vem um cara e puxa outra música em cima. Na percussão, o que acontece é homem segurando maceta/baqueta/mão de mulher para que ela pare de tocar. Não vejo problema quando uma pessoa está tocando errado e alguém vem corrigir, a questão é a abordagem. Outra coisa que me irrita muito é essa ideia de que mulher tem que estar sempre sorrindo. Às vezes fico concentrada na música e acabo ficando séria. Já fui cutucada no meio do bloco por fotógrafo me mandando sorrir. Aí é que eu fecho a cara mesmo."

Patrícia Santos, 43 anos, xequerê e regência, integrante do Mulheres Rodadas

"A situação chata já tem origem no meu instrumento, que os homens acham que é um chocalhinho, e na cabeça deles estamos sensualizando. Uma vez ouvi de um cara: se chacoalha assim, imagina o resto. Para eles é muito fácil tocar, mas na hora que coloca na mão deles não sabem nem pra que lado toca o instrumento. Acham que é de mulherzinha e com isso a primeira vez que fui tocar na rua senti que fui sendo colocada de lado na roda do bloco. A gente é colocada como subgrupo".

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