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Opera

Ópera à portuguesa

Ou como a culpa é dos chineses.

Esta sexta, vai ser apresentada a primeira ópera no âmbito da Capital Europeia da Cultura. Fiquei fascinado com a notícia, os meus olhos embaciaram de emoção: um dos géneros maiores de drama, cantado num palco de Guimarães, imagine-se! Apesar de ser uma espécie de teatro  que é representado em Portugal há muito tempo, a verdade é que não temos muita tradição neste género. Note-se que existe a ópera alemã, a italiana, a francesa — até os ingleses teriam uma ópera, não fosse o facto de preferirem ter os Oasis. De qualquer modo, fui informar-me sobre o assunto e achei os detalhes deliciosos. Vamos ter uma ópera contemporânea, sim, mas o autor do Libreto é o Carlos Tê. Aquele que assina as letras da maior parte do repertório do Rui Veloso. Ou seja, da mente do gajo de onde saiu a "Não há Estrelas no Céu", sacamos um brilhante drama musical com o nome Mumadona. Não nos falta nada: passo a esclarecer que esta história fala do amor de Dórdio, filho de um empresário têxtil, por Chun Lee, filha de pequenos comerciantes chineses. Sim, a teia que cose esta peça de teatro procura parecer profunda mas, de uma forma pobre e simplista, tenta explicar que a culpa desta crise, que o mal do mundo e que estes tempos desoladores provêm de coisas tão fatídicas como o facto de, em paralelo ao amor deste casal (potente enquadramento estético e intelectual da peça), a China comprar a dívida soberana nacional, enquanto o G8 se reúne para travar o poder económico chinês. E pronto, tenho um ou dois palavrões para dizer. Vou escolher apenas um (o mais simpático): "Bardamerda!" Fico impressionado e tenho algumas perguntas: A culpa é dos chineses? Põem a Mumadona a título, para as gentes de Guimarães acharem a ópera castiça? Mas quem é que se chama Dórdio, hoje em dia? É nesta salgalhada de lugares comuns e de pobreza de espírito que procuramos responder a um dos maiores géneros de teatro? E é neste momento de lucidez que me recordo de que a tradição de teatro musical português não é a ópera, mas sim a revista. E se está lá o Carlos Tê, pode ser que também esteja lá a Marina Mota, ou o Oceano, para dar um pouco de nível a isto tudo.

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