Como a realidade aumentada tem ajudado a driblar a gentrificação no Harlem

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The Creators Project

Como a realidade aumentada tem ajudado a driblar a gentrificação no Harlem

Eis uma forma de burlar o apagão cultural: projetando o passado na tela do smartphone.

Cortesia do Caribbean Cultural Center African Diaspora Institute (CCCADI)

Apesar de muitas vezes invisíveis, cultura e história são partes vitais de qualquer comunidade. Para mostrar as diferentes maneiras com que a realidade aumentada pode tornar visível o oculto, o Caribbean Cultural Center African Diaspora Institute (CCCADI) de Nova York, nos EUA, apresentou o passeio Mi Querido Barrio (Meu querido bairro). O projeto de arte digital é parte da exposição Home, Memory and Future, em comemoração à reabertura do Caribbean Cultural Center em sua nova sede, no East Harlem.

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O funcionamento é simples: com o aplicativo de realidade aumentada Blippar, qualquer pessoa com um smartphone e um guia do passeio pode apontar seu aparelho para pontos do bairro – que é alvo de intensa gentrificação – e revelar obras de arte, fotografias e atividades interativas que trazem de volta o passado. Um ponto em frente a uma loja 7 Eleven, por exemplo, revela que ali existia originalmente a loja de artigos espirituais Justo Botánica, que, apesar de famosa e antiga, teve apenas 30 dias para desocupar o estabelecimento, junto de outros cinco pequenos estabelecimentos.

Oliver Rios, Mind Over Matter. Raze Memorial Wall Mural: Part 1, painted by Oliver Rios, Jose Cordero, and Julio Caban. Photo by the author.

Oliver Rios, um dos muitos artistas que participaram de Mi Querido Barrio, cresceu e ainda vive na região, que, historicamente latina, é costuma ser chamada carinhosamente de El Barrio. Rios lembra de quando aquele era um lugar de cultura riquíssima, embora economicamente pobre – circunstâncias que estão invertendo com a especulação imobiliária. O artista, de 44 anos, passou sua juventude fazendo grafitti e pintando murais e memoriais antidrogas e antiviolência. Em alguns casos, os prédios que pintou simplesmente não existem mais.

Quando ouviu falar sobre Mi Querido Barrio, Rios se ofereceu para contribuir com suas fotografias da época, que podem agora ser vistas nos smartphones dos moradores da região. Rios acredita que a tecnologia da realidade aumentada pode fortalecer sua comunidade. "É uma ótima maneira não só de educar, mas de preservar e conectar", diz. "Acho que quanto mais pessoas começam a usar, principalmente a geração mais nova, mais elas vão abrir os olhos e querer reinventar."

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Oliver Rios, Mind Over Matter. Raze Memorial Wall Mural: Part 2, painted by Oliver Rios, Jose Cordero, and Julio Caban. Photo by the author.

Nascida em Trinidad e Tobago e moradora do Brooklyn, a artista Kearra Amaya Gopee demonstra em Nine Nights: African Burial Ground como a realidade aumentada pode ser utilizada para produzir uma arte interativa, site-specific e incorpórea. A obra guia os usuários por uma caminhada introspectiva pela estação rodoviária de East 126th St., que era originalmente o local onde eram enterrados descendentes de africanos durante os séculos XVII e XVIII.

Nos pontos do passeio, os usuários se deparam com pop-ups e com perguntas sobre experiências de perda, e podem responder no próprio aplicativo. Em dado ponto, lê-se no aplicativo: "Em uma época em que a morte de negros se tornou um espetáculo na era digital, [Nine Nights] utiliza a realidade aumentada para oferecer ao fruidor um espaço mais privado e íntimo dedicado ao luto".

Kearra Amaya Gopee, Nine Nights: African Burial Ground, 126th St.

Por todo o bairro, artistas encontraram maneiras inovadoras de recuperar o espaço público ao mesmo tempo em que disponibilizavam aos moradores acesso à história e à arte. Tamiko Thiel, conselheira artística e técnica de Mi Querido Barrio, é conhecida por suas intervenções com realidade aumentada de maneira inusitada.

Thiel acredita que o potencial subversivo e democratizador da mídia, no que se refere à arte pública e às narrativas históricas, é a chave de seu poder. "Você pode escrever realidades e histórias alternativas onde você quiser, em qualquer lugar onde exista uma comunidade que não tem poder suficiente para comissionar estátuas de bronze de seus heróis", diz.

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Cortesia do Caribbean Cultural Center African Diaspora Institute (CCCADI)

Kearra Amaya Gopee, Nine Nights: African Burial Ground, 126th St.

Foto pelo autor.

Home, Memory and Future está em cartaz no CCCADI até março de 2017. Saiba mais sobre Mi Querido Barrio na página do CCCADI.

Tradução: Flavio Taam