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Entretenimento

Candy Box É Tipo o Primo Cracudo do Candy Crush

A humanidade acaba de inventar algo mais ridículo e perigosamente curioso do que uma arma de fogo feita numa impressora 3D.

A humanidade acaba de inventar algo mais ridículo e perigosamente curioso do que uma arma de fogo feita numa impressora 3D. E por humanidade estou me referindo a um maravilhoso (retardado) estudante francês de 19 anos que desenvolveu o lindo Candy Box, um belo de um jogo de browser. É só usar seu navegador preferido e clicar aqui ó: http://candies.aniwey.net/ para começar.

Sobre a tela branca HTML #FFFFFF, você começa a entrar lentamente nesse mundo asséptico e aparentemente sem motivo como a vida. Mas, aos poucos, abrem-se milhares de possibilidades e aventuras e frustrações e repetições e momentos nos quais você fica somente esperando algo acontecer apoiado numa vaga esperança de algum devir abstrato, como a vida. Girando em torno da moeda corrente no universo do jogo, os doces (candies), o Candy Box transporta o jogador para um lugar entre a gloriosa era do começo dos jogos de RPG para computador e um sonho de ácido em arte ASCII. Vale notar que grande parte das ilustrações é da gloriosa artista em ASCII jgs, também conhecida como Joan G. Stark.

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[SPOILER] O ponto alto dos efeitos especiais do jogo… e se você não gostou disso nem continua lendo o artigo que você claramente não entendeu porra nenhuma.

Como pode ser observado na FAQ em português, o bagulho começa estranho: Hey, eu só posso comer doces (eat candies) ou jogá-los no chão (Throw 10 candies on the ground), que bosta! Seja paciente! ;)

Que bosta mesmo, demora um tempinho até você sacar todas as possibilidades que o jogo proporciona e, até lá, você já estará ridiculamente viciado não somente no jogo em si, mas também na curiosidade gostosa de tentar entender onde o sujeito quer chegar com essa bosta. Vale notar que, ao final da experiência, você talvez não consiga saber isso.

Este é você, vestido de rosa, pronto para lutar.

Quando você acumula 60 doces, exatos 60 segundos depois de começar essa palhaçada, uma curiosa figura aparece. Embora o retrato em ASCII aparente um misterioso cafetão, ele é somente um traficante de drogas (pirulitos, na verdade) e armas (espadas, no caso). Chegando a 150 doces, aparece a escolha de comprar uma espada de madeira além de uma aba nova chamada QUESTS no topo da tela. Terminando as missões dessa aba, você terá acesso ao resto do jogo. Ao longo das fases, seu irredutível avatar \o/ enfrentará vários inimigos, entre eles: árvores pacíficas, goblins malvados, guardas, Chuck Norris, peixes, bolas de fogo, fantasmas, etc, etc, etc. Armado apenas com uma espada e sua enorme vontade de conseguir mais doces, cada vez mais doces, muitos doces. No final você, jovem descolado, irá se transformar aos poucos na tiazona do Farmville.

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Com todo o desenvolvimento técnico dos jogos eletrônicos e com o crescente acesso de mais pessoas doentes da cabeça desenvolverem sua própria coisa, existe hoje uma quantidade absurda de possibilidades que podem ser trabalhadas dentro desta mídia. Enquanto muitos jogos cismam em ir para uma suposta “frente” na “evolução” do videogame, muita gente mais maníaca olha para trás e para os lados, ou para baixo ou para cima. Algo se perdeu nesse jogo de possibilidades técnicas, que tanto podem ajudar a criar um ambiente quase cinematográfico (que eu acho um saco) com trilhas sonoras orquestrais dignas dos filmes com as melhores produções (o que eu acho de extrema cafonice) quanto testar os limites de narrativa e interação da mídia (o que é chato, cafona e pretensioso).

O bom do desenvolvimento cumulativo na mídia dos vídeo jogos é que agora há a possibilidade de andar para qualquer lado, dando certa liberdade criativa e terreno fértil para mentes doentias colocarem dedos tortos no teclado da criação. Um ótimo exemplo mais ou menos recente é o do maravilhoso “Life of D Duck 2”, de um provavelmente fictício Bjørnar B., que pode ser classificado no melhor estilo adventure-doença, feito com arte infantil de canetas esferográficas coloridas em um fundo branco sulfite. Este exemplo de jogo, onde o Candy Box se encaixa muito bem, é o tipo de loucura que faz uma produtora de jogos séria mudar de calçada se bater os olhos no caminho para a padaria. E está certo, essa liberdade de ser retardado, mal-acabado, feio e interessante, não é onde mora o mainstream de nada. O mainstream visa o público que gosta de melhor gráfico, não necessariamente da melhor arte, e eles estão certos nisso, sempre foi assim em outras mídias, por que não nas novas? Foda-se se é arte ou não também, em geral, quem se interessa muito se algo é arte já se perdeu no caminho e não entendeu o negócio.

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Candy Box, apesar de puxar muito do passado, não é absolutamente um jogo saudosista de tempos mais puros no feitio e fruição dos jogos eletrônicos. Porra, o moleque que fez o jogo tem 19 aninhos. A escolha de fazer um jogo nesses moldes pode ter sido tanto pela pouca experiência do menino em programação e artes relacionadas à produção de um jogo eletrônico quanto pela noção de algo fora do padrão normal de jogos, mas tanto faz, na verdade, pois o jogo é extremamente coeso em se assumir enquanto loucura insensata e humor bizarro.

OLÁ GATAS!!!

Jogos estranhos não começaram a aparecer nesta década, nem só na França. Nessa onda, me vem à memória o Avenida Paulista, jogo brasileiro dos meados da década de 1980 no qual você tenta resgatar o cérebro de ninguém menos que Pietro Maria Bardi, fundador e durante 45 anos, diretor do MASP, que foi roubado por uma bruxa que pretende transformá-lo (o cérebro) em um bode. Mas nem todo jogo nonsense como Candy Box é baseado em fatos reais como o Avenida Paulista. Em 2001, chegando na primeira onda de crítica aos MMORPG, foi criado o edificante Progress Quest, que é exatamente igual a um World of Warcraft da vida, mas sem os gráficos e a interatividade. Ou seja, fica apenas o cerne do osso da parada, o maior propósito dos jogos eletrônicos, jogar fora o pouco tempo que nos resta neste planeta feio e injusto.

Nesse quesito, o Candy Box também acerta em cheio, você vai chegar ao fim do jogo se perguntando que caralho está fazendo de sua vida, mas de maneira gostosa. Na maior parte do jogo, você vai ficar olhando para a cara do desgraçado do traficante de doces desenhado com caracteres comuns à fonte Courier New e, se você for o tipo certo de imbecil, como eu, você vai amar. Se você jogar o maldito jogo até o final, vai ser difícil apontar o que você gostou de fato na experiência, pois não é uma experiência gratificante ou sequer verdadeiramente divertida, é apenas uma… experiência. Talvez nem isso.

Siga o Pedro no Twitter: @pedrograca