Queremos! e o poder das pequenas multidões

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Dia de Estreia

Queremos! e o poder das pequenas multidões

Assista agora ao segundo episódio da série "Dia de Estreia”, uma série VICE Brasil apresentada por Samsung.

Desde 2010, o Queremos tomou para si uma tarefa que parecia missão impossível: levar shows de artistas estrangeiros alternativos à antiga capital do Brasil. Por incrível que pareça, os produtores de shows do Rio de Janeiro tinham medo de marcar apresentações de nomes como Miike Snow, Phoenix ou Breeders. Acreditavam que não havia público suficiente na Cidade Maravilhosa.

Pedro Garcia, Bruno Natal, Pedro Seiler, Felipe Continentino e Tiago Compagnoni suspeitavam desse temor. Será que numa cidade com mais de seis milhões de pessoas não tinha mesmo quem quisesse ver um LCD Soundsystem, por exemplo? Resolveram ver para crer. Acionaram a rede de amigos e contatos e ofereceram o seguinte: quem estivesse a fim de ver o sueco Miike Snow no Rio, pagaria R$ 200. Se houvesse gente suficiente para pagar as despesas de produção e todo o resto, o cantor incluiria a capital fluminense no seu roteiro brazuca (ele tocaria em São Paulo alguns dias antes).

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Em apenas 12 horas, os cinco desbravadores conheceram o gostinho do sucesso. A grana foi arrecadada e o show aconteceu no famoso Circo Voador, lendária casa de shows da cidade. Empolgados, resolveram tentar uma segunda vez. Utilizaram o mesmo sistema para levar Belle & Sebastian aos cariocas. Mais um êxito, mais um show. O Queremos! nasceu de fato com o show do LCD Soundsystem, em 2011. A partir daí, foi construída uma plataforma para divulgar os crowdfundings e receber as contribuições. Já são mais de oito anos na estrada, um sucesso inimaginável em 2010. A plataforma se expandiu para outras cidades, como Belo Horizonte e Porto Alegre, e foi se transformando num elo de ligação entre artistas, produtores e fãs.

Hoje, o Queremos! organiza o que antes era uma confusão inacessível. Em vez de olhar os comentários nas redes sociais, e-mails ou simplesmente adivinhar quantos potenciais fãs um artista tem, ele simplesmente mede o número de pessoas que pedem o show no site. São mais de 2 milhões de pessoas cadastradas, mais de 4 milhões de pedidos e seis mil artistas requisitados. O mesmo vale para os produtores. Não é necessário confiar no "achômetro". É só ver quanta gente quer um determinado show.

Ainda é possível fazer o esquema de crowdfunding, mas existem mais opções. Os produtores podem apenas vender ingressos diretamente às pessoas que de fato querem pagar por uma apresentação, ajudando a viabilizar mais shows menores e diminui os gastos com divulgação.

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"Nós começamos o Queremos! fazendo crowdfunding de shows e depois evoluímos para o botão 'eu quero', que não exige comprometimento financeiro dos fãs. Esse botão trouxe resultados muito precisos e ajudou a tornar a plataforma mais democrática. Qualquer fã pode pedir qualquer artista em qualquer lugar, sem precisar que uma campanha de crowdfunding esteja ocorrendo", explica Bruno Natal, um dos sócios da plataforma.

O modelo fez tanto sucesso que ganhou uma versão gringa, batizada de We Demand. Seguindo o espírito do original carioca, a plataforma conecta fãs a artistas e possibilita shows de bandas, instrumentistas, cantores e até de comediantes.

Mas o quinteto carioca ainda não se cansou de inventar. Em breve, o Queremos! terá sua própria criptomoeda, a DMD. Com essa nova ferramenta, explica Natal, "além do pedido do fã, teremos um comprometimento financeiro que vai poder agilizar ainda mais a concretização dos shows sem as restrições que existiam numa campanha de crowdfunding".

"A idéia", detalha Felipe Continentino, outro sócio, "é deixar a plataforma ainda mais dinâmica e democrática". "Hoje em dia, se um artista tem mil pedidos, conseguimos prever que no dia do show existirão até duas mil pessoas no local do show levando-se em conta certas condições (dia da semana, preço do ingresso, etc). Para que outros promotores utilizem a plataforma, eles têm que confiar nesses dados. Com a criptomoeda, o promotor verá o valor total da venda de ingressos automaticamente. Ao confirmar o show, ele já sai com parte da receita dos ingressos garantida. Outros sistemas de ingresso poderão aceitar o DMD, como aceitam outras formas de pagamento. Se um fã vai comprar um show que já está à venda, ele usa as formas de pagamento convencionais, se ele quer demonstrar interesse por um ingresso de um show que não está confirmado ainda, ele usa o DMD."

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Para comprar o DMD, bastará usar o cartão de crédito. Felipe explica: "Se um fã tem 100 reais em DMD's, pode fazer lances de até 100 reais para quantos artistas ele quiser". "Ficará registrado no blockchain que ele possui 100 reais numa carteira e que ele fez lances de, por exemplo: 80 reais para o artista A, 100 reais para o artista B, 90 reais para o artista C e assim sucessivamente. O primeiro show que for confirmado deduz esse valor da carteira do fã e se não houver saldo suficiente para manter os outros lances, esses são apagados", explica. Como toda boa criptomoeda, "o DMD terá a cotação livre, em função da oferta e demanda, mas os lances para os ingressos terão seu valor em moedas convencionais". afirma Bruno Natal.

Para eles, o futuro está nesse tipo de mecanismo de pagamento. "O blockchain, base de todas as criptomoedas, será uma revolução tão grande quanto foi a própria internet" prevê Continentino. "A internet criou gigantes que monopolizam setores onde antes existiam muitos intermediários e ineficiências. O blockchain veio para descentralizar de verdade."

O blockchain é a base do bitcoin e de outras "criptomoedas", como o Ethereum, o Dogecoin e agora o DMD. Trata-se de um grande sistema de registros, que diz qual valor alguma pessoa tem em uma carteira virtual. Se eu compro algo de alguém, nós dois emitimos uma "assinatura" que comprova que a transação realmente aconteceu. Essa informação, então é enviada para toda a rede de computadores que armazena esses registros – todos criptografados. São milhares e milhares de computadores. Todos, então, passam a registrar que aquela transação aconteceu. Se eu quiser cometer uma fraude e apagar a transação para ficar com o dinheiro que deveria ser transferido à pessoa de quem comprei alguma coisa, teria que fazer isso em todos os milhares de computadores que formam a rede blockchain. É quase impossível. Além de ser seguro, o sistema é descentralizado. Não existe uma autoridade única que diz quais transações são válidas ou não (como um banco, por exemplo). É a rede descentralizada de usuários e computadores que tem essa autoridade.

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O mercado de criptomoedas não para de crescer no mundo todo. De acordo com a revista Forbes, hoje há o equivalente a US$ 550 bilhões nesse tipo de "dinheiro". O valor é 31 vezes maior do que o total existente no começo do ano passado. O DMD pretende aumentar esse valor e incentivar o uso de criptomoedas para financiar shows.

Turbinar o modelo do Queremos! se tornou necessário, diz Natal. Depender apenas do modelo tradicional de crowdfunding poderia limitar a atuação da plataforma. "Vemos o crowdfunding como uma grande promessa que não se concretizou por alguns problemas práticos. Quem cria uma campanha já tem que determinar um preço, uma meta e um período de tempo para que ela seja bem sucedida antes de ter qualquer informação da demanda pelo produto ou serviço a ser lançado. Os consumidores se comprometem com cartões de crédito e ficam sem saber se aquela campanha vai funcionar ou não, se o limite deles vai ser utilizado e acabam desestimulados a participar de outras campanhas sob o risco de ter o limite do cartão estourado se todas forem bem sucedidas. O crowdfunding se tornou algo de nicho, que não alcançou seu potencial. Acreditamos que ele seja mais uma das áreas que possa alcançar o seu potencial máximo ao se utilizar do blockchain."

Embora a "previsão" ainda não tenha se concretizado, não é bom duvidar do faro do pessoal do Queremos!. Foi a partir de uma inquietação (e do desejo de ver um show bacana) que eles se tornaram referência nacional e mundial do que é possível conseguir usando o poder das pequenas multidões. Não será estranho se eles derem mais uma bola dentro e garantirem mais um sucesso e baciadas de shows bacanas para o Rio de Janeiro e além.

Assista agora: "Dia de Estreia: Queremos!", uma série VICE Brasil apresentada por Samsung.